VII

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A sexta havia chegado, com ela a saúde e, infelizmente, o fim do meu atestado que eu mesmo tinha me concedido, sim, me libertei da escola por conta própria. Estranho que era apenas o início do ano letivo e eu já estava com esse sentimento, o mesmo que me mantinha em casa.

Fiz as coisas de rotina, tomar banho, me arrumar, comer algo e ir para o colégio. Porém, ocorreu um furo na rotina. Uma ligação inesperada. Minha mãe lembrou da minha existência.

Hello! É assim que eles dizem "oi" por aqui! — dizia ela aparentando ser uma criança devido a forma que ela entonava. O fato era que minha mãe se encantava com coisas simples, pequenas, materiais ou não, até mesmo uma simples palavra utilizada no dia-a-dia em outro idioma era capaz de animar essa pessoinha. Ela sabia ser feliz, pelo menos nisso.

— Como está? — falou ela.

— Acho que estou bem — dei uma pausa e tudo que tinha ocorrido passou em minha mente —, ou melhor, estou bem! Estava a caminho de sair para ir à escola.

— Ótimo, você adoraria vir aqui, inclusive levarei algumas coisas que você vai gostar, voltarei em breve. — finalizou em um tom mais cabisbaixo.

— Mãe, você está bem? — indaguei.

— Não quero te atrasar, bye bye!

Fiquei preocupado, mas logo essa sensação se esvaziou, pois acredito que teria sido apenas mais um problema de trabalho.

[...]

As aulas tinham ocorrido normalmente, nosso encontro no intervalo também. Dimitri e Aléssia pareciam mais juntos ultimamente. O tempo correra, o intervalo entre as horas pareciam ter reduzido. Minutos já não eram mais minutos, nem tão pouco os segundos eram os mesmos, estava tudo tão rápido. Logo eu já estava em casa, o tempo não parava, faltava pouco para minha obrigação, corrigindo, faltava pouco para meu compromisso, afinal, eu concordei em participar.

[...]

A água quente do chuveiro já tinha percorrido meu corpo, levando com ela parte da tensão que estava entrelaçada ao meu corpo por causa do encontro. Escolhi minha melhor roupa, uma camisa social de botões, azul, quadriculada, uma calça preta, normal, sem rasgos, ou sei lá o que estava na moda e um sapato também preto. Única coisa que me prendia em casa era ausência de meu pai. Ele tinha dito mais cedo que iria me buscar. Mas não durou muito a espera. Em menos de 10 minutos após eu terminar de me arrumar ele chegou em seu carro, um Dodge Charger preto, versão de 1969, bastante utilizado também nos filmes atuais de carro, como Velozes e Furiosos. Ele se preparava para sair, mas da janela de casa acenei dizendo que não precisava. Apaguei as luzes e caminhei casa afora, entrando no carro. Nenhuma palavra foi dita inicialmente. Após alguns minutos com o carro andando teve um início de conversa.

— Não me parece arrumado para um jantar "encontro". — falei

— Sério? Escolhi minhas melhores roupas.

— É brincadeira — soltei um sorriso após isso.

— Sempre fui lerdo para essas coisas, todavia como você está?

— Estou bem — não totalmente, entretanto bem melhor.

— Entendo, novamente, desculpa. — falou estacionando o carro

Acenei com um sim de cabeça enquanto observava as luzes da casa. Se destacavam, pois a noite envolvia tudo em uma bela escuridão, as árvores arrodeavam a casa, tão altas que chegavam perto de tocarem o céu. Um encontro de magnitudes.

Nesse percurso, acredito que se passaram diversos minutos, aquele dia realmente se destacou nisso, passaram-se tantos, que não percebi quantos foram, só notei que parecia que tínhamos saído da cidade, ou pelo menos, se afastado do centro. As árvores alertavam isso e comprovavam minha ideia. Então, abria a porta, um pouco atrasado, pois meu pai já estava fora do carro, em frente a porta do meu lado do carro esperando minha saída. Adiantei e sai logo. Recebi um olhar de "está tudo bem para você?" respondi com o meu sinalizando "sim". Menti, estava um pouco nervoso e acho que ele percebeu isso, mas não deixaria minha ansiedade atrapalhar aquele momento, realmente queria colocar em prática o que aprendi com Aléssia, eu precisava passar por aquilo para meu crescimento.

Caminhamos juntos pela trilha de cimento sobre o jardim, era possível ver uma sombra passando por debaixo da porta, sim, era ela e meu irmão. Paramos diante da porta e antes mesmo que eu ou meu pai pudesse agir para abri-la, ela escancarou-se. Fomos recebidos por lindos sorrisos.

Deixa FluirWhere stories live. Discover now