Capítulo 6

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"Eu não sei o que dizer...

Eu pensei em várias coisas, eu até ensaiei na frente do espelho o que eu queria dizer... Mas te olhando agora, nada daquilo parece certo.

Parece tudo tão simples, tudo tão sem graça. Eu queria fazer todo um discurso, mas aqui estou eu sem palavras, com o rosto queimando enquanto você parece tão tranquila.

Ah, o que estou dizendo?

Isso é tão frustrante! "

—Essas câmeras...— olho para a enfermeira que está ao meu lado, atenta a todos os meus passos enquanto caminhamos de volta para meu quarto, e digo como quem não tem sobre o que conversar e fala a primeira coisa que vem a mente. — elas estão em todos os corredores?

—Sim. Temos câmeras em todos os andares. — ela olha para a câmera como se só tivesse lembrado delas agora.

—E por quanto tempo vocês guardam as gravações? —minha pergunta não parece levantar qualquer suspeita dela, pois ela responde sem hesitação.

—Eu não saberia te dizer. — ela me oferece um sorriso meio tímido, se desculpando por isso. Mas eu sabia que ela não saberia, não era seu departamento de qualquer forma. Eu só estava tentando uma forma de chegar onde eu queria chegar.

—Foi você que ficou encarregada de me monitorar, não? —parei no corredor e olhei para ela, que ao parar e notar a expressão em meu rosto, pareceu perceber que eu queria algo.

—Sim, —disse com cuidado — eu cuidava de você.

—Você alguma vez viu algum estranho entrando no meu quarto? —a questiono e ao ouvir isso, ela olha para os lados e dá um sorriso nervoso ao responder.

—Não, eu não vi. — ela começa a andar novamente e eu tenho que acelerar meu passo para alcançá-la.

—Você tem certeza? — eu insisto.

—É claro. —ela diz com um tom de irritação e eu paro, segurando seu braço e fazendo com que ela me olhe.

Ela parecia nova, não tão mais velha do que eu. Uma coisa eu ainda sabia, jovens tem uma certa habilidade de não serem pegos quando põe algum esforço nisso. E mesmo que ela parecesse muito competente, bem, ela ainda era jovem.

—Você ficava lá a noite toda? —pergunto, incisiva e ao invés de responder diretamente, ela tenta se evadir da questão.

— Eu era a encarregada...—ela começa e eu a interrompo, insistindo na questão principal.

—Você ficava?

Ela solta a minha mão, que ainda a segurava, e cruza os braços na frente do peito, me olhando com ar superior, mas sem conseguir pensar em algo que a tire dessa situação.

Ela deva estar pensando que eu quero a prejudicar, ou alguma coisa do tipo, por isso mantém a boca fechada. Mas não é isso que eu quero.

—Por favor... eu preciso saber a verdade. — digo a ela com toda a sinceridade possível. —Eu não quero te prejudicar de nenhuma forma, eu só preciso checar algo. — Fecho os olhos por um instante, tentando manter a minha voz sob controle.

Eu ainda não tinha me recuperado da cena que a minha mãe fez lá em baixo, eu estava começando a ficar com dor de cabeça de tanto pensar sobre isso e não chegar a lugar nenhum. Ela, a enfermeira, era a minha tentativa mais desesperada de tentar fazer as coisas fazerem sentido na minha cabeça. Eu já não estava tão confiante como antes. Eu estava perdendo as forças para continuar acreditando em algo que eu não podia provar.

Eu estava desistindo dele.

Eu me aproximo dela e deixo que ela veja meu desespero. Porque era assim que eu estava; desesperada por algo, qualquer coisa, que fizesse com que aquele menino, que aquelas lembranças fossem reais.

— Eu acho que vou ficar louca e levar minha mãe junto. Você viu lá embaixo? ela não está aguentando mais e eu também não. — Por favor, me ajude.

—Eu posso ser demitida. —ela enfim, externa seu medo e eu a olho compreensiva.

—Eu não vou fazer queixa de você. — Asseguro a ela — nem meus pais. — dou mais um passo em sua direção e pegando a mão dela na minha, a aperto como se ela fosse tudo que me restasse, como se ela fosse a minha boia em meio a uma tempestade no mar.— Eu preciso saber a verdade para virar essa página.

—Me desculpe. —ela diz e se solta, indo embora e me deixando sozinha ali, no meio do corredor com apenas as muletas para me amparar.

Mas elas não eram capazes de me segurar em tudo. Porque o buraco que estava começando a se abrir no meu peito estava prestes a me engolir e me deixar a deriva na minha própria confusão.

Depois de alguns minutos parada ali, olhando para onde ela foi como se nada mais importasse, eu me viro e vou para meu quarto. Deito na minha cama e me escondo embaixo dos lençóis. Talvez eles possam abafar o som dos meus soluços. Talvez eles possam fazer tudo ao meu redor desaparecer, como a escuridão que foi a minha companhia durante dois anos. Talvez assim eu pudesse ouvi-lo novamente e ele me diria que tudo isso iria passar e que ele viria me salvar.

"Minha cabeça está complicada.

Quando eu abro meus olhos de manhã,

Meu coração parece vazio

Eu sinto o vazio,

Assim como eu sentia antes de te conhecer

(Empty, winner.)

É linda né?

Essa música me lembra você. Me lembra nós dois.

Que tal ela ser a nossa música? Você quer?

Todo casal deveria ter uma."

Acordo com o meu telefone tocando. Não era ninguém, apenas o alarme me dizendo que eu precisava tomar meus remédios.

O quarto está escuro e vazio, meus pais não estão ali. Provavelmente minha mãe ainda estava muito chateada para voltar hoje.

Meus olhos estão pesados, doloridos. Eu fecho os olhos, mas o maldito alarme toca novamente. Eu não quero levantar, mas sei que uma enfermeira virá daqui a pouco e irá reportar se eu não tomar meu remédio. Penso em apenas fingir que tomei, mas de qualquer jeito teria que levantar, que bem isso me faria?

Me sento na cama e coloco os pés para baixo, no chão. Ligo o abajur e quando vou pegar o meu remédio, vejo um pequeno pendrive ao lado dele com uma nota escrita. Meu coração dispara por um momento e eu olho ao redor para ver se havia alguém ali.

Nada.

Com as mãos tremendo e o coração cheio de esperanças, que eu prometi manter sob controle, mas sem sucesso, eu pego a nota e leio. Não é uma nota grande, apenas uma linha escrita com uma caligrafia muito bem desenhada.

"Espero que ajude."

Era tudo o que dizia. Mas para mim significava muito mais.

Com o coração intercalando em batidas rápidas e pequenos intervalos que parecia ter parado, eu pego o tablet que a minha mãe deixou para mim aqui na primeira semana que eu acordei, e comecei a ver o vídeo da segurança que poderia me dizer se tudo o que eu ouvi, se tudo o que eu senti foi mesmo real ou não.

Enquanto eu dormia.Onde histórias criam vida. Descubra agora