O Palácio da Memória

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 — Pai ! Eu perdi as horas... não quis me atrasar. 

—  Meu querido filho, eu entendo, como não se apaixonar por uma boa e velha história, não é mesmo? Ou  então por uma mais recente. É bem compreensível nos perdemos uma vez ou outra nessa jornada solitária na ilha da vida entre esses locais onde estão os registros de nossas lembranças e recordações mais queridas. Eu não posso visitar tais lugares, mas já me contaram que o palácio da Memória é como um lugar infinito e mágico, onde existem várias portas que ficam sempre fechadas, trancadas em cada um de nós, fundo em nossas mentes, a qual nunca poderemos abri-las, mas ainda assim sempre podemos dar uma pequena conferida através de suas velhas fechaduras. 

— É exatamente assim! É um castelo imenso, cheio de torres e salas! Não sei ao certo como cheguei lá, mas de alguma forma ele veio a mim. Senti como se tivesse parado no tempo e no espaço.

 — Sabia que até mesmo espiando-as, os ponteiros dos relógios nunca giram no sentido anti horário? Pois quando revivemos essas antigas experiências, mesmo no próprio palácio da memória, quando damos inicio a uma recordação ela sempre se encaminhara para seu fim. de volta para as gavetas empoeiradas, papiros, ou seja lá aonde estejam guardadas, de fato.

— Mas sabe, eu tive medo de nunca mais conseguir sair de lá. Foi uma jornada e tanto! Fui para locais que nem podia lembrar de ter passado um dia. Pensei até que ficaria preso ali para sempre, perdido entre as escadas que me faziam subir e descer ao mesmo tempo.

 — Recordar é sinônimo de reviver! Uma recordação é como um pequeno passarinho que surge em sua mente  e ti leva a voar para longe, mas que sempre desaparece subitamente fazendo-o cair. São manifestações inofensivas que podem vir a qualquer momento e em qualquer lugar, saídas do nada, de uma frase ouvida, de uma fotografia antiga, do gosto de algo em sua boca e até de um delicado aroma. Você se acostumara em vê-las, pois será o mestre delas um dia. Elas o anunciam sempre, mesmo subtendido entre o nome de sua irmã, a Nostalgia. 

— Descobri também que lembranças são como ver algo, mas não poder tocar. Era como tentar lembrar do gosto de uma sobremesa que escolhi um dia num restaurante, mas que ha muito não degustei dela. Foi algo doce e amargo ao mesmo tempo, bom e ruim. Legal, mas de certa forma ainda triste. 

— Sim! Mesmo que algumas sejam bem amargas, as vezes inevitavelmente voltamos  experimentar uma vez mais a sensação que vivemos ao saborea-las. Talvez para certificarmos que tomamos a escolha certa, ou então até mesmo apenas por mera curiosidade, para saber o que teria sido se tivéssemos escolhido outra coisa do cardápio. 

— Contudo, mal posso esperar para poder voltar lá.

— Sim, mas tenha prudencia quando começar a controlar tais impulsos! Prometa-me que não retornara a tais lugares mais que o necessário?! E preciso tomar muito cuidado.. São lugares bonitos e encantadores até certo trecho, mas  você pode sempre correr o risco de se perder em si mesmo; em quem era, ou em quem foi, ou  no que poderia ter feito, quem poderia ter sido, ou conhecido, mas nunca poderá saber, ou mudar o destino. Então é importante não duvidar jamais, prometa-me que não dirás em hipótese alguma ''e se'' enquanto estiver lá,  pois se fizeres isso poderás ficar preso num eterno loop.

— Tudo bem pai , eu prometo! 

— Ah... E siga sempre olhando para frente! É perigoso olhar para trás muitas vezes quando estiver sozinho consigo mesmo em um dos três santuários atemporais. 

—  Tudo bem, acho que entendi. Mas não sabia que havia perigo em visitar os santuários das recordações, lembranças e memórias.

— Tudo que é bom, pode ser ruim. Nada em excesso faz bem, e quando se trata do que vivemos, é sempre fácil cair em armadilhas internas, estagnar-se no caminho das dúvidas, por isso deve ser extremamente cuidadoso, mesmo você, para acabar não virando uma estatua de pedra com um labirinto em sua cabeça. Vamos, que tal me contar um pouco mais do que vistes por lá?

Os Apólogos Perdidos do TempoOnde histórias criam vida. Descubra agora