Entre o céu e o inferno

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Eu tinha apenas doze anos quando conheci o Cassiano pelo msn. Não me lembro muito bem como ele foi parar na minha lista de amigos, mas acho que foi em alguma comunidade do orkut. Por ali, começamos a conversar e logo eu soube que estudávamos na mesma escola. O nosso primeiro encontro foi perfeito, um típico encontro às escondidas na escola.

- Oi, Flávia, podemos conversar atrás da biblioteca? - Ele me perguntou segurando a minha mão direita. Senti meu corpo gelar e minhas mãos molhadas.

Não respondi, apenas dei um sorriso e seguimos para um estacionamento atrás da biblioteca da escola. Não conversamos muito, mas posso dizer que nossas bocas e salivas entraram em uma conexão perfeita, e também, especial. Continuamos ali durante uns vinte minutos, pois eu tinha que ir para o curso de inglês, e mesmo sendo namoradeira, sempre priorizei os meus estudos.

Caminhei olhando para tudo e não enxergando o que estava na minha frente. Senti o cheiro do seu perfume e aquele beijo não saia da minha boca. E foi assim que o pensamento se manteve na aula de inglês, durante o jantar, na madrugada e nos meus sonhos. Pode até parecer coisa de menina apaixonada, mas ele parecia já morar em mim.

Continuamos com as conversas pelo MSN. Quando eu ficava online e ele não vinha falar comigo, eu ficava online e offline em questão de segundos, só para a plaquinha do meu nome subir até o teto da tela. Era o meu jeito de chamar atenção dele. E eu sempre conseguia. É até engraçado lembrar, pois parecia que ele sabia que aquilo tudo era por ele.

Durante uma semana eu ficava conversando com ele durante toda a madrugada, dormia somente umas duas horas, acordava com um sorriso no rosto e me arrumava para ir para a escola. Eu parecia uma boba apaixonada, pois ria de tudo e, pelo meu olhar, qualquer um poderia notar algo diferente. Até mesmo os garotos com quem já havia beijado, eu não estava me importando com eles. Eu queria o Cassiano e pronto.

Por mais que estudássemos na mesma escola, era difícil encontrá-lo. Nossos intervalos para o lanche eram diferentes. E parecia uma obsessão, mas queria vê-lo todos os dias, nem que fosse de longe pela janela da minha classe. Era aquela janela que ficava ao lado da minha carteira, a terceira da última fileira, que virou a minha amiga durante aquela semana.

Somente naquela semana.

Foi quando, depois de uma semana de espera, consegui marcar outro encontro. Dessa vez, não era na escola, mas numa rua perto da casa dele. Dessa vez, eu preferi ficar doente para não ir à aula de inglês.

A rua não era muito movimentada, era daquelas ruas sem saída em que não havia crianças. Somente as senhoras varrendo a calçada pela manhã. A minha sorte é que já estava anoitecendo e eu poderia ficar mais à vontade com ele. Ou não.

Sentamos na calçada, no meio fio, e começamos a nos beijar. Eu estava perdendo a noção do tempo e ele, acariciando o meu rosto. Coisa de pré-adolescente boba, mas eu sentia que havia encontrado um príncipe encantado. Foi quando um carro preto entrou na rua com o farol bem alto, eu mal conseguia enxergar. Ele veio até o final da rua, no local onde nós estávamos, e quando consegui tirar toda aquela claridade que me incomodou durante uns minutos, consegui enxergar dois homens armados. Eu não sabia, mas Cassiano usava drogas e estava devendo a uns traficantes do bairro.

O príncipe virou sapo em segundos.

Os homens gritavam muito e até agora não entendi como souberam que nós estávamos lá. Não entendi porque nenhuma senhora que varre a calçada de manhã não chamou a polícia. Não sei muito bem, mas caí numa armadilha.

- E aí Cassiano, seu drogado de bosta! Vai pagar nós ou nós vai levar a mina! - Um dos caras disse, olhando bem para o meu rosto.

Eu estava em pânico.

- Podem levar a mina! - Cassiano disse e saiu correndo sem olhar pra trás.

Eu não conseguia me mexer e fiquei olhando para os homens. Um deles me pegou pelo braço e me jogou no carro. Pensei "pronto, vou morrer!". Pense naqueles filmes de terror em que a mocinha grita por ajuda, mas o vilão corta a cabeça dela sem piedade. A única diferença é que eu não gritei por ajuda, e Cassiano, o vilão, não cortou a minha cabeça. Cortou o meu coração e plantou um ódio dentro da minha alma.

- Mina, quer uns biscoitos? - O mesmo que me jogou no carro me ofereceu algo para comer.

Eu somente balancei a cabeça dizendo que não queria nada.

- Nada vai acontecer com você, é só você ficar de bico calado, entendeu? - O outro homem disse com um tom rude.

Ao mesmo tempo que estava com medo, me tranquilizei. Concordei com tudo. Depois de algumas horas eles me deixaram perto de casa e fui embora. Pânico, tristeza e raiva estavam misturados em mim. E eu, perdida dentro deles.

Depois disso, eu sempre encontrava esses dois homens na rua. Apenas acenávamos de longe. Cassiano não falava mais comigo na escola e nem no MSN. Também não o procurei, mas como a vida tem seus caminhos loucos e temos direitos as nossas escolhas, um dia encontrei esses dois homens numa lanchonete perto da escola, foi então que comecei a me aproximar de Adriano e Magno, os tais dois homens.

Sempre nos encontrávamos depois da escola, e um belo dia, conversando, resolvemos nos vingar de Cassiano, porque além de ter feito o que fez comigo, ainda estava devendo aos traficantes. Sem piedade, voltei a conversar com Cassiano.

- Oi Cassiano, vamos teclar e recomeçar do zero? - Foi no MSN que resolvi me aproximar dele.

- Estou com saudades de você, me apaixonei e quero muito que a minha primeira vez seja com você. - Teclei dando gargalhada.

Ele demorou para ceder, mas depois resolveu aceitar. Pedi para que ele escolhesse um lugar especial, e ele organizou tudo. Iríamos para a casa da avó dele, que havia falecido há alguns meses, mas a família não havia se desfeito de nada.

Chegamos no local, a casa ainda estava intacta e limpa. Muitos mimos, fotos pelas paredes e um sofá confortável. Foi sentada nesse sofá que ele começou a me beijar em pé, tentando abrir o zíper da sua calça. Mas não conseguiu. Adriano e Magno chegaram na hora, arrombaram a porta, quebraram a casa inteira e deram uma surra em Cassiano.

Fomos embora juntos e nunca mais vi Cassiano. Desde então viramos melhores e amigos, e quando percebi, já estava dentro do crime. Comandava o tráfico de armas e munições e muitos traficantes apareceram para tomar o meu lugar. Eu tinha duas opções: ou eu matava, ou eu morria.

- Flávia, você terá que se aproximar de Robson - Magno me intimou enquanto limpava uma de suas armas.

- Os primos de Robson são os homens que querem tomar o seu lugar. , mas podemos saber informações. - Adriano me explicou.

Eu já conhecia o Robson somente pelo MSN e ele sempre me mandava mensagens por lá, mas eu nunca respondia. Foi então que comecei a responder e dar atenção para ele. Fiquei com ele para saber informações, mas sem querer começamos a namorar. Me apaixonei e não aguentava mais viver uma mentira.

Foi quando eu contei toda a verdade.

Ele disse que também me amava muito, porém, Adriano e Magno ficaram contra mim. Foi quando eu larguei tudo e enfrentei todos. Estamos juntos há cinco anos, e ele é o amor da minha vida.

Cassiano está preso, Adriano morreu e Magno surtou. E eu, sendo filha de PM, entrei para a vida do crime somente para encontrar o amor e nunca mais voltar para aquele lugar.

Por Joyce Xavier
Baseado em fatos reais

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Gennnnnte, que história bafônica!
E aí o que acharam?

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