Capítulo 7

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Cada minuto que passava e nada acontecia na tela do tablet era uma tortura silenciosa.

Pessoas iam e vinham no corredor, rostos conhecidos, sempre os mesmos, entravam e saiam do meu quarto em intervalos de tempo regulares. Médicos e enfermeiras, meu pai e minha mãe, e naquele dia em particular, um padre.

Sim, minha mãe levou um padre para rezar por mim. Como se Deus não tivesse ouvido o suficiente de suas orações, ela pediu um apoio. Mas o que me espanta não foi o fato dela o ter chamado até lá e sim ela ter demorado tanto tempo.

Nós nunca fomos muito religiosos, meu pai sendo ateu e minha mãe só lembrando que era católica quando alguma pessoa perguntava a respeito. Mas ela sempre rezava, ela acreditava que existia um deus lá em cima e que ele olhava por nós. E foi por isso que me espantou ela não ter recorrido ao padre antes.

Hoje ela estava mais crente do que nunca, afinal eu acordei no mesmo dia em que o padre me visitou. Era um milagre.

O que ela não sabia era que o milagre não havia sido por conta do padre e sim de um pouco da mágica que rodeia todos os contos de fadas.

"Eu não sei como aconteceu, mas aconteceu e aqui estamos.

Eu não pensei que fosse gostar tanto desse lugar ao ponto de não querer ir, mas cá estou.

Como você fez isso comigo? "

"Não me entenda errado, por favor... Mas eu não posso ir sem saber como é a sensação, eu não posso ir e não me despedir adequadamente. Eu não posso ir sem saber como você sente..."

Pelo menos era isso que eu acreditava. Mas a cada momento sem ver o rosto de meu estranho familiar na tela desse tablet me fazia acreditar que eu, no fim das contas, não era tão diferente da minha mãe, acreditando em algo que não podia provar ser real.

Ela tinha a sua fé e eu tinha a minha. A diferença era que a dela se fortalecia enquanto a minha se esvaia pouco a pouco.

"Eu estou apenas balbuciando. Falando e falando, mas sem dizer o que eu quero.

Me sinto tão frustrado agora.

Eu já te disse antes... Disse como me sentia. Por que agora é tão difícil?

Por acaso, você poderia....?

Você poderia segurar minha mão?

Eu acredito em você. Mas hoje eu precisava de um pouco mais do que esperança.

É tão solitário as vezes."

Meus olhos estavam cansados de tanto encararem a luz brilhante nas minhas mãos. Uma lágrima escorreu por meu rosto e eu não sabia se era fruto da minha vista cansada ou da decepção que me agarrava com unhas e dentes.

Eu queria acreditar, eu realmente queria... Mas ficava difícil quando o que eu pensei ter sido se desfigurava em brumas diante dos meus olhos, se a voz que eu conhecia soava cada vez mais como um eco distante.

A gravação que a enfermeira me deu era do dia em que eu acordei. No marcador apontava que era onze e quarenta.

Os médicos disseram que eu havia acordado a meia noite. Caso ninguém entrasse no meu quarto até aquela hora, eu estaria errada. Não haveria Príncipe ou canções feitas para mim. Não haveria nada daquilo que eu ansiava. Porque, na minha lembrança, foi ele quem me acordou. Não foram as orações do padre ou o choro de minha mãe, mas sim um beijo.

"Devias estar aqui, rente aos meus lábios, para dividir contigo esta amargura dos meus dias partidos um a um.

Li isso em um livro uma vez e me lembrei ontem desse trecho. Acho que sei porque.

Enquanto eu dormia.Onde histórias criam vida. Descubra agora