Triângulo - parte 3

115 34 0
                                    


É claro. É claro que ele ia me beijar. O que você esperava, Carol, que ele segurasse sua mão a tarde inteira e te abraçasse só porque vocês são amigos?

Um turbilhão de pensamentos passou pela minha cabeça quando senti os lábios de Pedro sobre os meus. Primeiro, veio o choque – o que ele está fazendo? –, que então deu lugar para a culpa – o que eu estou fazendo? -, até finalmente ser substituído por uma alegria intensa: eu estava mesmo precisando disso.

O beijo foi rápido e leve, e mesmo assim, pareceu levar uma eternidade. Pedro tinha um gosto doce que combinava com ele, e um daqueles beijos onde a pessoa não abre muito a boca, e ainda assim consegue fazer maravilhas. Quando me soltou, avistei o ônibus chegando e fiz sinal. Me distanciei lentamente do seu abraço e murmurei um "tchau" tímido antes de partir.

Alguém lá em cima deve ter olhado por mim, pois havia um lugar vago no ônibus quando entrei. Me sentei, sabendo que o choque da situação havia sido demais pra que eu aguentasse de pé. Pedro tinha me beijado! Do nada, depois de todos aqueles anos.

Saí do torpor ao ouvir uma notificação de mensagem no celular. Peguei por instinto, e descobri mais uma de cinco mensagens de Mateus. Depois de dias em que mal nos falávamos, ele tinha escolhido hoje, justamente hoje pra me dar atenção.

Logo após nossa curta conversa quando cheguei ao churrasco, ele tinha enviado:

"haha, queria estar aí. Aqui não tem nada pra fazer.

Mentira, tenho que consertar o chuveiro. Mas só."

Seguido de uma foto do chuveiro torrado. E então, mais tarde, escreveu:

"Vi isso e lembrei de você"

E um link pra uma lista de "coisas que todo vegetariano gostaria que você soubesse".

Abri o link, mais pela distração do que por interesse. A lista era realmente bastante engraçada, e me identifiquei com vários tópicos. Então voltei à nossa conversa e digitei:

"hehehehe maravilhoso! É bem assim mesmo"

Guardei o celular e não mexi mais nele até chegar em casa. Sem me dar conta do que estava fazendo, levei uma mão aos lábios, como se ainda não conseguisse acreditar no que tinha acontecido. Ele tinha me beijado. De novo. E eu não apenas deixei, como o beijei de volta.

Olhei para a bolsa, me sentindo culpada ao pensar em Mateus sozinho em casa enquanto eu ia pra churrascos e beijava outros caras. Que droga, não podia ter feito isso com ele. Ele não merecia.

Mas aí pensei: eu havia mesmo feito algo com ele? Mateus e eu não éramos namorados. Ele era um cara com quem eu estava relativamente enrolada, mas com quem eu não tinha nenhum tipo de compromisso sério. Diabos, a última vez que nós tínhamos saído já fazia mais de duas semanas, e mal estávamos nos falando. Eu não devia nada a ele... devia?

Meu auto-julgamento continuou até quando desci do ônibus e caminhei até em casa. Meus pais tinham saído, então fui direto pro quarto e me joguei na cama sem sequer trocar de roupa. Estava exausta, mental e fisicamente.

Peguei o celular e mandei uma mensagem pro Tamóia. Se tinha alguém que podia me ajudar sem me julgar, esse alguém era ele.

"Então. O Pedro me beijou."

"AHÁ! Eu sabia! Vocês estavam muito de digidigin lá atrás!"

"O que é um digidigin?"

"Ah, você sabe. Mãozinha, conversinha, digidigin."

"Tá. É. Sei lá. Eu não estava pensando muito sobre isso, sabe? Aí ele me beijou."

"E como foi?"

"Foi ótimo. Na hora. Agora estou me sentindo meio culpada."

"Por causa do grandão?"

"É."

"Bom, vocês não estão namorando, né?"

"Não. Mas eu gosto dele."

"Não tem pelo que se sentir culpada, então. É só não deixar acontecer de novo."

"Rá, nem preciso me esforçar. Aposto que o Pedro vai sumir de novo."

"Problema resolvido então!"

"Você acha que eu devia contar pro Mateus?"

"Contar o que, Carol? Você não deve satisfação pra ele! Em algum momento alguém pediu exclusividade?"

"Hm, não."

"Então é isso. Deixa quieto. Foi só um beijo."

Pus o celular de lado, ainda pensando nisso. Foi só um beijo. Só um beijo. Não tinha nada de mais.

Tinha?

Nossas MulheresOnde histórias criam vida. Descubra agora