7. Labirinto de fogo

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Março de 2017

Quarta-feira


Sentiu que não seria um dia bom no momento em que acordou.

O sábado com Edgar. Todos os momentos depois disso. Quase tudo isso desapareceu de sua cabeça. Quando abriu os olhos, Daniel sabia que não conseguiria sair do apartamento. Simplesmente sabia.

Não sabia explicar como se sentia. Primeiro aquela agonia que parecia se mover sob a sua pele. E aí sentiu. Era difícil dizer como era, mas sempre se imaginava como se estivesse no oceano, imóvel e afundando. Como se seus ossos pesassem toneladas. E a água densa. E ele afundava, e afundava, mais e mais, até enfim chegar ao fundo. E depois, sentia como se as sombras e as águas saíssem do chão, o enrolassem, o apertassem. E então o puxassem para baixo, até que nada mais sobrasse além de terra e escuridão. E dor. E solidão.

Sua visão estava nublada. Se sentou na beirada da cama. Parecia que seu peito estava atravessado. Doía. Era uma dor realmente física. Tentou lembrar de coisas simples. Se focou em seu nome, sua idade, seus cinco álbuns favoritos. Ele não se sentia assim desde alguns dias antes de conhecer Edgar. Seu pai ainda estava no apartamento. Ele lhe dera o remédio e antes de sair do quarto, deu um soco de leve em seu ombro e foi isso. Lembrar não deixou as coisas piores. Sentiu como se mais dois espinhos atravessassem seu coração.

- Save Rock and Roll. E 2112. E Heroes. E Ceremonials. E Melodrama – repetiu mais uma vez. E mais uma. E mais uma. E de novo, de novo e de novo.

Então afundou no oceano mais uma vez.

Ele sabia porque estava assim. Tinha sonhado com Aquilo. Pior; com o que Aconteceu Antes. Tudo havia se enrolado na sua cabeça. Ele mal se lembrava dos detalhes do que havia sonhado, mas sabia que devia ter gritado em algum momento. E sentiu as lágrimas secas em seus olhos. Flashes vinham como balas na sua cabeça. A cada pedaço que se lembrava se sentia pior.

As sombras no seu quarto pareciam ter vida. Às vezes sentia como se fossem buracos negros. Às vezes sentia que ele é quem era o buraco negro. Era uma questão de subjetividade, é o que diria a psicóloga dele, Dra. Gabriela. "Sua dor não é o problema, Daniel. Seu problema é quando deixa essa dor consumi-lo e deixar que ela seja seu guia pelo Universo. E a dor não é um guia bom."


Foi até a cozinha, se sentindo com sono, e torpe. Sabia que haviam estágios, então estava apenas preocupado em chegar ao próximo. Pegou um copo, abriu a geladeira e bebeu um pouco d'água.

- Não sei se você está aí – disse em voz alta. - Mas hoje não tô afim de nada. Então não tenta.

Voltou para o quarto e dormiu um sono sem sonhos.

***

Quando Daniel acordou, não sentia nada.

Não que não pudesse sentir dor ou tristeza, mas sim agora só conseguia sentir nada sobre isso por saber que não conseguiria mudar ou que nem consegue se esforçar pra mudar. Ao levantar e sentar na beirada da cama, apenas ficou isolando e compartimentando sua própria mente, até sentir que não se importava mais. E assim, por não sentir, começou a sentir que estava morrendo lentamente por dentro.

Até não sobrar quase nada.

Seu celular vibrou. Desbloqueou e leu:

PAI: Boas notícias. Vou voltar mais cedo. Sábado tô em casa.

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