Passara o dia inteiro com a cabeça latejando e os olhos inchados e pesados. Suas lágrimas poderiam ter enchido uma piscina, o nariz estava ardido e vermelho de tanto limpá-lo com papel higiênico e mesmo assim ela se arrumara.
A garota não iria mais abaixar a cabeça quando estivesse certa, não iria mais se deixar frustrar. Custe o que custasse. Por isso ela respirou fundo, tomou banho, até mesmo se depilou – porque vai que, né –, escolheu uma roupa bonita e se maquiou como sempre. E foi.
E estava lá, em pé no meio do cinema esperando na fila junto com ele. Os dois riam de alguma besteira, quando o rapaz lhe deu um selinho e com um sorriso bondoso perguntou:
"Deu pra se distrair um pouco?"
Por alguns segundos ela não entendeu do que ele estava falando, mas então a compreensão a dominou. Havia esquecido por completo o que acontecera, mesmo tendo passado boa parte do tempo falando sobre isso enquanto comiam. E junto com ela veio a percepção de que no fundo ele estava preocupado. Do jeito dele, meio ogro meio distante, ele estava tentando fazê-la se sentir melhor.
Um sorriso doce despontou nos lábios da garota enquanto ela fazia que sim e murmurava a resposta.
A primeira vez que saíra com ele desde que voltaram a se falar a garota se perguntou com desdém "é sério que eu era apaixonada por isso?", e não conseguia entender em que momento e nem porquê isso acontecera. Até agora. Até aquela pergunta. Como podia ela não ter se apaixonado por ele da primeira vez em que se envolveram? Como podia ela não confundir esse carinho que sentia sem esforço algum por ele com amor?
O abraçou com ternura e agradeceu a si mesma por não ter guardado rancor dele. Afinal, no garoto encontrara um ótimo amigo independente de por quanto tempo essa história de se beijarem fosse durar dessa vez.
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Rastros Do Cotidiano
Short StoryCrônicas sobre a vida de uma jovem adulta com problemas de primeiro mundo.