2 - Ragshack

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   O vento uivou. Soprou seus cabelos azuis que dançaram e chicotearam seu rosto. Apertou os olhos. Nunca tanto vento entrara assim em seu aposento. Alguém devia ter deixado alguma janela aberta. Ouvia grilos. Grilos emanando sons tão altos que o incomodavam. Remexeu-se um pouco. Sentiu algo úmido em sua cama. Esta também estava um pouco viscosa. Mais uma rajada de vento e um aroma florestal entraram em suas narinas. O primeiro sentimento agradável naquele momento. Estranhou o ambiente em que se encontrava. A floresta que rondava sua casa não emanava aroma algum. Seus galhos estavam completamente despidos de folhas. E grilos... Grilos gostavam de verde. Verde era o que faltava na floresta que conhecia.

Estranhou e voltou em si. Levantou num suspiro. A visão embaçada e um pouco escura estava voltando ao normal aos poucos. Sinal de que tivera uma boa noite de sono. Árvores com uma peruca muito verde foram se materializando enquanto sua vista se acostumava com a paisagem. Sentiu uma grama bem úmida em baixo das suas mãos que usava para apoiar-se. Esfregou os olhos e finalmente sua visão voltou ao normal. Estava no meio de uma clareira que era iluminada pela imensa lua e milhões de estrelas no céu. Estranhou. Não estava ali da última vez. Foi aí que suas memórias começaram a voltar. A caverna, o brilho, o homem... Darrin. Desmaiara depois que aquele livro prendera sobrenaturalmente sua espada.

O coração apertou. Lembrara de Darrin. Caído. Sem vida. Sentia raiva daquele vulto. A antiga ardência voltou a tomar conta de seu interior. Não podia ser. Isso tinha que ser um sonho. Não acreditava no fato de ter perdido Darrin. Sentou e levou as mãos ao rosto. Tinha que ser um sonho. Aquilo não podia ser real. Como estaria ali naquela floresta verde se não fosse um sonho? Aquilo não podia estar acontecendo. Apertou as mãos em seu rosto e deu alguns tabefes em si mesmo com um grunhido de raiva.

Nada mudara. Ainda estava sentado naquela grama verde, ouvindo grilos e sentindo o aroma fresco da floresta que o cercava. Estava mesmo ali. Mais lágrimas saíram de seus olhos quando a imagem de Darrin sem vida veio em sua mente. Doía o fato de tê-lo deixado naquela caverna. Doía mais ainda o fato de também ter deixado Eli jogado na floresta. Aqueles dois não mereciam aquilo.

Tinha que achar aquele homem. Tinha que achá-lo a qualquer custo. Ele havia matado Darrin. Queria matá-lo também. Porém, não sabia nem onde ele mesmo estava naquele instante. Só sabia que era muito longe de sua casa. Não era época do verde. Ou dormira por muito tempo, o que ele achava muito improvável, ou fora levado por alguém para outro lugar. Talvez o dono do vulto. Se ele o levou para aquele lugar, por que não o matou? Achava estranho.

Fez força no chão para levantar. Sua mão amassou a grama fofa. Sentiu dores no antebraço e em uma de suas pernas. Com o sangue frio, aquelas feridas doíam bem mais agora. Mordidas profundas de lobos. Pôs-se de pé com um pouco de dificuldade. A luz da lua também perfurava outros diversos pontos a sua volta. Mesmo não sendo muito grande, a clareira onde estava era um pouco maior. Deu um longo suspiro. Tinha que rumar para algum lugar.

Parou de ter devaneios sobre o que teria que fazer quando algo chamou sua atenção. Um brilho muito fraco depositado onde a luz da lua não iluminava. Bem ao final da minúscula clareira. Observou com curiosidade. Lentamente, começou a pôr os pés um na frente do outro. Um pouco manco, chegou perto do brilho. Tateou o escuro até pôr as mãos em algo. Era metálico. Sentiu uma breve alegria. Só podia ser ela. Agarrou também com a outra mão e teve certeza. Era uma espada. A sua espada. Aquele couro gastado enrolado no punho dela não podia ser confundido.

Fez força para levantá-la. Sentiu algo estranho. Algo pesado vinha de sua ponta. Andou uns passos até a parte clara onde estava antes e examinou. Reconheceu na hora. O livro estranho que estava antes na caverna, estava agora preso à ponta de sua espada. Sentiu um alívio. Aquele vulto na caverna com certeza era o dono daquele livro e parecia muito importante para ele. Uma hora ou outra ele iria querer procurá-lo e, quando achasse, Lenn estaria preparado para arrancar-lhe a cabeça.

Anjo de Duas CarasOnde histórias criam vida. Descubra agora