Capítulo IV: Autocontrole

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Eu não quero escolher um e deixar o outro morrer, não posso fazer isso. Por que estão me obrigando à isso? É irracional e cruel.

A água avança com velocidade e cobre as pernas de Dan e é ainda pior para Day por ela ser muito pequena. Day acordou com a água batendo em seu corpo e agora tenta se manter em uma plataforma que não existe no aquário de Dan.

Eu sei que escolher é a única opção que tenho e mesmo assim só poderei salvar um. As lágrimas dominam meu rosto e os gritos de medo e pedidos de socorro de seus amigos se torna uma tortura insuportável. Toco a tela com o indicar, sobre o aquário de Day e a mensagem "trancado" para de piscar sendo substituída por "aberto", contudo nada acontece. A água continua a escoar das fissuras no teto dos dois aquários e parece ganhar velocidade quando faço minha escolha.

Não sei quanto tempo eles tem até que não possam mais respirar, mas não é muito, a água está na altura do peito de Dan e ele respira ofegando, o que denuncia a baixa temperatura da água. A pequena Day permanece na plataforma que a elevava e mesmo assim a água já cobre a boca dela que mantém a cabeça levantada para ganhar tempo.

- Respira com o nariz Day! Eu vou te tirá daí. - sofro por saber que são apenas palavras vazias para consolá-la. Procuro ao meu redor, mas não há nada que eu possa usar para quebrar o vidro e não importa o quanto eu tente selecionar as celas na tela nada muda.

Já desesperada bato na parede de vidro com os punhos machucando-os, o vidro sendo marcado com meu sangue, mas são golpes sem efeito, dou ombradas tentando aumentar a força dos golpes, como quando tenta arrombar uma porta, mas nada muda. Tento continuar falando com Day, chamando seu nome e pedindo para que se mantenha acordada, até que com as lágrimas lavando meu rosto e a respiração ofegante paro. Day não se move mais há pelo menos um minuto.

- Vamos Day, acorda. - digo em uma onda de choro. - Você não pode morrer, ainda não encontramos seus pais.

Minha atenção é tomada para Dan ao ouvi ele engolir uma tragada de água. Agora ele está na ponta dos pés tentando se manter longe da superfície, tentando respirar, mas a proximidade com as comportas impedem de fazer isso com eficiência. Seus pés cansados vacilam fazendo Dan mergulhar até conseguir voltar à posição anterior e fugir da água por um instante.

O aquário de Day agora está cheio e ela não se move mais, apenas afunda com leveza na água e isso faz uma dor impossível de existir se alastrar por meu corpo. É preferível a morte à presenciar essa cena.

A tela mostra o homem novamente e seu semblante é indiferente, como se estivesse fazendo algo banal e não jogando com a vida das pessoas inocentes, é repugnante.

- Você disse que eu podia salvar um! - Grito com um misto de raiva, desespero e dor.

- Eu menti. - diz ele com frieza, o que fez meu ódio por ele aumentar, não sabia que era possível sentir algo assim, mas o amor pode ser algo avassalador e incalculável, por que o ódio também não poderia ser. - Entretanto você ainda pode salvar o garoto, basta quebrar o vidro. Basta você assumi quem verdadeiramente é.

Com essas palavras ainda reverberando em minha cabeça a tela se apaga e volta à parecer a parede de vidro que tinha visto antes, a parede que refletia a imagem de uma garota triste com o rosto coberto de lágrimas e os fios loiros colados as bochechas molhadas.

O próximo minuto é tão doloroso quanto o anterior e o último de Day, nele Dan fechou os olhos e parou de lutar. Vejo os rostos deles tão calmos que parecem dormi um sono muito tranquilo, se não fosse por estarem boiando, eu poderia acreditar que estão apenas dormindo.

Demora para as lágrimas pararem de escorrer por meu rosto, mas mesmo quando isso acontece a dor continua e parece que nunca me deixará. Quero ficar aqui com Day e Dan, mas não consigo mais olhar para eles, não quero vê-los desse jeito, mesmo eles aparentando estar bem é aterrorizador. Preferia ter sido dilacerada por aquela fera que há pouco atormentava meus pensamentos do que passar por isso. Agora o monstro e meus sonhos com o passado parecem distantes e vagos, como se não tivessem acontecido, como se minha vida não importasse. Tudo que consigo fazer é pensar que não pude cumprir minha promessa de encontrar os pais da Day e o Dan nunca conseguira me mostrar o mundo que lembro apenas vagamente.

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