Capítulo VII: O Cinzento Mundo dos Ecos

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Após alguns dias nem posso acreditar como minha vida mudara e pela primeira vez em minha vida, fora para melhor. Price me mima demais, como se eu fosse uma criança pequena e ao longo desse pouco tempo a cada gesto reconfortante, a cada palavra de consolo, a cada segundo que nós passamos juntos mais eu sinto meu peito aquecer e meu coração ser preenchido com um sentimento que eu não lembrava que existia. Ele se enche com um amor inexplicável, eu não compreendo como isso pode existir em uma pessoa depois de vivenciar tanta dor, medo e raiva.

Aos poucos começo à me convencer que isso é real e não apenas um sonho que eu criei para tentar fugir da dolorosa realidade que me cerca. Um paraíso em meio ao inferno que me permite renegar o passado e tentar seguir em frente, pela primeira vez na vida, sonhar com um futuro bom.

Minha maior decepção com a liberdade que ganhei foi até então não poder olhar para o céu, a única janela que possuo em meu quarto tem uma tela de proteção opaca a cobrindo e apenas posso andar pela casa durante a noite, Price disse que estão me procurando desde que perceberam o engano cometido, eu jamais deveria ter sido vendida como os outros e se alguém que não seja o próprio Price me vê, essa pessoa irá nos denunciar e eu voltarei para a minha cela.

Eu jamais suportaria isso.

Dentre os poucos sonhos que possuo, olhar para o céu é um dos que mais desejo realizar antes de morrer e Jamais fiz isso por que nunca sai na rua, pelo menos não até onde minhas memórias alcançam, mas isso está prestes à mudar, Price prometeu que hoje, um mês após a minha chegada, me levaria para andar pela cidade. Sinto meu coração palpitar com impulsos elétricos anormais, uma reação exagerada de meu corpo e sei que isso é causado pela adrenalina que corre minha corrente sanguínea, habitualmente denominado de ansiedade.

Price disse que antes de tudo eu tenho que ficar irreconhecível, por isso, nesse momento estou seguindo as instruções de uma caixa de tinta para pintar os meus cabelos, por falta de prática, manchando a mim e a tudo ao meu redor.

O novo tom é revelado quando começo a enxaguar o cabelo e o excesso de tinta e outras coisas escorrem pelo ralo, me olho no espelho secando o cabelo e deixando parte da tinta na toalha. Meu rosto parece diferente emoldurado por novos fios pretos, escuros e brilhosos, mas essa não é a única mudança, assim que a tintura está terminada começo o trabalho com a tesoura. Sempre cortei meus próprios cabelos e me permitiam fazer isso ao menos uma vez por ano, então não tenho dificuldade em fazer isso, mas Price manda eu cortar apenas até a altura dos ombros, o que ainda é grande se comparado ao o quanto eu cortava.

Price ajusta as pontas desalinhadas e então me entrega as roupas que selecionou para mim, uma calça preta, uma camisa de manga comprida e um boné para completar meu visual, roupas que jamais usaria por conta própria, jeans e mangas compridas atrapalham o movimento e assessórios são dispensáveis.

- 773, tem uma coisa que precisa saber antes que saíamos na rua.

- O que? - pergunto entusiasmada com a ideia, após trinta e seis dias de liberdade será o primeiro em que eu não estarei cercada por paredes opressoras.

- O mundo que você conheceu não existe mais, este é um outro mundo, mais feio e menos receptivo.

- Não me importo como seja o mundo, desde que eu seja livre nele. - respondo sorrindo, nada arruinará esse dia.

- Então saiba que verá muito Ecos e não deve se abalar por isso, eles não se importam com a vida que levam e nós também não devemos nos importar.

- Ecos?...

- Pessoas que tiveram suas mentes limpas, é um termo que se popularizou, mas é incorreto chamamos assim e pode ser perigoso próximo à estranhos, os chame de autômatos.

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