Escamas de Sangue

Cap. V - Roch

Xanthus viu pela janela de seu quarto quando os filhos chegaram. De repente a ordem que dera mais cedo, para que fosse informado da chegada dos príncepes para que se desse início a reunião não lhe pareceu tão boa. Queria ficar em silêncio em seu quarto, sem pensar nas rebeliões ou em traidores. Devia estar ficando velho. O pai de Xanthus havia dito certa vez que ser rei era um cargo muito pesado para ser vitalício. Que deveria, em certo momento ser passado para o sucessor, mesmo que o antigo rei ainda estivesse vivo. Na época Xanthus riu, mas agora achava que aquela seria uma ideia excelente. Ser rei não era tarefa para um homem velho e, mesmo Xanthus estando forte e saudável achava que não estava mais em condições de guiar um reino.

Estava pensando nisso quando alguém bateu em sua porta. O guarda não esperou resposta e entrou.

– Rei Xanthus, os príncipes Joarque e Ásvila retornaram da caçada e já o esperam na sala de reuniões.

– Obrigado.

Xanthus ainda ficou alguns minutos sentado em uma poltrona ao lado da cama até criar coragem de se levantar e colocar novamente a coroa.

Do lado de fora do quarto Foster aguardava tranquilamente observando as armaduras apoiadas nas paredes. O guarda que chamara o rei não estava ali.

– Acho que eu não deveria participar desta reunião senhor.

Xanthus quis contrariar, mas achou melhor não. Por mais que quisesse a companhia do amigo seria mesmo melhor que estivessem presentes apenas o rei e os príncipes. O rei não permitiria que seus filhos estivessem acompanhados de seus homens de confiança, não seria justo que ele levasse o seu.

– Você tem razão, Foster, é melhor eu ter essa conversa com meus filhos sozinho.

Desceram dois lances de escadas pra chegar à sala de reuniões. Os três príncipes já estavam lá e Xanthus ouviu suas vozes antes de vê-los. Joarque contava com alegria como havia abatido um cervo da montanha. Edvar pedia mais detalhes. Xanthus sorriu ouvindo os rapazes conversando. Edvar nunca participava das caçadas, desde criança não gostava de ver os animais morrendo, se debatendo nas redes ou sangrando com as flechas. Sempre ficava em casa, mas queria saber tudo o que tinha acontecido. Hoje até ouvia os detalhes mais sangrentos, mas ainda não acompanhava os irmãos. Gostava mais de distrações como o jogo do mestre, um jogo de tabuleiro que requer muita estratégia e paciência, ninguém o vencia neste desafio, mas ele nunca conseguiu acertar uma flecha no centro do alvo.

Xanthus esperou que Joarque e Ásvila terminassem de falar para entrar na sala. Não queria estragar esse momento. Sabia que depois da conversa que teriam nenhum deles iria conversar sobre a caçada daquela manhã.

Ao verem o rei os rapazes se levantaram. Xanthus abraçou os dois filhos que ainda não tinha visto e sentou-se em sua cadeira. Joarque era o mais sociável. Talvez por estar sendo treinado desde criança para ser rei, teria que lidar com todos os tipos de pessoas estudava línguas, culturas e costumes diferentes, mesmo de algumas tribos que não faziam parte dos Reinos de Noithar. Já viajara muito, conhecia muitos lugares, por isso conseguia conversar com qualquer um, com um camponês falando sobre colheitas, com um sacerdote discutindo as vidas dos deuses quanto conseguia discutir política com seu pai. Todos gostavam dele, tinha um sorriso encantador, olhos cor de mel que brilhavam, cabelos compridos encaracolados que balançavam no vento quando estava montado em seu dragão. Mas sabia ser firme com seus homens e era justo. Seria um ótimo rei.

Edvar sempre tinha preocupado seu pai. Sempre foi uma criança mais medrosa que o normal, montava um cavalo razoavelmente bem, mas nunca quis dominar um dragão. Dos três filhos era o mais inteligente. Aprendia línguas com facilidade, sabia ler as estrelas, conhecia os mapas dos reinos de Noithar de cor, mas não era político. Não sabia como se expressar, era tímido e introvertido. Sorria muito menos que o irmão mais velho, mas quando o fazia era tão encantador quanto.