Untitled part

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Eu havia feito de tudo para te esquecer. Tudo.

Tentei de todas as maneiras possíveis não pensar em você.

Tentei virar santo, não deu certo. Tentei beijar outras bocas, sentir outros gostos, ouvir outros suspiros acelerados ao pé do ouvido; nada adiantou. Tentei beber, fumar, ter uma overdose de coisas que me fizessem te esquecer. Fracassei.

Tentei ter uma overdose de você, procurei teu cheiro, teus olhos, teu hálito. Relembrei de todos os momentos juntos, que não eram muitos, infelizmente. Nisso eu fui bom, mas não adiantava porra nenhuma.

Você tinha sido costurada, soldada e pregada dentro do meu peito. Da minha mente.

As flores não a trouxeram de volta, nem os cartões ou as milhares desculpas.

Nada a trouxe de volta.

Passaram-se semanas, até o dia em que te vi pessoalmente.

Você estava, no mínimo, péssima.

Sentada no mesmo bar de alguns meses atrás, bebendo algo, escrevendo qualquer coisa. Vi o garçom te olhar preocupado e você limpar o rosto.

Você estava chorando.

Eu não pensei direito na hora, porque já havia pensado em você o dia todo e aquilo havia desgastado minha mente humana, mortal.

Atravessei a rua e fui diretamente a porta do bar. Você estava de cabeça baixa, abrindo a porta para sair, então levantou o rosto e me viu.

Se você não estivesse com cara de quem não dormia há semanas, magra e cheirando a deus sabe lá que tipo de bebida você tinha tomado, eu teria rido de como suas emoções estavam nítidas em seu rosto cansado.

Surpresa. Mágoa. Frustração. E muita, muita vergonha.

Ficamos nos encarando pelo que parecia ser uma eternidade. Até que ela abaixou os olhos, limpou a garganta e saiu pela porta, sem falar nada.

Fiquei sem reação por um instante, até perceber que deveria ir atrás de você.

- Helen! – gritei, esperando que você olhasse para trás, mas nada aconteceu – Helen, por favor, fala comigo!

Eu corri para alcança-la, agarrando seu braço. Ela continuava com a cabeça baixa, mas dava para ver que suas bochechas estavam molhadas.

- Por favor, fala comigo... – repeti, mais suavemente.

- Não quero falar com você, me deixa – ela disse, sem muita convicção, tentando, inutilmente, soltar seu braço das minhas mãos.

- Você não está bem, me deixa leva-la para casa, pelo menos.

- Não.

- Por que não? – perguntei, um pouco magoado.

- Porque... porque não.

Eu ri e ela cruzou os braços brava.

- Por favor... – pedi.

Ela me olhou, os olhos escuros e fundos dentro da face cadavérica. Algo dentro daqueles olhos me deixou triste, com um aperto no peito. Eu continuei:

- Eu só quero levar você até a porta da sua casa, para ter certeza de que nada vai acontecer com você. Só isso. Depois, você está livre para me ignorar novamente.

Ela assentiu e continuou a caminhar, mas agora eu estava acompanhando-a.

- Então, recebeu todos os meus cartões e todas as flores?

- Uhum.

- Que bom – disse, amargamente.

Ela parou, obrigando-me a parar também.

- Se for para fazer piadinhas ou ficar jogando tudo na minha cara, não preciso que me acompanhe até em casa. Sei fazer isso muito bem sozinha, obrigada. – Ela disse, e rapidamente emendou – Não quero falar sobre isso, tudo bem? Você disse que só iria me deixar em casa e ia ir embora. Tudo bem, está tudo bem. Então, vamos lá, ande e pare de querer conversar comigo, assim nós dois nos poupamos de mais decepções, okay?

Ela continuou a caminhar, mas eu fiquei parado.

Ela virou, me encarando.

- O que foi?

Eu não respondi.

- O que foi, caralho?

Eu olhei, novamente, dentro dos olhos dela.

- Nada, – respondi – só acho engraçado o modo como você tenta esconder todos os seus sentimentos nesse papel de mulher durona que sabe o que quer, enquanto está perdida. Então, me desculpe se tentei te convencer que eu poderia ser alguém que poderia te ajudar a encontrar algo além de caos e sofrimento dentro de ti. Ou que te achava, e ainda acho, para falar a verdade, a pessoa mais incrível do mundo; a pessoa mais linda do mundo. Realmente, eu achava que conseguiria acabar com esse turbilhão do qual você finge que é feita...

Ela ri, ironicamente.

- Por favor, poupe-me desses discursos baratos que você ensaiou na frente do espelho para dizer quando me visse de novo. Para com esse papel ridículo de menino perdido só porque eu não te liguei depois que nós transamos. Para de falar sobre meus sentimentos como se você conhecesse o que está dentro de mim – disse ela, engasgando a última parte, com os olhos cheios de lagrimas.

- Eu sei que você está perdida, consigo ver isso. Você não come, não dorme, só bebe e fuma. Escreve. Tenta sair da realidade, apagar tudo que aconteceu...

Uma lagrima caí, ela a limpa rapidamente, com raiva.

- O que você sabe sobre sair da realidade? – Ela grita. – Você. Não. Sabe. Nada. Você não sabe o que é esquecer, lutar para esquecer tudo que você foi, tudo que você é.

- Não sei? – respondo, irado. – O que tu acha que eu fiz durante esses quase dois meses? O que tu acha que eu fiz!?

Ela não responde e sai andando novamente.

- Isso, isso mesmo, foge de novo. É só isso que tu sabe fazer? – grito.

Ela vira, parada no meio da rua.

- É, é só isso que eu sei fazer. Me desculpe destruir as fantasias sobre a garota perfeita que você construiu na sua mente. Me desculpe se eu não consigo ficar. Me desculpe, se eu tivesse ficado teria sido pior, bem pior. Você acha que não dói aqui também? – diz ela chorando, descontroladamente, mais alterada do que eu jamais havia visto.

Os carros começam a buzinar, pois o sinal já estava aberto e ela estava parada, trancando o cruzamento. Porém, ela não se mexe, eu não me movo.

As lágrimas ainda correm, quentes, pelo rosto dela.

- Quer saber? – continua ela – Não precisa me levar para casa, eu sei o caminho.

E eu? Eu a observo ir.  

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⏰ Última atualização: Sep 27, 2017 ⏰

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