Escamas de Sangue

Cap.I - Irmãos

O grande pássaro negro sobrevoou as sequóias plainando as asas abertas. Soltou um único guinchado agudo quando a flecha o atravessou.

– Ah! Ainda está contando Orion? Ou já perdeu as contas?

– Não seja pretensioso Jason! Estamos quase empatados!

Orion armou o arco, mirou entre as gigantescas árvores e acertou mais um pássaro em pleno voo. Jason sorriu e pendurou seu arco no ombro. Os dois caminharam devagar procurando suas caças. Nenhum dos dois era bom com as palavras por isso andavam em silêncio, apenas sentindo a presença reconfortante um do outro.

Jason recordava os anos de sua infância quando as caçadas eram frequentes. Quando ficavam por dias na mata, apenas caçando, pescando, sem se preocupar em voltar para casa.

Hoje eram raros os momentos em que os irmãos podiam caminhar pelas matas apenas por distração.

Orion se abaixou para apanhar mais um pássaro.

– É um dos seus, Jason.

Jason pegou a ave e sorriu. Colocou o pássaro em sua rede com cuidado e voltou a caminhar. Orion já ia lá à frente pegando mais um pássaro do chão. A caçada fora bastante produtiva. As redes de ambos estavam cheias e pesadas.

A casa de Orion não demorou a aparecer no meio das árvores, quase podia ser confundida com uma delas, erguida com troncos gigantescos. Quando se estava lá dentro o cheiro de madeira viva impregnava o ar. Orion costumava dizer que podia sentir a própria alma da sequóia. Jason não duvidava.

Pararam a beira do riacho para limpar as flechas e separar os pássaros. As flechas de penas negras eram de Jason e as vermelhas de Orion. E aos poucos monte negro ficava um pouco maior que o outro.

– Você ganhou por pouco, Jason!

Jason olhou para a própria rede. Fingindo não perceber que Orion sempre o deixava ganhar.

Os gêmeos tinham sido idênticos durante a infância e grande parte da adolescência, mas o emaranhado de cabelo e barba que Orion deixava se formar em seu gosto não permitia mais que as pessoas os confundissem.

Jason olhou o irmão mais velho com amor e admiração. Mas não disse nada. Apenas continuou retirando suas flechas dos pássaros mortos e lavando-as na água do rio.

– A caçada foi boa, pai? – Mikhail vinha correndo, os olhos azuis sorrindo. – Mas o tio Jason ganhou do senhor.

Olhou Jason e abriu um encantador sorriso.

– Seu pai me deixou ganhar, Mik.

– Não deixei, não!

Orion fez uma cara de ofendido e Mikhail soltou uma sonora gargalhada. Algo que os gêmeos não sabiam mais fazer.

Mikhail pegou um dos pássaros e começou a arrancar as penas do rabo, eram as melhores. Tomava cuidado para que saíssem inteiras e as amontoava perto do tio. Jason as usava para identificar suas flechas.

– Na próxima vez, Kearney e eu podemos acompanhar-vos na caçada?

Orion ponderou antes de responder. Olhou para Jason que ficou impassível, o que o irmão decidisse estava decidido.

– Tudo bem, se seu tio Jason deixar Kearney vir também.

– O senhor deixaria ele vir tio?

– Claro, Mik.

– Ótimo! E quando vocês irão de novo?

– Na próxima folga do seu pai.

– Ah, mas isso vai demorar séculos!

– Não reclame Mikhail. Pegue esse pássaro e leve pra sua mãe fazer para o almoço.

Mikhail apanhou o pássaro e correu para a casa.

– Eles estão crescendo, ele já é quase um homem feito. Está chegando a hora de ganharem seu próprio animal.

– E uma esposa.

Jason olhou para o irmão. Há alguns dias vinha pensando sobre isso, tinha que começar a procurar uma esposa para Kearney.

– Você já achou uma esposa para Mikhail?

– Estou vendo algumas pretendentes. E você já pensou em alguém para Kearney?

– Não. Ainda não pensei em ninguém.

– Então é melhor começar a procurar, boas moças não estão fáceis de encontrar.

– Sim, você está certo. Vou pensar nisso. – Falou Jason enquanto colocava seus pássaros de volta em sua rede. Apanhou as penas que Mikhail havia separado e se despediu do irmão.

Sua casa ficava a alguns quilômetros dali, já no final da floresta. Jason caminhou devagar pensado na conversa com Orion: 'Uma esposa para Kearney'.

Nunca tinha contado para ninguém, inclusive para Orion sobre a conversa que tivera com o homem chamado Sebasthian. Por mais que confiasse em Orion ele não era só seu irmão, era também um Capitão de Ferro. Além disso, já fazia tanto tempo que às vezes pensava se realmente havia acontecido ou se tinha sido apenas um sonho estranho, mas lembrava-se da água entrando pelos seus pulmões e o sufocando, então tinha certeza novamente que havia sido real.

Foi apenas uma vez, uma conversa e Sebasthian nunca mais o tinha procurado, mas ele disse isso, 'apenas quando Kearney estivesse pronto'.

Jason viu a luz entrando por entre as árvores e soube que a floresta estava acabando. Espantou esses antigos pensamentos e chegou em casa.