12 - Oito Cordas

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   Apesar do infortúnio ocorrido na taverna do travesso, aquele dia terminara de uma ótima maneira para os planos futuros daqueles oito integrantes. Seus diferentes caminhos e desejos tinham uma trajetória em comum, e com isso, o laço entre eles se tornara mais forte. Um sentimento de felicidade aquecia o coração de Lenn por participar de tal feito. Seria histórico. Faria história mais uma vez e estaria mais perto de realizar sua tão desejada vingança.

Não percebia, mas entrava cada vez mais fundo na história que circulava os habitantes de Açucena. Se sentia cada vez mais solto para agir e sentia cada vez mais vontade de intervir em seus problemas. Simpatizava-se cada vez mais com eles. Estava há cinco dias ali e pouco a pouco tornava-se cada vez mais um açucenense.

Por outro lado, o medo havia se alocado naquela taverna. Não sabiam se Victor, Lenn, Hella, Kim e Dohrn seriam reconhecidos na rua. Não sabiam se estavam sendo procurados por terem participado daquela batalha. Com isso, Theía recomendou que nenhum destes saíssem da Taverna por um tempo, até terem certeza da situação toda. Os novos convidados dormiram em lençóis forrados no chão da sala de estar naquela noite. O perigo de se envolver com gente grande estava começando a aparecer.

Amanheceu. O céu pouco nublado iluminava a pequena janela do seu quarto. Um azul muito intenso e um sol muito quente se escondia por trás dos poucos resquícios da tempestade que ocorrera na última noite. Pássaros cantando enchiam o ouvido com bons sentimentos. O cheiro matinal entrava nas narinas e fazia o coração acelerar de prazer.

Lenn estava de bruços no chão. Já havia acordado há algum tempo. Testava a integridade de seus braços machucados com flexões que já não fazia desde que chegara ali. Fez um movimento de descida e subida. Eram movimentos muito brutos para alguém com feridas iguais às que ele tinha poucos dias atrás, mas sentiu apenas algumas poucas dores. Ele se diagnosticara, definitivamente, cem por cento curado. Continuou fazendo os exercícios.

Estava despido de sua parte superior. Os músculos não tão grandes sobressaíam-se em seus ombros e braços. Quatro furos em cada um deles estavam visíveis, com linhas os envolvendo em suturas bem-feitas. Três listras imensas e que se sobressaíam em sua pele iam do início ao final de suas costas. Estava sem os curativos. Decidira que não precisava mais deles. Hematomas gigantes em suas costelas e em diferentes partes do seu torso. Descia e subia com os movimentos da flexão. Descansou.

Deitado ali, de costas, respirando o delicioso ar que entrava pela janela, começou a ouvir novamente o som que havia o feito encher-se com um sentimento estranho da última vez que ouvira. Era Selene. Tocava delicadamente seu alaúde. Fazia tempo que não ouvia este belo som proporcionado apenas por ela. Não era a canção da mulher na árvore, desta vez. Era um som completamente diferente, mas tão bom de se ouvir quanto o outro. Não havia a voz dela também. Apenas o leve soar das cordas.

Levantou-se rapidamente, foi até ao lado de sua cama e vestiu uma bata branca larga que Theía havia lhe dado na última noite. Dirigiu-se para a porta em frente ao seu quarto.

Estava aberta. Parou e olhou. Selene estava de costas novamente, como da última vez. O brilho claro emanado por seus cabelos brancos parecia mais irradiante ainda. O dedilhado lento e calmo ainda soava. Era como ouvir canções feitas por anjos. Seus olhos eram quase que obrigados a focarem nos cabelos brancos de Selene como se estivesse em estado de transe. Todo o clima, o ambiente e a atmosfera estavam favoráveis para que ele continuasse ali por muito tempo. A brisa matinal adentrou seu nariz novamente, trazendo um cheiro novo e muito perfumado que nunca havia sentido antes. Viajou novamente em seus pensamentos.

Ouviria aquilo o tempo que precisasse. Sentou no tapete fofo e vermelho e encostou-se no portal do quarto. Se tinha alguma coisa que fazia valer a pena a sua estadia ali naquele lugar, uma delas com certeza seria ouvir Selene tocar suas melodias. Nunca ouvira algo tão bonito. Relaxou.

Anjo de Duas CarasOnde histórias criam vida. Descubra agora