Razljubít

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Razljubít: (n) Russo. O sentimento que você tem por quem um dia amou.

   Ela não era diferente. E odiava que a dissessem tal coisa. Por isso, fazia de cada dia uma luta para se impor. A beleza ariana a facilitava os caminhos, mas ela preferia percorrer os sinuosos, só para poder dizer ao final, orgulhosamente, "Eu consegui com o meu esforço!". A liberdade lhe atraíra cedo demais, fazendo com que a responsabilidade não tivesse outra saída senão se instalar ali. A família e os amigos, apesar de distantes, eram sua força motriz. E o namorado era a faísca que a impulsionava a seguir adiante. Foi em uma de suas tentativas deliberadas em contrariar as oportunidades que nos conhecemos. O que, a princípio, parecia fadado ao fracasso, se tornou música.

   Ela era diferente. E fazia a diferença em tudo o que ousava tocar. Acorde, tom, dó de mim. É como se eu sempre tivesse querido ir à Roma e, de repente, ela apareceu e se tornou Roma para mim. Tentei por diversas vezes fazê-la entender que existem coisas inexplicáveis, como química, por exemplo, ou até mesmo a física dos nossos corpos unidos. Porém, o seu ceticismo não a deixava enxergar. Eu sabia que não poderíamos ir muito mais além, porque existia um Leonardo no meio do caminho. Só que até o jeito como ele a olhava, em vez de me deter, me fazia querê-la ainda mais. Ela era o meu paraíso, mas talvez eu fosse o seu inferno.

"Eu desejo que você encontre o grande amor da sua vida."

   Essa foi a última mensagem que ela me deixou. Geralmente, as últimas palavras são as que mais machucam. Eu entendia perfeitamente a ironia no seu desejo. Lamento que nossos últimos dias juntas tenham sido tão ruins por causa dele. Mas todas as vezes em que você tinha uma escolha a fazer, você o escolhia. Eu só não podia mais continuar desse jeito. Eu não queria te deixar ir embora, mas eu mesma já estava indo.

   Hoje, depois de tantos anos, eu queria te dizer que procurei o "amor da minha vida". E não pretendo mentir dizendo que não o achei. O amor que encontrei não foi o único, porque não acho que a vida é cruel a ponto de reservar apenas um para cada pessoa. Mas foi singular, como todos os outros. Nós não sonhamos, nós acontecemos. Nos completamos, nos apaixonamos, nos alegramos, fluímos. Mas chegou uma hora em que nos perdemos e tivemos o temível ponto final. A sua exceção entra nessa parte. O ponto final. Nunca fui capaz de encerrar essa história. Do nosso último encontro, restaram as palavras presas na garganta, as lágrimas soltas pelo rosto e as reticências...

Flashback ON

- Fanta...

   Ela tentou explicar, mas faltaram-lhe as palavras. Saíram pelos olhos. E se formou um dicionário em suas mãos. Éramos como dois barcos que navegávamos para rumos diferentes a cada gota que caía. Ela sabia que quando saísse dali tudo estaria mudado e acho que por isso, ficou o quanto pôde. Nos encarávamos, mas o ar, cada vez mais pesado, parecia nos impedir de mover. Seus olhos me intimidavam mais do que ela tinha consciência, suas mãos quentes me sustentavam sobre meus pés, mas a ausência de reações da minha parte, as esfriaram. Ela deixou sob o meu colo o papel que segurava e se foi.

   Quando Luciana saiu por aquela porta, eu continuei imóvel. Partidas nunca foram o meu forte. Por ter passado a infância me mudando constantemente, deixei de procurar um lar em um lugar específico e passei a encontrar raízes em pessoas. E quando alguém vai embora da sua vida, as saídas nunca são iguais. Algumas são bonitas e poéticas e agradáveis, outras são desinteressantes, não intencionais, atrapalhadas, mas existem ainda as abruptas e injustas e dolorosas. Você, sem dúvida, se encaixava na última categoria.

   Não sei por quanto tempo fiquei tentando absorver o que tinha sido, aparentemente, nosso último momento de intimidade. Não sei por quanto tempo fiquei tentando absorver o que ela escrevera naquele rascunho. A próxima imagem que me vem à mente é a de Aline, colocando a cabeça, cautelosamente, para dentro do camarim. Não demorou muito para que ela se sentasse ao meu lado e me abraçasse. Não perguntou nada, só ficou ali. E, no momento, era tudo o que eu precisava.

Flashback OFF

   Passei 20 dias e 156 noites tentando te esquecer. Em todas elas, conversava com a lua, minha amante oportuna na solidão. Nós quatro, restantes após a sua partida, nos unimos mais e fizemos de nós família. E as meninas não economizaram estratégias para me distrair. Sei que o nosso elo é para a vida inteira, mas o Rouge, desde o início, sempre foi uma estrela de cinco pontas e, por mais que tenhamos suportado muito bem a armação apenas com quatro, já está na hora de reequilibrarmos as bases. Espero que a vida lhe tenha sido generosa em nosso hiato, mas preciso que o universo se alinhe para o nosso reencontro.

RaméOnde histórias criam vida. Descubra agora