Assim que ela fechou a porta um enorme sorriso despontou em seus lábios. Soltou o ar lentamente por entre os dentes enquanto assimilava o que tinha acontecido.
"Nós não temos como ficar com você na empresa", aquela mulher dissera e deu pra ver pela forma como falava que esperava uma reação completamente diferente da menina. Mas ela conseguiu conter a explosão de felicidade que invadiu o seu peito e responder apenas com um impassível "sem problemas". Desconcertada, a mulher entregou o contrato de rescisão dizendo que a menina não teria que ir lá nunca mais.
E a única coisa que ela conseguia pensar era em todas as vezes que tivera que aguentar as explosões sem sentido daquela mulher, a forma debochada como falava "mas desenhista tem que saber disso" quando a menina não sabia de algo, os gritos incessantes que dava para todos por qualquer motivo, a forma como a tratava que nem uma burra. E as vezes em que a humilhava na frente dos outros, todas as vezes que implicou sem motivo algum com as coisas que a menina fazia. Ou quando insinuou que ela era anormal apenas por fazer algo de forma não convencional.
Nunca mais ficaria desesperada quando fizesse algo errado e nem sairia correndo para tentar achar uma forma de esconder as provas do "crime" por medo da reação daquela mulher. Nunca mais tentaria se esconder dentro daquela fábrica fugindo dos rugidos daquela louca dirigidos a outra pessoa. E por mais que o ataque de ira fosse para outra pessoa, aqueles berros roucos e irritantes a cortavam do mesmo jeito.
Então não, ela não reprimiu a felicidade que desabrochou no seu peito. Mesmo sabendo que estava ficando desempregada no pior momento econômico do século XXI. Não, ela não se preocuparia com isso no momento.
Ela estava livre.
E naquele dia ela foi embora para casa feliz e em paz, com um sorriso bobo, o andar quase saltitante e a doce certeza de que voltaria a se sentir como gente de novo.
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Rastros Do Cotidiano
Short StoryCrônicas sobre a vida de uma jovem adulta com problemas de primeiro mundo.