Claro como Krystal

18 2 0
                                    

Lembra quando eu disse que vê-lo desmaiado no chão tinha sido a pior coisa que eu tinha presenciado? Acho que ele não me reconhecer foi pior. Ou não. Sei lá, estou tão confusa. O médico fez vários exames, e me explicou que podia ocorrer perda de memória por causa da pequena pancada na cabeça, mas que em breve iria melhorar.

- Mas, como você explica ele lembrar de todo mundo, menos da Sulli? - a mãe dele perguntou, ainda preocupada.

- A memória é seletiva. Antes da queda, talvez ele tenha tido um ou vários episódios traumáticos relacionados à Sulli. Para amenizar o impacto, o cérebro dele, inconscientemente, decidiu não se lembrar dela - o médico disse. Como se isso fosse comum. Comum para ele, para mim, isso estava acabando comigo.

- E o que eu posso fazer para ele se lembrar? - eu perguntei, aflita.

- Com o tempo, isso vai acontecer. Não se preocupe - o médico disse, fazendo um carinho na minha cabeça - agora tenho que ir ver outros pacientes. Com licença - o médico fez uma reverência e saiu.

Aquilo acabou comigo. Por quanto tempo ele iria ficar sem se lembrar de mim? Talvez, ele nunca mais se lembrasse... Só de pensar nisso eu já comecei a chorar. A omma dele me abraçou, me dando conforto, mas parecia que eu não tinha mais chão.

Me despedi de um Minho confuso e voltei para a SM. Quando cheguei no quarto, a Amber e a Luna me atacaram.

- Sulli, você tem que nos ajudar - a Amber disse.

- O que foi?

- É a Krystal... - a Luna falou, com a voz embargada - ela está na sala de dança desde ontem, quando vocês brigaram. A Victoria a descobriu lá. Ela não quer sair de lá, não quer comer, nada.

- E você acha que eu devo ajudar como? Ela me odeia, esqueceu? - eu perguntei.

- A Krystal está amargurada, Sulli - a Victoria entrou no quarto - Ela acha que você roubou tudo dela, e só você pode fazer com que ela pare de pensar assim.

- Só por um milagre - eu falei, olhando para o céu. Mais uma coisa para me preocupar, legal.

- Sulli, vai falar com ela. Toma - ela me deu um pote com dois pares de hashis por fora - oferece isso para ela e converse com ela. Ela vai te ouvir.

Eu olhei para elas e peguei o pote. Saí do quarto sem falar nada, só pensando que o dia não podia ficar pior. Cheguei na sala de dança e vi a Krystal sentada no meio da sala, de cabeça baixa, olhando para o celular.

- Krystal.

Ela olhou para trás, graças ao reflexo que temos quando ouvimos nosso nome. Seus olhos estavam secos, mas inchados, como se ela tivesse chorado a noite toda. Quando ela me viu, soltou um som irônico e voltou para a mesma posição. Eu cheguei mais perto.

- O que está fazendo aqui?

Silêncio. Ela ainda olhava para o celular.

- As meninas estão muito preocupadas com você - eu continuei. Ainda não faço ideia do que estou fazendo aqui. Eu tenho que ajudar a Krystal, enquanto tento lidar com a minha própria dor de um Minho esquecido que conhece todo mundo, menos eu. Mais silêncio. Ela continuava olhando para o celular. Sentei ao lado dela e larguei o pote do lado dela. Ela olhou o pote rapidamente, depois olhou de novo. Pegou o pote e abriu. Tinha uns bolinhos e algumas outras coisas. Ela fechou os olhos, como se sentisse algum tipo de dor, e fechou o pote.

- O que está fazendo aqui, Sulli ladra? - ela falou, olhando para mim agora pelo espelho.

- Eu também não sei, Krystal fria - a encarei pelo espelho também. Ela sorriu ironicamente.

- Geralmente usam essa palavra para descrever a Jessica, a minha irmã. Chamam ela de "Ice Princess", porque ela sempre leva uma expressão fria no rosto - ela ficou calada. Eu resolvi perguntar, afinal, era agora ou nunca.

- Porque você me odeia tanto, Krystal? Que história é essa que eu roubei tudo de você? - eu perguntei, olhando para ela pelo espelho. Ela suspirou e começou a falar, me encarando pelo espelho:

- Nós três somos amigos desde sempre. Eu, Minho e Jessica. Quando éramos pequenos, sempre brincávamos que eu iria casar com o Minho, e que Jessica seria dama de honra. Eu cresci com isso na cabeça; para mim, o Minho sempre foi meu, mesmo que ele não soubesse. Então, certo dia, ele me disse que tinha algo para me falar. Eu preparei um piquenique para nós dois, achando que ele iria se declarar para mim. Eu preparei essa mesma comida e coloquei nesse mesmo pote. Mas ele me contou do sonho que teve com você, antes de te conhecer. Ele descreveu o que aconteceu entre vocês na formatura, quando você caiu nos braços dele. Tentei convencê-lo de que era tudo uma bobagem, mas quer saber, Sulli ladra? Ele não esqueceu. Quando ele te viu, foi claro que ele te reconheceu. E quer saber? - ela se virou e me olhou nos olhos - naquele momento, eu quis ser você - ela ficou em silêncio, e logo recomeçou, limpando com a mão uma lágrima que teimava em escorrer pelo seu rosto e voltando a me encarar pelo espelho - Então, você roubou meu oppa, mesmo antes de conhecê-lo. Depois, você roubou Amber e Luna, que não paravam de falar o quanto você era legal, o quanto você estava melhorando, o quanto você iria longe... Elas preferiam você, claramente. Depois, você roubou a Victoria. Eu conheço a Victoria faz muito tempo, Sulli ladra. Talvez por causa da história de vida dela, ela não se preocupa muito com os outros, mas ela se preocupou com você - e então, ela voltou a me olhar nos olhos - e novamente eu quis ser você. Tendo meu oppa, minhas amigas. Não é ódio, Sulli ladra. Você roubou tudo o que me era importante. E você ainda pergunta porque eu não gosto muito de você? Meio irônico, não? - ela perguntou, suspirando. Fiquei em silêncio, enquanto via ela pegar o potinho, tirar dois hashis do plástico e me dar os outros dois que ainda não tinham sido desembalados. Eu peguei os hashis da mão dela e ela começou a comer. Isso foi um choque para mim. Eu jamais iria imaginar que a Krystal pensava tudo isso. Eu e ela conversamos muito, por muito tempo. Seria muita coisa para transcrever aqui. Mas acho que nos resolvemos, até rimos juntas de certas situações. A Krystal é uma boa pessoa, mas, como disse a Victoria, ela é um pouco amargurada. Subitamente, eu me lembrei do Minho que deixei no hospital: um Minho confuso, que não se lembrava de mim. Ela me perguntou o que aconteceu e, por incrível que pareça, eu me abri com ela. Ela ouviu tudo em silêncio, depois deu tapinhas leves na minha perna, dizendo:

- Ele vai se lembrar, tenho certeza.

Ela pegou os hashis e o pote e se levantou. Quando estava perto da porta, ela disse:

- Acho que agora somos amigas. Está claro?

Me virei para olhar para ela.

- Claro como Krystal.

Ela riu e saiu. Finalmente me entendi com a Krystal; agora, eu podia me concentrar no Minho.

Sulli's DiariesOnde histórias criam vida. Descubra agora