Sexto Capitulo

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Parte Dois

Durante o trote, nos fizeram deitar de bruços e escorregar em lonas de plástico meladas de estrume de cavalo. Deu para entender que um dos veteranos tinha um pai fazendeiro, criador de cavalos e bovinos, e que as tintas de impressoras e os ovos com farinhas não eram suficientemente vergonhosos por si só. Eu tinha usado a camisa da igreja, aquela que tem o nome da cidade e a peregrinação com uma passagem bíblica abaixo dos Jovens de Jesus gravado. Era uma das minhas favoritas dentre os grupos da igreja que eu participava com meus outros primos. Eles não eram tão religiosos porque seus pais também não, mas os meus, principalmente minha mãe, tinham perspectivas mais conservadoras quando tratávamos da Bíblia. E eu gostava. Ainda gosto.

A camisa favorita da minha mãe estava melada em 80% de tinta azul e 20% de estrume úmido de cavalo. Isso é Ok porque ela só viria daqui quinze dias, então eu tinha bastante tempo para limpa-lá e fingir que nada aconteceu.

Nós também pedimos esmolas na rua em nome de um programa social - o que era mentira -, para juntarmos e irmos ao boteco mais famoso perto da faculdade: Canyl. Sim, com "y". Eles fizeram com que cada novato bebesse três doses seguidas de Ypioca amarela. Então quando terminei, eu estava muito bebado. Não bebado engraçado, simpático, mas sim um bebado que tropeçava e fazia danças ridículas. Tem coisas que não me lembro e espero nunca lembrar. Como eu não era o único, a vergonha não foi extraordinária. Dava para conviver com isso. A parte boa foi que conheci Rafaela e Hélio. Rafaela era a garota loira e que usava sempre rabo cavalo. Ela apareceu na maioria das fotos ao meu lado, com metade do rosto de tinta azul também e estrume na bochecha. Estava tão nojenta quanto eu, então a amizade foi iniciada a partir da vergonha. Já Hélio havia ficado bebado junto comigo. Era tão ruim na dança sóbrio quanto bebado.

- Não acredito - Yara estava em choque. Conversávamos por vídeo-chamada. -, mas eles não podem fazer isso. Ou podem?

Quando falávamos, ela fazia muitas caretas. Principalmente com as sobrancelhas e a boca torta. Era sempre engraçado vê-la fazendo caretas porque eu tirava muitos prints despretensiosamente. Ou talvez com a pretensão de usá-los mais tarde.

Aos finais de semana era mais fácil poder conversar com ela, mas hoje era quarta, um dia após o trote e eu estava livre para fazer a ligação.

- Eles podem sim. Foi vergonhoso. - confessei.

Antes do trote, um dos professores do último semestre faleceu, por conta disso, a faculdade declarou luto da quinta a segunda-feira, onde acabei passando meu final de semana prolongado em casa. Não houve muito no que pensar, arrumei essa oportunidade para encontrar Yara na clínica veterinária do seu tio. Estávamos conversando há duas semanas, o suficiente para descobrir onde trabalhava, seus horários e o endereço. Minha aparição foi de surpresa, depois de umas cinco tentativas circulando pela calçada e fingindo que não podia ser visto pela porta de vidro, embora ela tivesse me confirmado que não havia me notado em nenhuma das outras vezes. Talvez ela estivesse no mesmo estado que o meu. Ou que eu estivesse nesse estado sozinho. Não podia adivinhar.

Foi estranho vê-la fora, sem companhia, num dia comum. Yara estava desestabilizada para ser sincero. Não sabia o que dizer nem como agir, então eu fiz por ela. Eu a beijei. Falamos sobre a faculdade. Trabalho. Toquei o cabelo dourado dela. Eu a fiz rir. E ela fazia muito isso, rir. Ela riu, jogou a cabeça para o lado e eu fui impulsivo e rápido em conseguir roubar-lhe um beijo. O corpo todo dela cedeu. Depois voltamos a conversar. Ela, por vontade própria, tocou meus dedos, minhas mãos. Os encaixou ali. Os toques eram as melhores partes, depois da conversa. Deus, ela era sensacionalmente boa em conversar. Tanto quanto eu, embora a parte de começar sempre fosse minha. Com o tempo passando, tive que ir embora. Então eu a beijei novamente e ela não disse mais nada. Apenas disse que eu deveria ir.

32 Semanas e Algumas MusicasOnde histórias criam vida. Descubra agora