Capítulo 9 - Eu sou Arxos

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Meu coração está desde aquele fatídico dia em pedaços, porque eu sabia que ele não voltaria a me amar. Eu podia ver sua felicidade com Math. Quando eu descobri o que estava acontecendo eu só quis verificar se ele realmente seria bom suficiente para ele e por mais que eu odeie a ideia ele provou que seria até mesmo melhor que eu nisso.

Todos nós, que um dia tivemos a honra de ter Gui em sua vida estávamos sentados naquela pequena sala de espera. O branco e o cheiro de detergente me lembrava o quanto eu não gostava de hospitais. Eu estava sentado próximo ao corredor, e próximo ao Math. Ele estava péssimo. Nunca havia visto ninguém ficar no estado em que ele se encontrava.

Ele fitava o vazio de sua mente, não havia expressão nenhuma em seu olhar, eles estavam parados e fixos no nada. Seu cabelo havia crescido nos últimos dias e estava desgrenhado. Seus olhos tinham bolsas roxas que estavam quase se tornando negras e aprofundavam sua inexpressão. Ele estava morrendo junto com Gui e começo a pensar o que aconteceria se Gui não resistisse.

Contra todas as possibilidades, mesmo ainda amando Gui eu me preocupava com o garoto que estava sentado sem nenhum sinal de vida aparente. Acabei aprendendo da forma mais dolorida que quando se ama você deixa a pessoa criar asas e voar para longe mesmo que ela nunca volte para você, porque a felicidade dela é mais importante do que a nossa própria felicidade. Mas nem mesmo os pensamentos mais insanos em que Math deixa Gui eu poderia alimentar porque não quero que ele sofra.

Levanto e sigo em caminho da cantina, Matheus me acompanha em silencio. Nos aproximamos da máquina de café, ele pega um café expresso e eu um café com leite. Seguimos até uma das mesas e nos sentamos. Ele me olha e eu faço o mesmo, de maneira curiosa e acabamos rindo.

— Isso é muito louco.

Tomo um gole do meu café com leite e o olho, meus dedos giram o copo em minha mão, suspiro e o respondo.

— Acho que é a loucura mais sensata que poderia acontecer nesse momento. Ver tantos caras em um lugar só por causa de Gui é algo que nunca imaginei ver.

— É... mas o que acha do que Math está sentindo? – ele bebe um gole de seu café. – Porque nós não estamos tão abalados assim.

Dou um breve sorriso.

— Acho que é verdadeiro e reciproco. Se fosse ele naquela cama, Gui estaria do mesmo jeito. A questão é que nós já passamos pela vida dele. Já tivemos nosso momento, mas por alguma razão esse momento acabou. Eu ainda amo Gui, mas não amo como antes.

— Ama?

— O que quero dizer é que existem várias formas de amar. Pensa comigo, nós passamos pela vida namorando e conhecendo pessoas. E temos esses momentos, mas quando ele chega ao fim esse amor mesmo que ainda exista se transforma com o tempo. Deixa de ser um amor de um homem por outro homem, para ser amor de irmãos. Math está mal, porque ele ama Gui como homem, ele quer estar com ele pelo resto da vida.

— Mas se ele continua daquele jeito ele vai acabar passando mal. Ele nem está se alimentando direito.

— Você acha que ele seguiria a vida dele, sabendo que o homem que ele ama está a um passo de morrer e que o futuro deles é incerto. Pode parecer exagero, mas pelo que vejo, se Gui morreria por ele.

— É algo que eu não consigo compreender.

— Porque ainda não achou a pessoa certa para você. – disse dando um breve sorriso e bebendo mais um gole do meu café com leite.

— Acho que de todos o seu momento com ele foi o mais louco. Digo digno de um filme de ação, balas e tudo mais...

Começamos a rir. Era bom distrair a mente por um minuto, mesmo que as lembranças da época não sejam as melhores.

— Mas e o seu irmão...

— Marxos?

— Sim.

— Marxos está preso em uma prisão de segurança máxima a algum tempo. A última vez que o vi ele tinha adotado o nome de Marxsane.

Começamos a rir novamente. Mas a verdade era que ele depois de tudo perdeu a sensatez, tomava alguns remédios e frequentava a ala psiquiátrica por ser agressivo, tendo a se comportar como uma versão puta de Gui na cadeia onde ele tinha relações com quase todos que lá estavam. Eu estava rindo porque eu já havia chorado de mais pelo o que ele havia se tornado.

— Então vocês estão aqui. – dizia Kall se sentando ao nosso lado na mesa. – Estou atrapalhando algo? – dizia ele com um sorriso na face.

— Não. – dissemos em uníssono.

— Alguma novidade? – perguntei.

— Nada no quadro, mas Math está no quarto com ele nesse momento. – assentimos — Então do que estavam falando?

— Sobre como cada um de nós caiu de uma forma diferente na vida de Gui. E como é estranho ver todos os ex de Gui em uma recepção de hospital.

— É algo que realmente não se vê muito. – diz Blake se juntando a nós.

— Todos estão aqui? – diz paloma se aproximando com seu namorado e puxando cadeiras para se sentar em nossa pequena reunião. – Porque não chamaram todos? – disse ela indignada.

— Sabe o que faltou nessa reunião? – perguntou Math.

— O que? – disse Kall.

— Uma garrafa de whisky e uma fogueira.

Todos rimos. Nos conhecíamos a poucos dias, e todos estávamos ali pelo Gui. Erramos, mas tentamos fazer o melhor que poderíamos e estávamos ali para ver ele saindo daquele hospital. A conversa tomou novos rumos falando de coisas engraçadas que aconteceram, mas eu podia ver que Math me olhava mais que o normal.

Nossos olhos se encontraram, ele deu um sorriso e eu devolvi a ele. Era estranho estar ali, mas nunca me senti fazer parte de uma família como me sentia naquele momento, mesmo que eles não fossem meus irmãos de sangue e que todos praticamente já tivemos algum relacionamento amoroso com ele. Mas isso poderia ser um recomeço a todos nós.

E por um momento todos nós esquecemos que algo ruim poderia acontecer, mas como sempre ouvir dizer quando era criança que quando a esmola é grande o santo desconfia e por algum motivo meu sorriso havia sumido do meu rosto e me peguei olhando para a porta da cantina, eu me sentia como em um filme. Meu corpo decidiu que era hora de levantar e por instinto comecei a caminhar. Eu podia sentir os olhares atrás de mim, ouvir alguém me chamar, mas quando dei por mim meus pés estavam correndo e o som de dos pés que corriam pelos corredores silenciosos me acompanhavam.

A porta estava aberta, vários enfermeiros estavam entrando rapidamente dentro de um quarto, meu coração se acelerou e o desesperou começou a tomar conta de mim, mas não era a primeira vez que eu o via sendo arrastado para fora do quarto com os olhos inchados e chamando pelo nome dele. A dor o consumia a cada dia que passava, a cada mal sinal, a cada preludio de sua possível morte. Eu esperava estar enganado, porque Gui jamais iria querer algo assim para ele, mas Math é o tipo de cara que morreria de bom grado se fosse para ficar com ele pela eternidade.

Qualquer um poderia chamar de egoísmo, que seria burrice, mas nós que estamos do outro lado, não sabemos o que realmente se passa pela cabeça dele, os sentimentos. Eu não posso julga-lo, ninguém pode.

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Eu sou Demais - Livro III (Romance Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora