Otabek nunca havia se imposto muitas limitações, regras a serem seguidas; simplesmente dedicava-se assiduamente ao seu ideal de nunca permitir-se desenvolver sentimentos por alguém. Durante seus 28 anos, ninguém chegara perto de fazê-lo sentir o que era o amor. Para ele, era apenas a vontade sexual, crua e pura, que permeava suas relações.
Não que a decisão de trancar seu coração tivesse origem em alguma trama clichê, como um coração jovem partido. Otabek não era a história repetida em todas as páginas; ele apenas não se permitia desde que viu sua mãe definhar sobre uma cama. Seus pais eram parceiros, unidos por um laço com um significado maior do que o próprio casamento. Quando o câncer a destruiu, fez o mesmo com seu pai. Não foi uma morte, nem um mergulho na loucura que muitos experimentam quando perdem esse laço, mas uma transformação em uma casca do homem que sempre foi.
Temir Leroy nunca foi um pai amoroso e gentil, mas a perda de Aiday fez com que seu coração se tornasse duro, seco e amargurado. Na noite em que Otabek decidiu nunca ter um laço, Temir virou as costas para os filhos. Não suportava, especialmente, olhar para Otabek, que tinha tanto da mãe. Otabek herdara os olhos e o coração de Aiday, e lembrar-se dela era uma dor insuportável para Temir, principalmente quando sentia, a cada dia, a marca desaparecer.
A perda da marca era um processo gradual, como uma página que se apaga lentamente ao longo do tempo. Marcar seu parceiro ou parceira não era apenas um gesto simbólico; representava algo profundo e singular, uma conexão que ia além de uma simples aliança. A união da marca transcendia as barreiras do físico, permitindo que se experimentasse intensamente as emoções da outra pessoa, alcançando uma compreensão que ultrapassava os limites do próprio entendimento.
Em um mundo que atribuía tanta importância à marca, ainda havia algo extraordinário chamado Almas Destinadas. Este fenômeno, tão raro que poderia ser considerado um mito, envolvia uma atração irresistível e uma ligação única. Nessas almas destinadas, a conexão era tão profunda e intrínseca que a marcação se tornava desnecessária. Duas almas tornavam-se uma só, uma fusão inexplicável que transcendia os limites da compreensão convencional, uma história que desafiava as normas do que era considerado possível.
A lenda ancestral ecoava nos corredores do tempo, contando que, nos primórdios da humanidade, quando esta se afastava de suas origens primitivas e as matilhas se desintegravam, uma alma era dividida entre dois corpos: o seu e o de seu predestinado. Contudo, um deus esquecido, impelido por inveja e ira, decretou que essas almas gêmeas fossem separadas. Desde então, os seres humanos começaram a peregrinar pelo mundo em busca da metade de sua alma perdida.
Essas lendas, rituais e mitos compunham anseios que Otabek jamais permitiu aflorar. Na noite de seu vigésimo aniversário, Temir o convocou ao escritório, e durante horas, proferiu um monólogo incisivo sobre a primazia do escritório de advocacia, seu império frio e inabalável. Para Temir, Alphas deveriam ostentar decisões imperturbáveis e ágeis para assegurar seu domínio no topo da pirâmide social. Tudo, na visão dele, estava sob seu domínio, pronto para ser subjugado e conquistado. O sentimento do Alpha pairava no ar como uma regra implacável, restringindo quaisquer pensamentos que ousassem desafiar a máxima de que, como um Alpha, tudo lhe pertence, devendo ser controlado e subjugado.
Otabek fixou seu olhar no teto, imerso em pensamentos, quando percebeu a cama balançar com o movimento do corpo nu ao seu lado. Ao fitar a loira adormecida, franziu a testa, incapaz de recordar como havia chegado ali ou mesmo o nome da mulher. Na verdade, não se importava com nenhum desses detalhes. O aroma doce e floral da ômega invadiu seus sentidos, fazendo-o prender a respiração para evitar o odor irritante. Levantou-se da cama, observando atentamente em busca de marcas de mordida na mulher. Sentiu um alívio quando não encontrou nenhum sinal de sangue.
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Last Chance - Repostando
FanfictionYuri Plisetsky é um ômega que nunca aceitou ser diminuído por seu segundo gênero. Sua determinação e força de vontade foram cruciais para que ele se formasse em Medicina, curso notoriamente dominado por alphas. Uma vez formado, Yuri recebe a notícia...