CAPÍTULO 11-SARA NÃO RECONHECE TONI

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Toni suspirou profundamente ao entrar na banheira com sais de banho que preparara com cuidado para si mesma com a intenção de conseguir relaxar um pouco.

Fora o primeiro dia na obra da casa de Sara e ela se sentia imunda, exausta, horrorosa...estranha.

No meio de seus homens, fora como se ela, aos poucos, fosse contaminada pela masculinidade deles, tornando-se uma figura agressiva no meio das três mulheres daquela casa.

Fechou os olhos e repassou os acontecimentos do dia.

Chegara às sete e trinta na casa de Sara,  mas não pudera entrar com a moto.

O carro da professora primária, um fusca azul metálico, estava parado do lado de fora do portão impedindo que ela entrasse. Sara estava parada ao lado do carro.

Toni desceu da moto e, antes que ela retirasse o capacete, Sara gritou:

_Bom dia! Por favor, poderia me ajudar a empurrar? Estou atrasada e ele não quer pegar!_disse aflita.

_Posso te levar na moto!_disse Toni com a voz abafada pelo capacete.

_Não, rapaz! Sou professora e estou lotada de sacolas, pacotes, cartazes...não dá pra levar de moto! Já coloquei tudo dentro do carro. Vamos, por favor, é só dar um empurrãozinho e ele pega!_Sara entrou apressada atrás do volante.

Toni empurrou o fusca ladeira abaixo e realmente ele funcionou. Sara buzinou e acenou pra ela, indo embora.

Finalmente, Toni retirou o capacete de moto e colocou o de construtor.

O fato de Sara tê-la confundido com um homem a incomodou. Não se esquecera de nenhum dos detalhes da professorinha. Lembrava-se dos cabelos cor de mel e acacheados, da calcinha, dos seios pequenos e firmes saltando do sutiã...dos passos curtos e rápidos...do semblante cansado...

_O senhor dever ser o senhor Amâncio._disse Alice tocando o ombro dela, quando ela se virou._Oh, me desculpe...não sabia que uma garota trabalharia na reforma da casa. Acho que foi você quem veio aqui outro dia. Espere aí que me lembrarei do seu nome...Fabrícia...Patrícia...

_Felícia, mas pode me chamar de Toni. Fui eu mesma que estive aqui no outro dia._esclareceu.

_Acho que você cortou os cabelos...é isso!_sorriu bondosa._ Pode entrar!

Enquanto seguia a empregada, ela ia conversando:

_Onde está o senhor Amâncio? Não virá?

_Infelizmente, ele quebrou a perna e eu terei que substituí-lo.

_Ora, ora...não sabia que mulheres podiam dirigir obras. Então foi por isso que cortou os cabelos?

_Sim, foi por isso._simplificou.

Toni tomou café com vó Catarina e foi trabalhar.

Explicou a situação ao grupo e, no momento seguinte, já estava entrosada subindo e descendo escadas e andando livremente no meio deles com o seu uniforme cinza, como o deles. 

Mais uma vez, reconheceu que o grupo era muito competente e caprichoso. Sentiu-se segura do sucesso da obra e da entrega no prazo estipulado para Sara.

A engenheira estava exausta no final do dia, quando ouviu que o carro de Sara chegava.

Novamente, viu Sara carregada de sacolas e cartazes saindo rapidamente do carro com os seus passos curtos e rápidos.

Os cabelos, novamente amarrados, mas com algumas mechas soltas emoldurando o rosto cansado, mais uma vez encantaram Toni.

Mais uma vez, Sara não a reconheceu, passando por ela sem olhar o seu rosto por mais do que segundos, dar boa tarde e pedir que fizesse a gentileza de fechar o portão pra ela, já que estava mesmo de saída.

Toni ficou imaginando se Sara olhara para o seu rosto uma segunda vez ou se chegara à conclusão que ela era um homem somente observando o seu uniforme.

Subiu na moto, passou pelo portão. Desceu, voltou e fechou.

Quando desceu a rua, já tinha uma única imagem na cabeça: um rosto corado e pequeno, emoldurado por mechas cor de mel, um par de brincos laranja, eram borboletinhas de plástico, ainda notou, combinando com a blusa da escola que agora era da mesma cor. 

Toni ainda pensou mecanicamente quantas cores de blusa haveria naquela escola e se Sara teria um par de brincos da cor de cada uma.

O laranja a deixara mais corada, enquanto a boca levemente aberta soltava o ar afobado.

Olhara Sara de costas e sentiu uma sensação estranha ao olhar a bundinha arrebitada se remexendo de uma forma deliciosa de se ver ao entrar apressada dentro de casa usando novamente as rasteirinhas nos pés pequenos. Ela era toda delicada, feminina, meiga.

Toni ficou pensando como ela era ingênua ao confiar numa pessoa que ela achava estar vendo a primeira vez, supostamente um dos operários, que ele iria fechar o portão que daria um pouco de segurança para as três mulheres que ali moravam.

A capoeira que ela jogara naquele dia fora péssima. 

Luís, como dissera Felipe, realmente era um excelente professor e, como ela estivesse sem concentração, quase que a acertara feio duas vezes. Pedira desculpas, diante dos conselhos do professor novato que a instruía a ficar mais atenta. Alegou cansaço e saiu mais cedo.

Sentia-se confusa, estranha. Dispensara a visita do namorado, naquele dia.

Queria ficar sozinha e por a cabeça em ordem. Não conseguiu.

Deitou-se mais cedo e teve um pesadelo horrível: via Sara sentada na varanda da casa da avó, com um vestidinho vermelho. De repente, Toni a pegava forte e com violência, assustando a garota que a olhou em pânico. A engenheira arrancava o vestido rasgando-o no corpo da professorinha, que saía correndo tentando ocultar a sua nudez. Toni pegou os pedaços do vestido e começou a comer.

Acordou assustada e não conseguiu dormir novamente.

Repassou todos os momentos que estivera com Sara. Lembrou-se de cada detalhe do seu rosto, corpo, sua voz...lembrou-se de tudo o que ela falara e como reagira a tudo o que Toni dissera...lembrou-se do carinho dela com a avó.

Resolveu ir até a cozinha e tomar um pouco de água, pois tinha a garganta seca.

Foi até o banheiro e retirou a única peça de roupa  que estava usando para dormir: um camisão branco que ela adorava, por ser muito confortável.

Conferiu seu corpo no espelho: músculos firmes, ausência de barriga, seios fartos e firmes, estrias quase não existiam (aliás, pensava sempre, nunca vira uma mulher que não reclamasse de alguma estria). Não havia celulite ou rugas.

Automaticamente, veio a sua mente um outro corpo pequeno, frágil...novamente a visão de Sara, que ela já repassara umas cem vezes, levantando os braços e retirando o vestido, o sutiã, ficando só de calcinha na frente dela encantou a engenheira. Aquela desinibição, aquela postura quase infantil havia mexido com a moça.

_Menininha linda, menininha fofa!_sussurrou para si lembrando-se dos brincos de borboletas laranja se agitando enquanto ela entrava rapidamente em casa.

Um sorriso sonhador apareceu em seu rosto.

MEU PORTO SEGURO É VOCÊ-Um romance para gays e lésbicas-Armando Scoth LeeOnde histórias criam vida. Descubra agora