Ática, 431 a.C.

O dia havia principiado tranquilo como outro qualquer em Atenas e redondezas. Camponeses no campo a trabalhar a terra, pescadores ao mar, cidadãos na ágora a discutir política, mulheres em casa a cuidar de seus afazeres e artistas e filósofos da pólis espalhados em seus recônditos a elaborar suas obras prodigiosas dignas de admiração.

Ródia estava mais uma vez no Galera de Salamina. Vestida de homem e com uma cítara a cantar tão doce e encantadoramente quanto às sereias que enfeitiçavam os navegadores, que embasbacados perdiam o senso de orientação, fazendo-os naufragar para em seguida serem devorados.

Assim prosseguiu até o meio da tarde quando subitamente ergueu no céu uma densa nuvem de fumaça acima das muralhas da cidade. Algumas pessoas correram para ver do que se tratava e levaram um grande choque ao verem os hoplitas espartanos com suas couraças refulgindo ao sol, lança em punho, audazes e intrépidos, incendiando as fazendas e destruindo os bosques de oliveiras.

Imediatamente um arauto foi levar a notícia a Péricles que estava no Pórtico Sul com seu amigo Sófocles a discutir assuntos referentes à cidade. O jovem chegou a Péricles esbaforido. Ele e seu interlocutor ficaram hirtos olhando o efebo sem compreender o motivo de tanta pressa ao levar uma mensagem a ponto do mensageiro ficar sem fôlego e impedido de cumprir sua missão.

- Fala meu jovem – disse Péricles aturdido.

- Deve ser algo muito grave, meu amigo – atalhou Sófocles olhando para fora, em direção da ágora. Notou que as pessoas olhavam fixamente na direção da entrada da cidade. Algo estava ocorrendo por lá. Saiu a fim de verificar.

- Senhor, o exército lacedemônio invadiu nossa terra. Estão incendiando os campos e destruindo os bosques – disse o arauto enfim.

- Por Atena! – disse Péricles perplexo.

O arauto não se movia. Péricles saiu lá fora aonde Sófocles falava com um cidadão. Aproximou-se e ouviu seu amigo dizer:

- Eles querem por um fim a nossa florescência. Malditos espartanos!

- Precisamos convocar todos os órgãos políticos. Se revidarmos esse ataque seremos esmagados. O melhor é nos abrigarmos aqui dentro e planejarmos um contra-ataque com nossa frota. É nossa única chance.

- Tem razão. Mandarei fechar os portões da cidade e convocarei os órgãos no Teatro de Dioniso. Vá a sua casa ver como está sua família. Já devem ter recebido a notícia e decerto estão apavorados por ti – respondeu Sófocles.

- Farei isso. Aguarde-me no teatro.

A mando de Sófocles a cidade foi trancada e vigiada por guardas nos locais estratégicos. O quartel-general entrou em alerta e a frota foi convocada a se equipar. A Eclésia, Bulé e as Heliae foram convocadas no Teatro de Dioniso. O pânico se alastrou pela pólis em pouco tempo. O exército mais poderoso da Hélade, aliado a outros dois exércitos, invadiu a Ática e Atenas era o alvo. Um alvo suscetível à derrota.

O Porto do Pireu começou a se agitar. Soldados andavam em todas as direções, navios zarpavam a todo o momento, eram gritos de comandantes militares, arautos chagando com novas mensagens oriundas do Teatro de Dioniso onde ocorria uma importante reunião dos cidadãos atenienses e os órgãos políticos da cidade a fim de decidirem que medida emergente tomar.

Ródia observava todo aquele movimento sem saber de absolutamente nada. Tampouco queria descobrir. Nem mesmo as reuniões que assistia do filósofo Sócrates lhe despertavam interesse. Somente recordava do seu bem-amado Lisandro. Onde estaria ele? Será que a amava de verdade? Atena os puniria afastando-os para todo o sempre e infelizmente nunca mais se veriam? Seriam apenas as recordações as únicas fontes de prazer de sua mísera vida de mulher de Atenas? Contemplava o mar em seu frequente movimento de ir e vir formulado em suas ondas perenes que atravessaram as idades sepultando tantas outras histórias, como a de Leandro e Hero, oh que fatídico conto de amor ardoroso e fincado na alma daquelas criaturas imbecis!

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