‡3‡

8 2 0
                                    

Estamos saindo do hospital. Já se passaram três dias. Passei dia e noite falando com Tyler sobre tudo e mais alguma coisa e agora sentia como se já o conhecesse havia anos. Caminhamos lado a lado pelas estradas da cidade.

_ Vamos até ao parque?- ele perguntou empolgado.

_ Não.- me olhou desiludido- Você não vai querer que o achem louco por tarde falando com as paredes.

_ Não me importo. Todo mundo me acha louco aqui. Só é mais uma prova de que realmente o sou.- encolheu os ombros e se sentou num banco em frente para o lago.

_ Eu costumava vir cá com meus pais. Quando era pequeno. Até aquele acidente...

Tyler sofrera um acidente quando tinha 15 anos de idade. Seu irmão mais velho, Cedric, acabou morrendo nesse acidente. Apesar de ser Cedric quem estava conduzindo a moto os pais culparam Ty por isso e desde esse dia que eles se odeiam.

_ Pois... Eu nunca estivera aqui antes.- eu disse simplesmente olhando à minha volta.

Era um parque simples. Um lago bem cristalino com vários peixes saltando da água, vários bancos em torno do lago e á volta tudo verde. Na grama corriam crianças e animais e os pais se sentavam na sombra das árvores. Ao longe podia ver se um parque infantil. Estava vazio. Todas as crianças que deviam estar se divertindo lá estavam em celularese tablets numa esquina á sombra. Todos deviam ter entre 6 e 12 anos. Alguns dos meninos que corriam agora se sentavam também á sombra pegando nos celulares de seus pais e se fixando somente naquele ecrã.

_ Que nojo desta sociedade. As crianças já nem andam no escorrega e tudo o mais. Passam a vida de cabeça baixa naqueles celulares.- bufei e Tyler suspirou.

_ Eu trato disso.- se levantou e foi até as crianças.

Eu só fiquei observando ele dizendo algo a elas. Pouco depois o parque estava cheio de miúdos correndo e andando nos columpios.

_ Que foi que você fez?- perguntei examinando o garoto sorridente que se sentou do meu lado.

_ Só disse a eles que as árvores se podiam revolucionar e parar de fazer oxigénio para nós.

Eu ri e ele encolheu os ombros logo caindo também na gargalhada. Era impressionante como ele me tranquilizava. Há anos que não sinto uma paz tão grande mas desde que o conheço que me sinto... viva. Ele me faz sentir viva. Completamente viva. Esta palavra ainda me custa a ouvir. Vida. Viver. O que é isso? Eu já não sei mais.

_ Sabe, é melhor eu ir para casa. Amanhã tenho escola.-ele se levantou e eu levantei junto.

_ Posso ir com você?- me sentia receosa. Tinha medo de ficar ali, na rua, sozinha.

_ Claro. Porque não? Meus pais não se importam. Eles nem vêm você.

O segui e paramos em frente a uma casa simples de dois andares. Ele me guiou até ao andar de cima entrou num quarto de paredes azuis. Poderia descrever o quarto mas ele é bem comum (uma cama, um armário, mesa, cadeira, um puff azul e uma janela com vista para a estrada.

_ Bem simples né?- ele perguntou me assustando.

_ Eu gostei. É simples mas tem tudo o essencial...

_ Você... Dorme?- ele perguntou me fitando.

_ Sim. Nós, as almas,não nos casamos tão depressa mas dormimos. Já não durmo há três dias.- bocejei e ele riu.

_ Você usa sempre esse macacão?- ele perguntou tirando a camisola.

Por uns instantes percorri todo o seu abdomen. Seus abdominais perfeitos me paralisaram e ao perceber com eu estava tossi desconfortável e levantei o olhar rapidamente a tempo de ele me olhar. Graças a Deus não notou meu pequeno transe. Ele me olhou esperando algo e eu entendi finalmente.

_ Não tenho roupas de fantasma por isso tenho de o usar sempre.- encolhi os ombros e me sentei na sua cama.

Ele vestiu um pijama e se deitou batendo com a mão do lado dele para eu me deitar.

_ Boa noite.

_ Bons sonhos.- eu respondi me aconchegado na cama.

Logo senti sua respiração ritmada. Ele estava dormindo. Eu não. Me virei para ele e passei a mão perto de seu rosto. Tentei tocar nele, em vão. Minha mão passou por sua pele como se ele não estivesse lá. Como se eu não estivesse lá. Adormeci olhando para aquele anjo de cachos dourados.

Acordei com um som irritante. Soava como um milhão de sirenes sendo tocadas ao mesmo tempo. Como se todo mundo decidisse fazer barulho metade exato momento. Abri um olho espreitando. Tyler estava batendo num relógio com toda sua força. Cansado, pegou nele e o partiu contra a parede. Me levantei rindo e ele se virou para mim.

_ Odeio despertador.- ele murmurou indo até ao banheiro.

_ Não tinha reparado.- ri de sua cara de fúria e me voltei a deitar. Fiquei encarando o teto branco até ele chegar.

_ Vou para a escola. Que vir ou...

_ Eu vou.

Me levantei de um pulo e ele me sorriu. Aquele sorriso maravilhoso que fazia borboletas voarem em meu estômago. Esse sorriso que me trazia paz. Esse sorriso que iluminava o pior dia de tempestade.

A escola dele era simples. Alunos por todo o lado. Professores exasperados correndo atrás de alunos mal comportados. Raparigas do lado do time de futebol da escola. Tudo normal. Descobri bem depressa que Tyler era o isolado/nerd/zoado da escola.

Ele não conhecia ninguém. Bem, ele conhecia mas eles não conheciam ele. Um garoto alto e forte, de cabelos pretos longos presos no alto da cabeça, se aproximou de nós.

_ Aqui está o nosso querido Tyty. Você tá bem? Ouvi dizer que levou um tiro.- ele pegou na gola da camisa dele e o levantou- Que pena que não tenha morrido.

_ Da um murro bem no nariz dele e depois um pontapé no seu bem precioso.- eu disse para Tyler.

Ele me olhou como se eu tivesse quatro cabeças nascendo. Eu fiz sinal para ele fazer isso.

_ Pra onde tá olhando idiota? Ninguém vai ajudar você.- o garoto disse.

_ Não preciso de ajuda para tratar de um idiota desmiolado.- Tyler deu um murro em seu nariz.

Me olhou assustado com sua atitude e eu assenti sorrindo. O garoto sangrava e olhava ameaçadoramente para Tyler.

_ Não mexe comigo.- disse Tyler logo dando um pontapé no sítio indicado.

O garoto se contorcer de dor e eu sorri saindo da sala com Tyler do meu lado.

Prisioneira do teu olharOnde histórias criam vida. Descubra agora