OITO

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22h 52m

Se houvessem calmantes dentro daquela mala, a garota já teria tomado todos. Mas só havia veneno. Melissa, exausta, sentou-se novamente na cadeira, no meio da sala. Recarregou a espingarda, sem deixar de notar o frio e o silêncio que perduravam naquele ambiente. Agora haviam mais ratos ainda sobre o corpo da jovem morta, dentro de sua cabeça, saindo pelos buracos que antes haviam sido seus olhos e boca. Melissa levantou e cobriu novamente o corpo com o plástico verde, espantando os bichos, mas com a certeza de que aquilo seria em vão e eles iriam voltar. O cheiro de sangue ainda era forte, mas ela estava se acostumndo. Passou alguns minutos ali, alheia ao tempo, sem forças para pensar. Foi quando, de repente, ouviu como se alguém tivesse abrindo a torneira da pia do banheiro. O barulho normalmente não seria notado, mas estava fazendo um silêncio tão grande que aquilo se fez ouvir nitidamente. Melissa caminhou até lá, de arma em punho; passou pela porta que dava acesso ao corredor, pela frente do quarto, e chegou ao fim do corredor, onde ficava o banheiro. Seus passos rápidos quase a faziam derrapar naquele assoalho. Não havia ninguém lá. A garota olhou de volta, na direção da sala e enxergou nitidamente uma sombra sentada na cadeira. A mesma da qual Melissa acabara de levantar, então ela viu a sombra se levantar e seguir em direção à cozinha. A garota correu até lá, e não havia nada também.

- Merda, eu estou ficando maluca! – foi o que ela pensou, indo à cozinha e colocando um pouco de café que havia sobrado, para beber. A tampa da garrafa térmica era ao mesmo tempo uma xícara. Melissa lembrou de quando procurara um copo ou xícara pela casa, sem sucesso. Enquanto estava com o pensamento nisso, tentando se distrair com qualquer coisa que fosse mais "humana", alguém bateu na porta. Três batidas fortes, fazendo-a dar um pulo. Melissa engoliu o café quente, de uma vez e se dirigiu à abertura onde colocara o olho mais cedo, quando atendeu Abigail. Não havia ninguém lá fora. Ela podia ver, apesar da escuridão. Melissa deu dois passos para trás e se preparou para abrir, quando ouviu mais três batidas. Mas não era mais ali e sim na porta do banheiro, dentro da casa. Mas Melissa havia acabado de sair do maldito banheiro!

A intensidade da chuva pareceu diminuir quando a garota acendeu um cigarro e sentou-se novamente na cadeira. Sua espingarda continuava apontada para o corredor, cuja porta de acesso ficaria aberta. Não se ouviam barulhos além dos ratos chiando. Ela olhou para o celular, pouco antes deste desligar por causa da bateria fraca: 23:30. As horas pareciam passar muito rápido naquele maldito lugar, enquanto, no mundo lá fora, pareciam sempre durar uma eternidade. Era sempre assim durante todos os últimos tempos, em sua vida. Mas agora tudo parecia diferente. Arrepiada pelo frio, lembrou-se das últimas palavras da jovem que ali jazia, sendo lentamente devorada pelos roedores. Afinal, o que será que aconteceria à meia-noite? O que era aquela entidade, e o que queria com a pobre Abigail e sua família? O que Abigail realmente havia feito, e por qual motivo havia ido justamente até ali? Melissa sentiu-se nauseada, mas um medo estranho começou a lhe preencher, ao mesmo tempo em que um arrepio continuou e percorreu sua espinha, de alto a baixo. Olhou aterrorizada para sua mão, suas unhas bem feitas e sua pele negra e macia como seda e os dedos finos e delicados. Ela não conseguia manter a mão parada, tamanho era o nervosismo. Respirou fundo mais uma vez, e tentou ligar o celular novamente, agora sem sucesso. Então ela verificou se haviam mais balas em seus bolsos e notou que não lembrava mais de nenhuma oração para fazer naquele momento. Voltara ao mesmo lugar, novamente tentando rezar, e novamente sem conseguir. Então ela teve um lampejo. Uma ideia que ainda não havia lhe passado pela mente antes.

- Garota imbecil. Como não pensou nisso?! – disse para si mesma, em voz alta.

Melissa assegurou-se, mais uma vez, de que a espingarda estava devidamente carregada. Ela lembrou de um detalhe que não lhe passara pela mente: O carro do pastor, no qual o homem havia chegado até ali, e trazido aquelas pessoas. Melissa levantou em um pulo, procurando por toda a casa e tentando imaginar onde o homem poderia tê-la deixado, estaria na mesa da cozinha? Teria caído no chão? Não. Enfim, concluiu o que mais temia: A chave não estava em outro lugar a não ser com o morto. E ela teria que entrar novamente naquele quarto, se quisesse sair daquele lugar maldito.

Banho De Sangue - Um Conto InfernalOnde histórias criam vida. Descubra agora