Despertar

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Estou quase desperta, no entanto, abrir os olhos é o último movimento que desejo fazer.

Primeiro que minha cabeça dói e muito, resultado da ressaca que já sabia que enfrentaria quando tomei o oitavo drink. Beber definitivamente não é meu forte e o fazia muito sazonalmente. Segundo que mesmo com os olhos fechados, era possível perceber que o ambiente em que estava era de uma claridade que não queria enfrentar.

Diante daquele silêncio provincial, tento me espreguiçar para relaxar o corpo mais ainda, no entanto, dores musculares me trazem para a realidade do que passamos na noite anterior e as cenas da agressão vieram à tona, fazendo-me reviver os momentos angustiantes de uma só vez.

Abro os olhos abruptamente, e num sobressalto me sento na cama de uma só vez e grito por Anne.

Minhas mãos são levadas ao rosto num gesto automático para me auxiliar no controle da claridade a qual já está mais tolerável a esta altura, embora ainda haja uma confusão mental a ser compreendida, até que o som de sua voz me tranquiliza de certa forma.

— Calma amor! Ela está bem e dormindo como uma pedra no quarto ao lado.
Olho para o meu lado direito e lá está Dave, que delicadamente se movimenta, sentando-se ao meu lado me trazendo para o seu peito para que eu possa me aninhar a ele, e prossegue ao explicar que Anne preferiu ir para o outro quarto assim que ele chegou, embora ele tivesse insistido para que ela permanecesse ali que iria velar por nós duas e ela, claro, o deixou falando sozinho.

Fico feliz em vê-lo e com algum esforço olho por sobre os seus ombros e reconheço estar em meu quarto não tendo a mínima ideia de como cheguei até aqui, mas me sinto segura por estar em casa.

Ficamos em silêncio por alguns instantes, que é rompido pelo Dave novamente:
— Sinto muito, Lynn. – Ele então olha fixamente para mim como um médico avalia seu paciente e toca em minha testa delicadamente. — Ainda dói?

— Sim, um pouco. – E seguro sua mão interrompendo o gesto e ao mesmo tempo recuo o meu corpo recostando em minha cama. Abro a primeira gaveta do meu criado-mudo e pego meu espelho, porque a essa altura nem sei onde está meu celular para que eu possa ver o meu reflexo.

Estou horrível! Sinto-me horrível! Penso, não digo uma só palavra.
O "galo" em minha testa justifica um inchaço maior.

Com a lembrança da agressão vindo à tona, uma lágrima involuntária percorre minha face expressando a frustração e a impotência que vivi.

— Não chore, Lynn. – Dave diz quase sussurrando. Ele então contrai a musculatura do seu rosto, fecha os olhos e os abre lentamente agora com um semblante ameaçador e diz que isso não vai ficar assim.

Coloco minha mão sobre sua boca com a intenção de silenciá-lo; e ele abaixa o olhar. Percebo então que o lado direito de sua boca está cortada e seus lábios levemente inchados.

— Você precisa ver o outro cara! – Esboça Dave num sorriso forçado, mas eu não consigo corresponder.

— Quem e de onde são essas pessoas, Dave? – Pergunto com a sensação de que se eu não indagá-lo, ele não me dirá voluntariamente. — Eles vieram atrás de mim em represaria a você, isso ficou evidente. No que você está metido?

— Lynn, quanto menos você souber melhor. É para te proteger.

— Você só pode estar de brincadeira, David Schmidt. – Digo incrédula.

Ainda estou muito confusa. Inclino-me para frente novamente, seguro em seu ombro com os dois braços girando o seu corpo para que se posicione em frente ao meu e o sinto suspirar de forma contida para suportar a dor que acabo de infringir a ele.

Então, sem ele esperar, começo a tirar o seu moletom e ele não me impede. Em um movimento mais rápido ainda, tiro sua camiseta na ansiedade de vê-lo melhor e os hematomas em seu ombro e costas denunciam que a briga foi feia.

Olho para ele confusa, e me vem os flashes sobre a ameaça que eu e Anne sofremos, a chegada de nosso defensor e a briga que se seguira perante a mim em câmera lenta, alternadas com a escuridão que sucedeu, embora lutasse para não perder os sentidos em vão. Matt me veio à mente, mas era meu subconsciente me traindo? Só podia ser.

— Dave, você enfrentou os três! – Fico atordoada e agradecida ao mesmo tempo em que diante do inevitável estávamos bem de certa forma.

Abraço Dave de forma urgente; sem me dar conta se estou sendo delicada ou não e o meu beijo é correspondido com a mesma intensidade sem dizer uma só palavra e eu também não queria ouvir mais nada.

— Acho melhor nós irmos ao médico, Lynn.

— Ah, claro. – Olho para ele. — E... Você acha que quebrou alguma coisa?

— Eu não, você! Anne achou melhor te trazer pra cá.

— Dave, eu tô bem. Foi até melhor porque se nós chegássemos assim ao hospital, teríamos que fazer um boletim de ocorrência policial. – E o observo diante desta possibilidade. Dave então é categórico:

— Não! Sem polícia!

— Concordo desde que não tenhamos novos ataques. Você tem como garantir isso? – Não dou espaço para ele responder e prossigo: — Apenas me confirme se tudo isso tem a ver com Nathan. – Disse, em uma impaciência só.

Ele respira profundamente para escolher as palavras a serem ditas, e hesitante confessou:

— Sim.

Aturdida, tinha que digerir a informação.

Q1Onde histórias criam vida. Descubra agora