Anjo de Duas Caras

6 - O diário

   Sentado, ali naquele telhado, tentou esquecer o que acabara de acontecer. Mesmo com o ocorrido, ainda não achava que Selene era reclamona e má humorada. No fundo ele entendia a história por trás daquela música. Seu avô falecido cantava para ela toda noite antes de dormir. Sem contar que, segundo ela, seus sentimentos ficam aguçados nesta parte do mês. Dar-lhe-ia um desconto. Isto é. Se ela o desse primeiro. Se ela não o odiasse antes. O olhar que Selene depositara em Lenn era como se ele fosse a pessoa mais maléfica do mundo. Tentaria reverter a situação. Não queria ter rivalidade com uma das pessoas que o acolheram tão bondosamente.

Aquele tempo que estava ali sentado no telhado permitiu que pensamentos, dúvidas e devaneios viessem invadindo seu cérebro. Muitas coisas estranhas aconteceram no decorrer do último dia e não houve tempo para Lenn processar tudo muito bem.

Primeiro a aparição daquele covil misterioso. A tribo de Lenn era localizada na parte sul daquelas terras e não havia um covil dos lobos do sul que ele desconhecesse. Porém, aquele em que jaz o corpo de Darrin era desconhecido por todos. Ou sua mente estava começando a falhar, ou certamente aquele lugar não existia antes. O que não era uma ideia de tão maluca para o momento. Havia presenciado tantas coisas que pareceriam loucura para as pessoas de sua tribo.

Lembrou-se do sonho que teve na última noite. Sonhara que estava de volta à caverna. Aquilo teria sido realmente um sonho, ou o seu subconsciente estava lhe mostrando o que não pôde perceber no momento? Fora realmente um acontecimento estranho.

Começou a se perguntar se todos aqueles ossos que formavam o chão da caverna fora obra apenas dos lobos ou era obra do homem dono daquele vulto. Seria aquela a casa dele, ou estava ali de passagem procurando apenas aquele livrinho? Lenn só tinha certeza de que o homem desejava aquilo, sendo dele ou não. Parando para pensar melhor, nem tivera a chance de conferir o que era aquele livro. Logo após acordar naquela floresta, um Ragshack começou a persegui-lo. E desde então as coisas foram acontecendo sem dar-lhe um tempo para processar e respirar um pouco. Com certeza fora um dia corrido e cansativo.

As dúvidas sobre o que era aquele livro começaram a lhe tomar a cabeça. Por que será que era tão importante para ele? Seria algum tipo de provas que o incriminariam? Seria uma confissão? Algo particular? Porém, nenhuma dessas alternativas explicava o brilho amarelo e intenso que este produzia. Será que tinha alguma coisa a ver com os poderes do anjo? Mais cedo, Ben e Victor disseram que ele manifestava seus poderes em um raio de energia da mesmíssima cor. Porém, mais uma vez, não explicava o porquê de este ter prendido sua espada e tomado conta de todo o seu corpo. Muitas eram as perguntas que não se encaixavam muito bem com as suas respostas. Seria algum tipo de mecanismo de defesa? Ou seria esta a fonte dos poderes de Lenn? Fora depois deste ocorrido que os seus poderes estranhos se manifestaram. Seria este a fonte de poder do anjo?

Lenn tentava pôr em ordem e dar explicações aos ocorridos com o pouco de informações que continha. Sua cabeça ardia ao tentar juntar as peças daquele quebra cabeça completamente estranho. Seu palpite final era que aquele livro era a fonte de poder daquele homem. Seria coincidência demais o brilho ter a mesma cor dos raios que ele soltava. Coincidência maior ainda era o que Lenn pôde fazer depois que estas o consumiram.

Lentamente e aos gemidos, pôs-se de pé determinado a ir checar o que de fato era aquele livro. Fez força com as mãos no batente da janelinha e adentrou o quarto vazio, onde a cama à sua esquerda estava ali solitária junto com a mesa de cabeceira. Pôde ver agora com mais atenção, que sua espada estava ali, cravada na bainha, e apoiada na parede, entre a cama e a mesinha. Alguém tinha se encarregado de deixar todos os seus pertences ali, onde seria muito facilmente visto e de rápido acesso.