VII

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Abri os olhos.

Eu estava com a mesma roupa da noite anterior. Provavelmente, eu devo ter pegado logo no sono, mas em minha mão tinha algo. Há quase sete meses, três dias antes daquela noite trágica, daquele dezenove de março, ela havia me dado um pendente: era um pendente de ouro com um pingente com a minha data de nascimento em números romanos. A caixinha estava no chão e o cartão um pouco afastado...

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- Posso entrar? - ela disse enquanto estava parada na porta do quarto com uma caixinha cor de azul tiffany nas mãos.

- Claro, mãe! - lembro que eu estava lendo algo num assento que tinha perto da janela do meu quarto. Levantei tirei o excesso de roupa de uma das pontas e bati chamando-a para sentar ali.

- Filha, você é o melhor presente que eu poderia ter ganhado nessa vida.

Eu só conseguia olhar nos olhos dela, torcendo para que ela interpretasse meu olhar de gratidão.

- Enquanto jovens, eu e seu pai fazíamos milhares de planos para o futuro, sabe? Pensávamos em quantos filhos {rimos}, onde moraríamos. Eu sonhava em ter um bistrôt {ela amava cozinhar} e seu pai me acompanhava sempre. Ele até levava jeito: dizíamos que ele iria gerir o negócio e eu cozinhar {rimos}. Nós nos organizamos para cada passo. Cada detalhe.

Lembro que enquanto estávamos sentadas na minha cama, nessa hora os olhos dela tilintavam por causa da luz do luar que entrava pela janela.

- Foi quando tentamos o primeiro filho. Sonhamos. Ia ser um menino, sabia? Você ia ter um irmãozinho!" - em meio a sorrisos, uma lágrima escorreu pelo seu rosto. Eu nunca soube que eu teria um irmão mais velho até aquela noite. Nesse ponto, já chorávamos e ríamos juntas.

- Eu estava com sete meses de gestação... Já tínhamos ajeitado todo o enxoval, a cor era verde! Numa tarde, eu tive vontade de comer uma torta de chocolate. Numa tentativa de subir no banco para pegar a farinha no armário, eu caí e, imediatamente, comecei a sangrar. Seu pai estava na área externa da casa, naquela tarde. Quando ele ouviu o barulho, ele apareceu afoito na cozinha. - nessa hora, eu já estava perplexa. Era o tipo de cena que eu imaginava para tragédias cinematográficas do gênero. {vai dizer que não?}

- Ele me socorreu e fomos direto para o hospital. Eu fui submetida a uma cesariana de risco. A possibilidade de nós dois morrermos naquele dia era alta.

Eu escutava o relato surpresa. Eu tinha 23 anos e nunca soube daquilo.

- Depois de quatro horas na sala de cirurgia, do esforço de fazer com que pelo menos um não morresse... O bebê nasceu morto. - lembro que eu já estava em prantos, minha mãe? Sem comentários.

- Eu e seu pai passamos por uma crise. Eu não sentia mais felicidade com nada e seu pai todos os dias tentava se superar para me fazer feliz. Passou dois anos. Dois anos desperdiçados. Eu me senti culpada por não ter sido tão forte como seu pai, por não ter nos dados uma segunda chance antes. Ao invés de um ajudar o outro a passar por aquele momento, eu fui mais um fardo para ele. Então, superei e a trancos e barrancos, recomeçamos.

Naquele momento raro, eu pude perceber que apesar da atual "distância", um dia o amor dos dois teve força o suficiente para que continuassem juntos. O amor de meu pai lhe deu força e paciência para continuar ao lado de minha mãe e o de minha mãe foi a ponte para uma segunda chance aos dois.

- Você, Camila! Você foi o resultado da nossa segunda chance. A graça de sermos pais novamente supriu todas as lacunas que um dia quase destruiu nossa união. Todos os dias, ao vê-la, nossa alegria aumentava e hoje você é o nosso maior tesouro - rimos e nos abraçamos.

- Eu te amo, dona Marília! - disse a ela ainda abraçadas.

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Ao lembrar dessa noite, eu chorei, mas percebi que, apesar da dor, ela me amava. Ela me amou até o último minuto.

Fui tomar um banho e aproveitei para lavar o meu cabelo. Quando saí do banheiro, abri as cortinas e comecei a arrumar meu quarto. Eram quase 10:00hrs. Peguei a caixinha. Abri o cartão.

{Algo simples para um tesouro. Com muito amor, mamãe.}

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