Eu não sei o tempo certo em que ficamos abraçados em frente a porta do meu quarto, mas só quando eu paro de chorar que Rafael se permitiu chorar também e se antes foi eu quem encharquei sua camisa com minhas lagrimas, aquela era a vez dele.
Rafael chora no meu colo como eu imaginava anos atrás. Afagos seus cabelos carinhosamente enquanto as mágoas dele iam embora e só quando suas lagrimas cessam, ele me olha e sorrir com o canto da boca.
— O seu nariz de Rudolph existe até hoje — fala me lembrando de que quando éramos pequenos e eu chorava, Rafael costumava me chamar de Rudolph, a rena de nariz brilhante e vermelho do papai Noel. Sorrio para ele e faço menção de me levantar, mas sua mão agarra meu pulso e me impede.
— Não... Fica mais um pouco aqui. — pede e eu fico no mesmo lugar que eu estava. Mudo apenas de posição para uma mais agradável e ele acaba por ficar entre minhas pernas com a cabeça encostado em meu ombro. Ficamos em silencio ouvindo apenas as respirações um do outro, e não era um silencio desconfortável que ficaríamos procurando motivos para conversar, não. O silêncio era nosso amigo como nunca havia sido. Rafael muda de posição e sai dentre o meio das minhas pernas, vira-se de frente para mim. Estávamos quase no pé da escada e perto do meu quarto, no meio dos dois, mas parecia que lugar melhor que aquele não existia.
— Queria ter feito parte dos cinco anos da sua vida que fui ausente. — ele fala baixo, me olhando nos olhos mesmo no escuro. Suas mãos estavam entre seus joelhos que estavam dobrados em frente ao seu corpo.
— Eu também queria. — digo sem muito pensar. Aquele momento parecia não precisar disso, era nos dois abertos a tudo o que estava por vim.
— Me conta, como foi aguentar o ensino médio? Preciso saber isso de você, por que o meu foi horrível. — Rafael fala e faz uma careta e a luz que atravessava na janela no fim do corredor me deixou ver tal.
Ri de sua pergunta lembrando dos meus três anos não tão prazerosos, mas também não tão horríveis assim.
— Sarah me ajudou a atravessar todas as barreiras com bom humor e um ódio conjunto de Química.
Falo e a citação no nome de Sarah fez ainda o sorriso dele aumentar. Conheço Sarah não como o tempo que conheço Rafael, mas quase o mesmo. Sarah é minha amiga desde o primeiro ano do ensino fundamental e sempre que podia, ela nos acompanhava nas nossas aventuras e sempre ficaram amigos por minha causa, mas quando me afastei de Rafael, ela também afastou-se.
— Vocês ainda são tão amigas assim? — pergunta e eu confirmo com a cabeça e antes que ele possa falar algo eu pergunto.
— Como você aprendeu a surfar?
Essa pergunta já estava presa em minha mente e minha garganta desde o primeiro dia que eu cheguei e o vi com a prancha de surf. Ele me olhava como se há dias esperava essa pergunta e sorria para mim não como costumava sorrir, tinha resquícios de orgulho em seu sorriso.
Ele se aproxima de mim e instantaneamente arrumo minha postura, uma corrente de vento frio passa por nós e agradeço a mim mesma por ter vestido calça e blusa de moletom para dormir e não um simples pijama curto.
— Foi a dois anos atrás — começa — Eu tive uma briga com Marcos e a mãe por causa de uma briga que tive na escola e acabei vindo parar aqui em Búzios. Cheguei aqui de madrugada e joguei meu celular dentro da piscina de tanta raiva — Riu e passou a mão em seus cabelos colocando-os para trás — Na manhã seguinte fui relaxar na praia e acabei indo parar na praia de Geribá, sentei na areia e fiquei vendo aquele mar gigante querendo voltar pra casa pra não preocupar a mãe, mas ainda assim com raiva de tudo o que havia escutado de Marcos. Eu queria mostrar para ele e todo mundo que não era quem ele dizia que eu fosse, um garoto medroso que usava de tudo para se esconder de baixo da saia da mãe. Naquela manhã estava tendo uma aula de surf para algumas pessoas, eu passei uma semana inteira tentando aprender a subir em uma prancha para depois perder meu medo de água. Depois que eu perdi, eu quis te ligar no mesmo instante que eu consegui pegar a primeira onda.
Meu coração apertou. Quantas vezes eu também não quis ligar para Rafael quando eu consegui alguma coisa pela primeira vez? Inúmeras. Quantas vezes eu tinha feito isso? Nenhuma. Rafael percebendo o lampejo de tristeza em mim, aproxima sua mão do meu rosto e acaricia minha bochecha com seu dedão. Quantas primeiras vezes perdemos um do outro por orgulho e por falta de conversa? O que seria diferente se nós dois não tivéssemos se afastado?
— Eu senti tanto sua falta Rafael. — digo tão baixo e com uma dor tão forte em meu peito que só vai embora depois que ele fala.
— Eu também senti tanto sua falta Rafaela. — me abraça forte e beija o alto da minha cabeça logo em seguida.
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Rafael Rafaela
Teen FictionQuão estranho pode ser uma relação de dois amigos que cresceram juntos, mas que agora não se falam? O quão estranho seria passar o seu último mês de férias antes da faculdade, com a pessoa que era seu ex-melhor amigo e que agora não passa de estranh...