Vida comum

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Estava uma manhã triste, com o céu acinzentado como pode-se considerar normal no interior de Minas Gerais no inverno. Haviam algumas pessoas caminhando pela universidade na qual eu estudava, e era habitual meu questionamento do que aquelas pessoas estariam fazendo ali tão cedo por volta de seis horas da manhã. Sempre tive essa mania de me colocar no lugar das pessoas , de pensar nas mais diversas possibilidades que levam alguém a fazerem as mais diversas tarefas. No trânsito a mesma coisa acontece, as vezes me pego pensando pra onde todos aqueles carros estão indo. Me desperta curiosidade, acho que retrata um pouco da vida, é um coletivo que aparentemente está parado mas se nos atentarmos percebemos que cada mente está mergulhada em milhares de pensamentos e também na sua individualidade, apesar disso, estão cercados de gente por todo lado.
Essa dicotomia da cidade é curiosa, pois as pessoas estão sempre rodeadas por todos os lados e sentem-se sozinhas, se locomovem o tempo todo mas parecem não chegar a lugar nenhum. Buscam objetivos inalcançáveis e no final se satisfazem com quase nada. Enfim nossa sociedade moderna assenta-se em cima da ansiedade que tem como fim o próprio vazio.
Sempre me senti descolada e incomodada com a realidade, e como me interesso tanto pelo comportamento das pessoas, decidi fazer psicologia, por achar que poderia compreender a mente das pessoas, que ilusão a minha.
Mais tarde nesse mesmo dia decidi sair com uma amiga, já que, era sexta feira e meus pais estavam viajando. Portanto isso significava muito mais liberdade para beber o quanto quisesse, além de poder voltar tarde para casa.
Não que meus pais fossem intransigentes, na realidade minha relação com eles sempre foi tranquila, chego até a dizer que fazia parte daquela parcela minoritária da população brasileira composta por uma família tradicional e sem muitos problemas.
As oito horas da noite fui para a casa da Ana, uma colega que conhecia a pouco tempo na faculdade mas que se mostrou muito receptiva. A casa era afastada do centro mas muito bonita, lembrava um pouco aquelas casas que a gente vê nas revistas de arquitetura, os amigos dela em sua maioria eram meros desconhecidos pra mim e eu não me senti muito a vontade naquele lugar.
Depois de algumas horas bebendo decidi ir embora e como não haviam táxis naquele lugar decidi ir andando. Sempre acreditei que nunca deveria deixar de fazer nada por causa do medo, na verdade a sensação de estar andando sozinha pelas ruas na madrugada até me excitava um pouco. Me fazia refletir sobre como eu era pequena no mundo e ao mesmo tempo livre. Além disso, já estava um pouco bêbada, e pra falar a verdade nem pensei muito no perigo daquilo tudo, se é que ele existia.
Provavelmente eram umas quatro horas da manhã por que o céu ainda estava escuro e os carros estacionados cobertos de neblina. Lembro que o caminho parecia bem mais curto na ida, mas agora voltando na escuridão e no silêncio praticamente absoluto tudo parecia longe e a bebida não ajudava nisso, na verdade eu mal conseguia me manter equilibrada. Mas apesar de tudo isso a noite estava tranquila o céu parecia ter vida com tantas estrelas nele e eu me sentia bem caminhando sem preocupações e fiquei feliz por me sentir segura e sem medo naquele momento.
Senti como se me libertasse de todo pensamento ruim que as pessoas sempre insistiam em colocar na minha cabeça de que o mundo é repleto de pessoas más e que devo ter cuidado, me senti pertencendo aquele lugar, aquela cidade que eu tinha nascido. O fato de não poder me sentir segura no próprio lugar onde moro sempre me trouxe incomodo e eu desafiava isso praticamente todo final de semana caminhando nas ruas voltando para casa e provando a mim mesma que não deveria temer nada, nesses pequenos momentos me sentia invencível.
Além disso, estava aliviada de sair da casa da Ana, tinha achado os amigos dela estranhos apesar de ter bebido com eles a maior parte da festa.
Eu estava caminhando por uma das ruas principais da minha cidade, mas tendo em vista que era de madrugada a rua estava vazia e poucos carros passavam em alta velocidade por ela. Confesso que nessa hora já estava começando a me arrepender de voltar andando pra casa e comecei a torcer para passar um táxi, eu já estava satisfeita com a minha pequena aventura daquele dia.
Foi nesse momento que um carro vermelho parou ao meu lado e me ofereceu carona. Nessa hora fiquei feliz, me achei a pessoa mais sortuda no mundo, já que, estava cansada de andar, além disso, o moço do carro era jovem, bonito e meu extinto não me impediu de entrar no carro. A realidade foi inversa, de certa forma toda aquela situação me atraiu como uma criança é atraída por um brinquedo novo desconhecido mas que justamente por isso desperta curiosidade.

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