выживание

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As economias de minha mãe me sustentaram por uns seis meses. Não que o dinheiro fosse pouco. Até que era uma quantidade razoável e sabe-se lá como é que ela conseguira desviar aquela quantia toda sem que a polícia se desse conta. Talvez ela fosse mesmo uma parceira de crimes do meu pai como diziam.

Vladimir, o homem a quem tal quantia fora confiada acabou por se tornar um dos meus melhores amigos e também um tipo de mentor. Segundo ele, cuidar de mim era uma forma de pagar uma dívida antiga com os meus pais, mas nunca me contou do que se tratava. Apenas sabia que era algo antigo, da época em que meus pais saíram da nossa cidade natal Krasnodar na Rússia, comigo pequeno ainda, a fim de viver no Brasil, onde tinham uma chance de ampliar os negócios da família. Considerando as coisas que surgiram sobre meus pais depois da prisão, eu pouco questionei. Há certas coisas que é melhor nem saber.

Vladimir bem que tentou enfiar juízo em minha cabeça. Deu-me bons conselhos sobre a administração do dinheiro e qual seria a melhor forma de fazê-lo durar. Mas é claro que eu ignorei cada uma de suas ideias e só não torrei tudo antes porque ele me segurou. Em minha defesa, eu era um garoto que nunca tivera que economizar na vida, havia acabado de perder tudo o que eu conhecera até então, inclusive meus pais. Eu era um desastre ambulante, e se não fosse por ele, talvez eu nunca tivesse conseguido me reerguer.

Depois de umas repreensivas duras e bem merecidas, eu tratei de começar a encarar essa nova realidade. Felizmente, graças a Vladimir eu tinha um teto sobre minha cabeça e não passaria fome, mas se eu quisesse qualquer coisa além disso, eu teria que conseguir com o meu próprio suor. Felizmente, além de bons genes que me garantiram uma aparência muito agradável, eu tinha também toda a educação que meus pais me deram e acreditava que isso pesaria a meu favor.

Me inserir no mercado de trabalho foi mais difícil do que poderia imaginar. As pessoas se encantavam pela minha beleza, ficavam seduzidas pelas minhas credenciais, mas bastava que soubessem meu sobrenome e tudo o que estava ligado a ele para que minhas chances se reduzissem a nada. Pelo visto, as pessoas não esqueciam tão fácil quanto se dizia. Vladimir até me sugeriu que tentasse mudar o sobrenome, mas as coisas não eram assim tão fácil como os filmes sugeriam. Ademais, meu sobrenome, mesmo que amaldiçoado, era tudo o que me restara. Uma vez Kuznetsov, sempre Kuznetsov. Era tudo o que me restara dos meus pais depois que os últimos centavos deixados por minha mãe se acabaram.

Por outro lado, tive que abrir mão do meu orgulho em relação a todo o resto. Passei a procurar empregos menos qualificados, onde o meu sobrenome e experiência não tinha tanta importância. Consegui algumas vagas e passei a lidar com pessoas que teriam deixado meus pais horrorizados. Não que eles tivessem qualquer possibilidade de me julgar mais.

E assim, antes que me desse conta, cinco anos se passaram. Ninguém mais se lembrava de quem eu era, inclusive eu mesmo. Muita coisa aconteceu nesse meio tempo, mas nada ocorreu da noite para o dia. Foi um caminho árduo e doloroso e não foram poucas as vezes em que desistir de tudo ou que amaldiçoei meus pais e minha existência. Claro que depois eu corria ao túmulo de meus pais pedir desculpas, porque apesar de tudo, sempre fui um bom filho. Ou pelo menos eu acho.

Dizem que a gente se acostuma e aprende com as dificuldades da vida. E de fato, aprendi algumas coisas durante esses cinco anos e meio. A principal delas foi que eu odiava essa vida barata. Eu merecia coisa melhor e ia lutar por isso. Não importando o quanto isso me custasse. Naquela altura eu também não tinha muito mais a perder, mesmo o pouco que havia conquistado não me importava tanto.

 Naquela altura eu também não tinha muito mais a perder, mesmo o pouco que havia conquistado não me importava tanto

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