Sete

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      Toby estava apoiado na soleira da porta, observando a garota nova deslizar de um lado para o outro da cozinha. Ela parecia concentrada, alternando entre bater uma massa, checar o forno e misturar uma panela.

      Ele a achava bonita. Quando ela tirava o cabelo do rosto com os dedos finos e delicados, ele sentia vontade de tocar sua pele. De sentir seu cheiro. De ver a cor de seu sangue. Ele a achava bonita assim como um caçador achava um cervo bonito, poucos segundos antes de meter uma bala entre seus olhos doces e inocentes. Só de imaginar, Toby sentiu um calafrio de prazer.

     — Precisa de ajuda? — O assassino ofereceu. Cassandra se virou, surpresa, mas, quando viu o garoto, deu um sorriso mínimo. Ele viu os olhos negros dela brilharem e se deleitou com a ideia de um buraco de bala o meio de sua testa lisa.

      — Não, obrigada. Não falta muita coisa, de qualquer forma.

      — Poxa, mas eu insisto... —Ele se desencostou da soleira da porta e deu um passo em direção a ela.

      — Estou bem, de verdade... — Ela recuou um pouco, batendo a cintura no balcão. — Mas, se quiser mesmo ajudar... — Apontou para a panela que estava no fogão. — Misture o creme de milho, sim?

      Toby acedeu, indo até o fogão e agarrando a colher de madeira que estava mergulhada num líquido espesso e branco. Começou a misturar, raspando a colher no fundo da panela. Seus movimentos eram bruscos e raivosos e faziam com que o creme espirrasse para todos os lados. Ele não notou, mas Cassandra o observava de longe, com um certa dose de curiosidade e cautela. Ele parou após alguns segundos, mergulhando o dedo no líquido e o experimentando, tendo cuidado para não sujar sua máscara. Deliberadamente largou a colher e correu para o outro lado da cozinha.

      — E-ei! — Cassandra se alarmou, correndo para continuar a mexer a panela. — Não pode parar de mexer, senão gruda no fundo e queima.

      Toby não pareceu ouvir. Ele andou até uma bancada no canto oposto do cômodo e se alongou, tentando alcançar algo to topo de um armário. Depois, examinou cuidadosamente nas mãos o pequeno tubo de tempero.

      — O que é isso? — A garota indagou, um tanto preocupada.

      — Relaxa. N-não é veneno nem nada assim. — Ele salpicou o pó avermelhado dentro da panela e tomou a colher das mãos da menina, misturando bem até incorporar no líquido praticamente desaparecer. Provou mais uma vez, soltando um longo suspiro. — Agora sim!

      O garoto ouviu uma risadinha e olhou de lado para Cassandra.

      — O q-quê? — Ele perguntou, um tanto brusco.

      — Ah... Nada, é só que... — Ela sorriu levemente. — Você parece estar se divertindo.

      Para a surpresa de Toby, ele estava mesmo se divertindo. Era reconfortante poder mexer num líquido que não fosse sangue; ter as mãos sujas de uma cor além do vermelho. Ao descobrir que sentia isso, ficou bem, bem zangado. E confuso. E um tanto nauseado.  Aquele não era de seu feitio e definitivamente cozinhar não era seu lance. Que porra estava fazendo ali então? Ele largou a colher com um último grande splash e fechou a cara, guardando as mãos nos bolsos.

      — Tô subindo. — Declarou. E partiu antes de receber resposta.

A Parábola de CassandraOnde histórias criam vida. Descubra agora