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Black satin cape with the purple lining Put it on in the perfect weather
Look at me I’m a real vampire
I just wanted to live forever

(Nosferatu Blues - Mark Stoermer)

Danny desapareceu totalmente. Seus e-mails findaram sem nenhuma explicação. Procurei sua mãe. O garoto, apesar de aventureiro, sempre avisava onde estava e as últimas notícias datavam sua estadia no Japão.

Ela convidou-me para um chá e perguntou o lugar exato onde ele teria escrito o último e-mail.

Respondi sua pergunta e ela mudou totalmente a expressão e levando as mãos ao rosto, me disse:

—Não pode ser. Ele disse que ia ficar mais um mês no Japão. Enid, meu filho está morto?

Naquele momento as minhas pernas pesaram e o mundo parou ao meu redor.

—Como assim morto? E comecei a rir sem explicação óbvia.

 —Meu marido recebeu notícias que encontraram os documentos de Daniel em destroços de um navio que ia para... Eu não consigo lembrar, algo que começa com P.

—Port Moresby — disse eu, enquanto perdia totalmente as forças do meu corpo.

Achei que ia desmaiar por alguns segundos. Pedi desculpas e só consegui correr até a porta. Senti uma vertigem muito grande e simplesmente cai.

Acordei um tempo mais tarde com a governante dos Edwards e a mãe de Danny ao meu redor.

Eu estou me sentindo bem, só preciso andar e ir pra minha casa.

Com alguma relutância me deixaram partir. Me desculpei e ganhei a rua. A realidade parecia um sonho. O ar parecia pesado, minhas pernas estavam moles. Por alguns minutos sentei no cordão da calçada, em frente a uma das casas mais antigas da rua, coisa que Danny mais adorava e conclui que meu melhor amigo estava morto. Minha cabeça virou um turbilhão de memórias. As lembranças se misturavam com as lágrimas que caiam pelo meu rosto. Quem passava por mim não entendia a minha dor. Danny havia morrido. Chegando em casa, fui recebida pela minha mãe.

O que aconteceu, Enid? Pressão baixa?

Danny morreu — disse em tom sussurrado.

Ela não conseguia nem falar. Eu segui para o meu quarto e minha cama tornou-se meu refúgio por semanas. Mal comia, nem tomava banho. Apenas tinha esse sonho bizarro, onde ouvia Danny me chamando. Não conseguia vê-lo. Apenas uma praia e o som de sua voz pedindo ajuda. Algumas horas eu entenderia essa série de sonhos bizarros.

Ainda era muito cedo em Lancaster. Ouvi o barulho da campainha. Minha mãe desceu pelas escadas e retornou até o meu quarto, trazendo em suas mãos um caderno de anotações, colocado dentro de um plástico zip pac, endereçado a mim. Era de Danny.

 —Acharam isso em uma praia de Port Moresby. O pai de Danny mandou para você.

Não tive forças para responder. Comecei a folhear o caderno, o qual tinha a seguinte frase na capa: Um presente para Enid. Ele era repleto de frases e registros de onde Danny passara. E um post-it chamou minha atenção.

— Eu estou vivo. Você precisa me ajudar. Estou na comunidade Perks. Quando você chegar aqui talvez seja tarde demais.

Pulei da cama desesperada e coloquei no buscador da internet o que seria aquela comunidade. E fiquei perplexa. A comunidade Perks era um grupo religioso, comandado por um profeta australiano que dizia ter sido chamado por Deus. Eles viviam em um território ultramar, nas proximidades de Port Moresby. Qualquer pessoa conseguia entrar naquele lugar... Mas sair era quase impossível. E uma das premissas do grupo é que supostamente eles queimavam pessoas que não seguissem a lógica heterossexual. O grande evento acontecia em setembro. E faltavam 5 dias para agosto acabar.

Cambaleando, coloquei algumas roupas em uma mala, escrevi um bilhete para minha família e corri até o banco mais próximo. Depois, fui até o aeroporto comprar a  passagem para Port Moresby. Dentro do avião, o qual fazia várias escalas até chegar lá,  lendo seus registros descobri como Danny entrou nessa enrrascada, a qual ele batizou de: O lado negro da felicidade.

Port Moresby, 1 de julho.

Participei de um encontro de várias congregações religiosas. Consegui que cada uma me falasse um pouco sobre o que é a felicidade. Aparentemente, todas se resumem a mesma coisa. A alegria não está nessa vida. Temos que fazer algumas coisas aqui, seguir mandamentos e então vamos alcançar isso depois da morte e de um julgamento final.

Mas algo me chamou atenção: As cinco missionárias da Comunidade Perks. Criada por um homem, chamado Perks Wellington, o qual se auto-intítula o enviado de Deus, a seita vende a ideia de que a felicidade encontra-se na pequena ilha onde vive o grupo religioso. Muita gente na Oceania largou tudo para segui-lo. E os boatos dizem que Perks não era exatamente um religioso convencional. Ele era multi-milionário. Graças ao dinheiro que recebeu de seus fiéis, um pré-requisito para conhecer a sua versão de felicidade, teria comprado várias empresas de extração de petróleo na África. Os seus retiros espirituais fora da ilha seriam viagens para Las Vegas e outros paraísos proibidos para os seus seguidores.

As cinco pregadoras de sua"igreja" perceberam o meu interesse e fizeram um convite especial. Que eu fosse com elas para a ilha. Assim poderia conhecer a ilhota onde vivem. E que eu poderia sair a hora que eu quisesse, já que eu era apenas um observador.

—Seria muito bom que alguém de fora visse o que acontece lá dentro de nossa comunidade. Assim não falariam mentiras sobre nós —, disse Samira, a mais jovem do grupo.

As suas palavras, porém, não demonstravam algum interesse de mostrar a verdade. Parecia mais um pedido de ajuda. Resolvi então embarcar com eles. Não seria tão ruim passar somente alguns dias em uma ilha paradísiaca, onde supostamente a felicidade existe.

3 de julho – Ilha de Perks

Finalmente consegui um tempo para estar com as minhas coisas. A ilha realmente é paradísiaca, mas o seu interior parece um campo de concentração. As pessoas são confinadas em um grande coliseu de quatro andares. No centro, um campo verde, onde eles se reúnem todos os dias, às 17hs, para ouvir o Sermão de Perks. No andar de baixo estão os quartos dos solteiros. No andar de cima, o quarto de pessoas casadas. As famílias se aglomeram em cúbiculos de três cômodos. No 3 andar acontecem os rituais de espiritualização, os quais eu não compreendi muito bem. No quarto andar ficam as guaritas com guardas armados.

As mulheres ficam com o olhar baixo o tempo todo. Só podem conversar com pessoas do mesmo sexo. As únicas conversas que podem ter com seus maridos são bastante simples: apenas responder alguma de suas perguntas. A palavra final é sempre do líder da família. Quando caminhava pelo Coliseu até chegar ao meu quarto, as mulheres viravam-se para as paredes para evitar qualquer contato. Em uma colina, alguns quilômetros do campo de concentração da felicidade, está a casa de Perks. O lugar mais majestoso da ilha. Aparentemente só Perks é feliz aqui.

4 de julho

Fui convidado para uma sessão de espiritualização. Fiquei 4 horas vendo um vídeo que mostrava a comunidade, cheio de repetições.

Você é feliz—, dizia Perks, em looping. —Eu sou o profeta de Deus

Repetição. Uma grande lavagem cerebral. E todos os membros precisam passar por isso uma vez por dia.

Confesso que peguei no sono no meio da sessão. As pessoas saiam das salas com as mais diferentes reações. Passei por Samira e consegui ler seu sussuro: "eu não aguento mais".

A Felicidade Segundo Danny EdwardsOnde histórias criam vida. Descubra agora