1 - A família Duncan

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"Se lembra quando os velhos morreram e os novos nasceram. E a vida mudou, desmontou, rearranjou-se."

Remember When
Alan Jackson

— Você precisa parar de ser irresponsável, menina! Não se esqueça de que carrega o peso do sobrenome Duncan nas costas! Você vai se casar sim, nem que eu tenha que te levar amarrada pra igreja!

Maya olhou para o pai e imaginou que ele estivesse mesmo enlouquecendo. A primeira vez que falou sobre o casamento, ela riu tanto que sua barriga chegou a doer. Tinha catorze anos na época e não levou a sério a "brincadeira" do pai.

A verdade era que Maya não levava nada a sério. Sempre foi um espírito livre e se envolvia em tantas confusões que acabou se tornando um peso para o pai que já não sabia como lidar com a própria filha. Isso causou entre eles um afastamento, um abismo impossível de ser alcançado. Então, o velho homem colocou na cabeça que a única maneira de domá-la seria casando-a com um alguém de sua escolha. Um homem responsável e que tivesse tino para os negócios, já que a filha era uma descabeçada que não parecia entender a importância de ser a única herdeira de um empreendimento tão valioso.

— Em que século o senhor acha que estamos? Eu fujo, me mando antes que você perceba! O que não será difícil já que nunca está por perto!

— Para de agir feito uma adolescente birrenta, Maya! Agora você tem 18 anos e está na hora de entender que eu sou um homem de negócios, não tenho tempo para draminhas de menina complexada! – Maya olhava para o pai carregando uma raiva que não conseguia controlar. As palavras ditas de forma tão dura e insensível doíam mais do que gostaria de admitir - Não se esqueça de que é o meu trabalho que sustenta essa sua vida de princesa! Vai fugir? Viver de quê? Eu deserdo você antes que consiga colocar os pés pra fora da cidade.

Charles Duncan. O homem de negócios. Era assim que ele se denominava, e exatamente quem ele era. Ele nunca foi um marido presente para sua esposa, ou um pai amoroso para Maya.

Ele era um homem de negócios.

Fundador e proprietário do grupo de empreendimentos da família: a Duncan Enterprises, maior companhia de petróleo e gás natural do Texas. Tinha orgulho do trabalho. Ergueu um império sozinho quando todos o julgaram louco. Mas sabia que havia perdido muito no processo. Pagou um preço alto por ser quem era.

Alto demais, ele sabia bem disso.

A morte prematura de sua doce e amada esposa ainda doía como se nenhum segundo tivesse passado. Mas não era um desses homens fracos ou sentimentaloides. Sua dor permanecia trancada a sete chaves, dissimulada pela carranca sombria, e consequente mau humor.

Encarava a figura enigmática e confusa a sua frente. Não a reconhecia, ou melhor, nem mesmo a conhecia. Sua própria filha. Seu inferno na Terra.

Por ela nutria um amor profundo e extremamente contraditório. Era a lembrança de uma vida que optou por deixar para trás. A vívida imagem de sua esposa, dona de uma beleza incalculável. Mas não só a beleza ácida herdara da mãe. A personalidade marcante, a agressividade latente, não deixava que filtrasse o que saia de sua boca, e as palavras cortavam como uma faca afiada.

— Eu prefiro viver na miséria a deixar que um homem como o senhor tome as rédeas da minha vida! Se minha mãe ainda estivesse viva sentiria desgosto, horror pelo homem que se tornou. Às vezes acho que foi isso que aconteceu com ela! O senhor a matou! A matou de desgosto!

Maya saiu pisando duro, com os olhos nublados pelas lágrimas que se recusava a derramar pelo pai. Os funcionários da empresa estavam tão acostumados aos rompantes entre pai e filha que desenvolveram a habilidade de dissimular sorrisos e acenos fingindo que era apenas mais uma visita da filha do patrão. Ninguém ousava se intrometer nos assuntos da família Duncan.

APENAS UMA NOITE (CONCLUÍDA)Onde histórias criam vida. Descubra agora