A chuva caía ali como se um oceano desabasse em cima de suas cabeças. A noite escura predominava em seus olhos e o frio penetrava suas vestes. Pequenas janelas iluminavam a rua com o pouco de luz que as chamas dentro das casas proporcionavam. Os paralelepípedos desnivelados da rua enchiam poças enormes de água em diferentes regiões, onde as milhares de gotas da grossa chuva batiam e estouravam em outras milhares de gotas bem menores.
Havia tensão ali. Lenn acabara de entrar na quarta taverna seguida junto de Victor. Dúvidas passavam na cabeça dos dois. O plano daria mesmo certo? Se desse, conseguiriam se sair bem? O fato de ser um tiro no escuro e ser a única chance que tinham, os deixava um tanto quanto apreensivos.
Adentraram encharcados pelas portinhas vai-e-vem. Estava cheio de homens e mulheres que bebiam intensamente. Era algo padrão em todas que visitaram naquele dia. Archotes de ferro pendurados nas paredes e em pilastras iluminavam o ambiente redondo com suas chamas dançantes. Cantigas eram cantadas por um coro de homens bêbados em um canto daquela taverna. Outros discutiam ferozes. Um homem, magricela e de cabelos longos, sedosos e desfiados, se levantou de sua cadeira e correu desengonçado para uma outra saída que havia na extremidade traseira da taverna. Em outro lugar uma mulher de idade acabara de proferir um tapa no rosto de outra. O falatório era intenso.
Lenn seguiu Victor pelo caminho que havia até o balcão. Os dois sentaram nos banquinhos que haviam ali.
-Dohrn é o próximo da lista. -disse Victor quebrando o silêncio que havia entre os dois. -Esta é a penúltima taverna que fui antes de ser abordado. Se não for ele, nossa última chance está na próxima parada.
-Relaxa... -sussurrou Lenn desviando o olhar de Victor. -Também estou apreensivo.
Lenn apoiava seus braços no balcão de madeira e batia rapidamente o dedo das duas mãos uns nos outros rapidamente. Uma delas ainda estava sem a luva. O capuz de sua capa estava sobre sua cabeça.
-Você está realmente bem? -indagou Victor. -Ha poucos dias você estava desmaiando por conta das suas feridas.
-Não estou cem por cento. -respondeu. -Mas eu tenho conhecimento dos meus limites. Sei que consigo dar conta de algo que não seja outro Ragshack.
-Ainda sente dor?
-Nada que eu não possa aguentar... Você?
-Nada que eu não possa aguentar...
Naquele momento um homem de idade com traços muito malfeitos em seu rosto veio atendê-los. Seu bigode em formato de trapézio chamava atenção.
-O que vão querer? -falou de um modo rabugento.
-Extrato de iguana do pântano, por favor. -Victor respondeu suspirando.
O velho rabugento olhou para Lenn esperando uma resposta. Demorou um tempo até ele perceber.
-Me dê... me dê o mesmo, por favor. -Ele respondeu gaguejando.
Assim o atendente se retirou lentamente.
Apesar dos archotes presentes no local, aquela taverna parecia um tanto quanto sombria. Parecia haver pouca luz para iluminar completamente o ambiente.
-Então... -disse Victor. - ... Vê aquele homem com as barbas ruivas? -Apontou com a cabeça.
Não tinha como haver dúvidas. Um homem branco que parecia ter o rosto envolto em chamas sentava em uma das mesas redondas. Conversava e bebia com os companheiros. Aparentava ser um homem beirando os quarenta, mas os seus músculos gritavam para Lenn que o homem tinha trinta. Vestia tecidos leves e brancos por baixo de um colete de couro. Braceletes também de couro se encontravam em seus pulsos. Tinha uma estatura de um verdadeiro soldado.
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Anjo de Duas Caras
FantasyLennon é um garoto com um coração muito grande, porém cheio de dúvidas e tristezas. Sua aventura começa quando, cego por vingança, chega em Açucena de uma maneira indesejada. Um lugar totalmente diferente de tudo que ele ja presenciara nessa vida...