Sou Homero, farei 15 anos daqui 2 dias, vivo com meu pai, minha mãe e minha irmã mais velha, moramos em uma casa grande nas redondezas de Florença, na Itália. Minha família é unida e feliz, eu sinto isso toda vez que estamos juntos.
Meu pai é um cirurgião geral experiente, minha mãe uma cozinheira de mão cheia, minha irmã estuda pedagogia e eu, eu fico a maior parte do tempo dentro de casa, ouvindo música e lendo algum livro, as vezes saio lá fora para respirar ar puro e sentir o sol.Me concentrava na leitura de um de meus livros quando sou chamado para o jantar, no caminho para a mesa já consigo sentir o adorável cheiro da comida, não demoro muito e chego até a mesa onde sou recebido pela pergunta que todo ano meu pai faz.
- Homero, sei que você nunca pede nada como presente de aniversário, até entendo, mas dessa vez nós gostaríamos que pedisse algo, qualquer coisa, afinal, irá fazer 15 anos e você merece o melhor de nós, ficaremos muito felizes se escolhesse algo.
Escutei atentamente as palavras do meu pai enquanto minha mãe servia minha comida, o cheiro estava espetacular, assim como sempre.
- Pai, eu não sei o que pedir, mas se isso fará vocês ficarem contentes até amanhã eu resolvo o que vou querer.
Todos pareciam satisfeitos com minha resposta, eu poderia pedir milhares de coisas, eu sei, mas o que eu mais queria eu não poderia ter, pelo menos não por agora.Um acidente de carro que eu não consigo esquecer fazia eu sentir falta de algo que eu nem me lembro direito como era.
Estávamos meu pai, minha mãe, minha irmã e eu voltando de algum lugar que eu não consigo me recordar, eu com apenas 5 anos estava confortável na cadeirinha, enquanto os outros usavam seus cintos de segurança da forma adequada, quem dera se o motorista do outro carro também estivesse usando.
Foi tudo muito rápido, um carro na contra mão em alta velocidade e um forte impacto lançou o motorista que com a cabeça estourou os 2 vidros e caiu sobre e dentro do carro, os estilhaços dos vidros que estouraram atingiram meus olhos, fazendo com que eu ficasse cego.Enxergar novamente, é o que eu mais desejo, mesmo me lembrando apenas do acidente, da cor do céu e da grama, mesmo eu já acostumado e até mesmo adaptado, eu sinto falta. Eu quero poder ver as capas dos livros que eu leio, quero ver quem canta as músicas que eu gosto, quero ver o rosto das pessoas que me ajudaram a superar tudo isso.
Todos já haviam comido e se dirigido para seus devidos quartos assim como eu, porém, o sono parecia não querer vir, então peguei minha pouco usada bengala para andar pelo quintal da casa, respirar ar puro e pensar em algo pra pedir de aniversário, eu conhecia bem a casa, sabia onde tudo ficava, é impressionante como a ausência de 1 sentido aguça tanto os outros. Havia apenas algumas partes fora da casa onde eu raramente passo, meus pais alertam que é perigoso e possa ter algo no chão que eu vá me machucar, tento evitá-los ao máximo.
O silêncio da noite tomava conta, até que o barulho dos meus passos se juntam ao que parecem ser gemidos, os supostos gemidos vinham de um barracão onde meu pai guarda suas tralhas, um dos locais que eu deveria evitar, no entanto, eu tinha certeza que o barulho ouvido viria de lá e fui até o local.A certeza de que seriam gemidos aumentava conforme me aproximei, até que cheguei até a porta, a porta de madeira assim como o barracão, os gemidos poderiam ser apenas o barulho das madeiras rangendo com o vento, mas não pra mim, pra mim o som é nítido e realmente são gemidos. Abro a porta de madeira que não estava trancada, apenas fechada, o mais cauteloso possível para fazer o mínimo de barulho, adentro o barracão e logo sinto um cheiro não muito agradável mas não me incomodava tanto, os gemidos não cessavam e agora eu podia ouvir barulhos de correntes também, vinham do fundo do barracão.
Lentamente caminho até o fundo me esquivando de alguns pequenos obstáculos até que a ponta emborrachada da minha bengala fica entre duas barras de ferro, e com a mesma, percebo que outras barras de ferro também existem ao lado de ambas, me aproximo e com as mãos noto que é uma espécie de jaula, ao tocar as barras de ferro com as mãos minha bengala cai no chão, os gemidos se transformam em pedidos de socorro e as correntes parecem mais agitadas, antes de eu conseguir me afastar alguém segura meus braços e me puxa pra perto da suposta jaula, noto que está escuro ao ponto de quem me agarra também não poder me enxergar, pois sinto suas mãos me apalpando, dedos melados de sangue passando pela minha boca, os pedidos de socorro se misturam com angustiantes choros e lamentos.
- Por favor, nos ajude, eles vão nos matar, você precisa tirar a gente daqui!!!
Consegui me soltar dos braços que me prendiam, caindo sobre chão assustado, desorientado encontro minha bengala e me levanto, tento correr mas esbarro em uma mesa que junto de mim cai ao chão, minha bengala se perde novamente e com as mãos apalpo o chão na intenção de encontrá-la, ao apalpar o chão sinto que tem algum líquido derramado e uma bacia de plástico molhada com o mesmo líquido, após mais algumas passadas de mão sobre aquele líquido percebo que aquele líquido na verdade é sangue, pois entre as passadas de mão rápidas eu podia sentir que tocava algo que se parecia com pele, orelhas e dedos, desesperado, entre pedaços de corpos e sangue consigo achar a bengala, corro para fora do barracão, fecho a porta e corro para casa.
Os pedidos de socorro ainda perturbam meus ouvidos, mesmo assim, lavo minha bengala e tomo um banho rápido, me jogo em minha cama, assustado, surpreso e chocado com tudo aquilo, fico ali no meu escuro rotineiro e sem que eu percebesse adormeço com o cheiro e o gosto de sangue ainda impregnado em meu corpo e minha boca.Após longas horas de sono, acordo. Não sei o que pensar e muitos menos o que fazer, primeiramente abri a hipótese que tudo tivesse sido apenas um sonho, mas descarto essa possibilidade, ainda posso sentir o cheiro e gosto de sangue, me levanto, cuido da minha higiene e quando saio do banheiro já posso saber que está perto da hora do almoço, pois o cheiro gostoso da comida invade meu olfato.
Sigo para a cozinha onde minha mãe termina de preparar o almoço, me recebe como todos os dias, gentil e amável.
- Boa tarde, dorminhoco! O almoço já está quase pronto, seu pai e sua irmã já estão na mesa.
Respondo de forma desconfortável e sigo para a mesa, meu pai e minha irmã conversam e dão risadas, ao me verem a conversa se encerra e minha irmã ironiza.
- Nossa, saiu do coma!!!
Eu, inquieto, apenas me sentei, logo minha mãe aparece com as comidas, me serve e também se senta.
- Não vai comer, Homero?
Demoro um pouco para dar a primeira garfada, mas logo posso sentir o feijão cremoso e bem temperado, o arroz solto e mole, a salada de alface com tomate devidamente temperada com azeite, limão e sal, a carne pouco temperada, talvez até mais saborosa do que bem temperada, macia como a pele de um bebê, mal passada e fresca, era assim todos os dias, a carne ainda molhada de sangue completava o sabor excepcional sentido em cada mastigada.Após saborear mais um pedaço da carne suspiro e respiro fundo, largo os talheres e coloco as mãos sobre a mesa.
- Filho, não está mais com fome?
A pergunta é com tom de desconfiança, também sei que todos olham pra mim talvez com desconfiança também. Ignoro a pergunta da minha mãe e sem hesitar digo.
- Eu já decidi o que eu quero de aniversário!!!
O tom de voz convicto que usei fez com que meu pai falasse em um tom surpreso e empolgante.
- Que bom Homero, pode pedir o que quiser, estamos dispostos a lhe agradar.
Eu, novamente com os talheres em mãos e prestes a usá-los.
- Um churrasco!
- Eu não pediria um presente melhor.
Foi o que minha irmã disse antes de meu pai me abraçar e dizer.- Então a família Dellatorre terá o melhor churrasco de todos, acho melhor a gente já ir preparando as carnes!...
É, parece que o presente não será só pra mim!
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Peculiares Contos De Terror
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