SEIS

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20h 00m

- Pastor, definitivamente, agora que ela está bem amarrada e não pode causar mais mal para si, pode dizer o que faremos? – Perguntou o pai de Abigail, enquanto tentava consolar a mulher, abraçado a esta. – Pastor? Estou falando com o senhor!

- B-bem, vamos começar o ritual de exorcismo e libertação, não é mesmo? Esse espírito maligno deve ser expulso, antes que cause mais danos para nós. Temos que ser muito perseverantes em oração. É isso. Todos aqui, temos que orar e nos preparar para o momento.

- E enquanto ao cadáver? – Estranhou Melissa.

- Minha filha... uma... assassina! – desesperou-se a mulher, enquanto era consolada pelo marido.

- Bem... Foi algo muito rápido, nem vimos. Foi uma fatalidade, não é?! Não podemos de modo algum perder a perseverança em nosso objetivo – disse o pastor, com voz trêmula. – Coisas assim são mais comuns do que imaginamos.

- Eu sei disso, pastor. Mas precisamos chamar a polícia, não acham?

- Melissa, os celulares não funcionam aqui. Pelo menos não desde que eu entrei nessa casa - declarou Nelson com olhar preocupado. Melissa não acreditou e seguiu até sua mala para confirmar o que ele dizia. Não havia sinal de área, por mais que ela tivesse três chips diferentes em seu moderno aparelho.

- Mas quando cheguei aqui, estava funcionando!

- Eu sei moça. Mas não sei se é um problema de área ou se estamos em uma maldita porta para o inferno, aqui dentro. Só sei que nenhum dos celulares funciona. E pelo jeito a coisa vai ficar mais complicada. – disse o pai de Abigail, agora abrindo a porta da frente e fechando rapidamente. Está começando a chover, e pelas nuvens, não vai ser uma simples garoa. Todo mundo sabe o que acontece quando começa a chover por aqui não é? Nada de linhas telefônicas por um tempo.

Nesse momento um forte barulho foi ouvido, fazendo a casa tremer. Todos se entreolharam, na esperança de que alguém pudesse falar alguma coisa. Na verdade não sabiam se aquilo tinha sido real ou apenas uma peça pregada por suas mentes confusas, naquele momento. Mas pelas expressões de cada um, era fato que haviam ouvido. Todos se dirigiram novamente para a cozinha. Após limparem o sangue e darem outro banho em Abigail, Melissa e Nelson também se lavaram. O corpo e a cabeça ainda estavam na sala, agora cobertos por um plástico verde que havia sido trazido do porta-malas do carro do pastor. Todas as facas que se encontravam na casa haviam sido guardadas na mala de Melissa, agora no alto, sobre o armário da cozinha. Foi então que a tempestade desabou, quase no exato instante em que o pastor começou a fazer suas orações, pedindo que todos permanecessem de mãos dadas.

- Irmãos, estamos aqui reunidos em oração neste momento para que as forças do bem não desamparem nossa irmãzinha Abigail, e pedimos forças para nós, para que possamos enfrentar este desafio em nossas vidas. Vamos todos.

- Certo, do que precisamos? – perguntou Melissa, descrente. – Algum óleo mágnífico, fitinhas coloridas ou coisa parecida? Acha que consegue tratar isso da mesma forma que seus amigos que gostam de aparecer na televisão?

- Não, minha jovem. Eu entendo sua crítica, e o que quer que esteja pensando, não vá levar à frente. Não é hora para isso.

- Não? 

- Ouça, estas entidades vindas das profundezas querem justamente a discórdia entre nós, e isso gerará a desunião, e não é isso o que deve acontecer aqui neste momento, não é? Não acham, meus queridos?

Todos responderam afirmativamente com a cabeça.

- Então, precisamos seguir em frente. Prestem atenção e façam exatamente o que eu disser, vamos para o quarto agora!

Mal o temeroso homem acabou de falar, as lâmpadas de toda a casa piscaram duas vezes e depois apagaram, deixando todos cegos na escuridão, sem poder enxergar um palmo à sua frente. Tudo ficou em silêncio, exceto pelo barulho da forte chuva caindo do lado de fora, e da sinistra gargalhada que Abigail emitiu de dentro do quarto.

- Ótimo! – Exclamou Melissa. – Essa porra não podia ficar pior. Deve ter uma outra forma de iluminar essa casa. Não é possível que o maldito Antônio não tenha previsto isso.

- Bom, pelo que sei e lembro, bem acima da cozinha existe um pequeno sótão. Talvez lá encontremos candeeiros, lanternas, ou algo do tipo. Não é difícil fazermos uso disso aqui nas redondezas. Realmente não acho que seu amigo não saiba que acontecem quedas de energia. É um local distante da cidade. Agradeço se for lá e der uma olhada.

- Tem certeza? – Disse Melissa tentando distinguir a sombra de Nelson da dos outros.

- Claro. Mas não demore, por favor. Precisamos de todo mundo aqui.

- Liguem seus celulares. São a única fonte de luz, por enquanto.

Todos obedeceram a garota imediatamente, e se dirigiram ao quarto. Ao entrar, perceberam Abigail sentada na cama. Sua silhueta, apesar de toda a escuridão, parecia mais negra que o resto do ambiente. Todos repararam naquilo, bem como repararam em algo que dificilmente iriam esquecer, caso sobrevivessem àquela noite; os olhos da garota. Seus olhos não eram mais normais, ambos estavam acesos como duas pequenas brasas amarelo-esverdeadas, Mas ela não os encarava, aqueles dois pontos luminosos estavam direcionados para cima, para o teto.

- Abigail – sussurrou a mãe. – Mamãe está aqui, querida.

Aquela foi a última coisa que Melissa ouviu, antes da porta fechar atrás dela, quando os viu entrar no quarto, no escuro. A garota seguiu rapidamente para a porta ao final do corredor completamente escuro, saindo na chuva e encontrando a estreita escada, que dava para o sótão. Por mais que tentasse se apressar, Melissa não conseguia aumentar o passo, sentia o peso do cansaço emocional naquele momento. Havia saído de uma situação completamente sua, para fazer parte de toda aquela sucessão de eventos estranhos.

Banho De Sangue - Um Conto InfernalOnde histórias criam vida. Descubra agora