Capítulo 1

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1.

Telhas quebradas. Azulejos brancos e sujos. Piso vermelho. Espelhos rachados, corroídos, faltando pedaços. Pias encardidas. Cabines. Vasos sanitários imundos e entupidos. Fedor. Som de água caindo no chão. Vozes.

Dei mais uma volta em torno de mim mesmo tentando entender o que acontecera, buscando uma explicação verossímil de como fui parar naquele lugar. Voltei para o espelho e o toquei delicadamente. Como se assim pudesse ativar algum mecanismo que me levasse de volta para o meu onde e quando e me tirasse daquele estado de total alucinação que aparentemente eu estava imerso.

O cheiro do banheiro era ruim. Um misto de fossa e mofo misturados com sabonete e shampoo. As telhas eram aparentes e entre umas e outras que estavam rachadas, fachos de sol irrompiam e permitiam que partículas de poeira dançassem na luz e repousassem na fuliginosidade que atapetava o lugar. Não havia estuque. Teias de aranha revestiam os cantos. Nas paredes, os azulejos brancos estavam encardidos, uns rachados e outros simplesmente faltando. O piso de cimento queimado fora pintado de vermelho e estava lodoso e empoado.

As luzes fluorescentes eram bem fracas. Tudo naquele plano era um pouco acinzentado, um tanto azulado, meio opaco, totalmente frio, definitivamente sem vida.

Som de água caindo me chamou atenção. Estava vindo do outro lado da parede de dois metros de altura onde ficavam as pias. Talvez se eu subisse em uma delas daria para ver de onde estava vindo essa água do outro lado da parede. Eu ouvia vozes também.

Olhei para a minha direita e havia uma porta aberta, a luz que entrava por ela era bem forte, mal dava para ver o que havia além. Aquela era a porta de saída. A única saída do local pelo visto. Eu estava em dúvida se descobria de quem eram aquelas vozes ou se saía logo dali. Foi quando eu vi alguém entrando no recinto de cabeça baixa e assoviando. Rapidamente e instintivamente dei passos para trás e acabei entrando em uma das cabines sem porta e me encostei na parede tentando não emitir nenhum som. O vaso sanitário oferecia o cheiro de água podre e sopa de fezes esquecidas sem descarga.

A pessoa passou e eu pude notar que era menor que eu, aparentemente jovem pela forma que se vestia. Era um garoto e estava usando uma camiseta clara, bermuda, tênis de skatista e uma mochila a tira colo.

Ele se juntou as outras pessoas do outro lado da parede e começaram a conversar. O som era estranho naquele plano. Era como se eu estivesse com as mãos tapando os ouvidos.

Fiquei ali, imóvel, por um bom tempo. Saí de fininho da cabine e fiquei de frente para a porta de saída. As vozes me chamavam a atenção. No fundo, parecia que eu as conhecia. Eu podia ter saído correndo, mas dei meia volta e comecei a caminhar para dentro do que aparentemente era um banheiro mal cuidado. Aquele lugar não me era estranho.

A porta de entrada dava para um corredor. Havia uma parede no formato de um L. Entrando, do lado direito estavam as pias, do lado esquerdo as cabines com vasos e na parede lá na frente tinha um mictório.

Caminhei lentamente, com cuidado para que os saltos das minhas botas não fizessem barulho. Virei a direita no final do corredor e me escondi atrás da parede das pias que tinha menos de sessenta centímetros de espessura. Projetei minha cabeça lentamente para aquela outra parte do recinto e me deparei com a cena mais surreal que eu já tinha visto.

Eu me vi mais jovem, junto com o Daniel transando com o Marquinhos.

— Mas que porra... — Deixei escapar quase em um sussurro.

E essa cena do meu passado veio do fundo da minha memória e ganhou vida diante dos meus olhos como se estivesse acontecendo de fato naquele momento. Aquele era o vestiário de uma chácara que eu tinha ido há muito tempo. Ela ficava na cidade de Rio Grande da Serra e naquele dia tínhamos reunido a galera da faculdade para um churrasco. E foi naquele dia que eu tive a minha primeira experiência sexual a três.

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