[5] Caindo...

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 Acabei por deter-me em minha longa e fadigante jornada até a guilda. O ritmo de Malquior não é como o meu, e às vezes tenho de lembrar-me que ele ainda é uma criança pequena, que precisa de cuidados, alimentação e descanso.

Armo uma improvisada barraca com restos de tecido de couro, sob o intenso luar, abrigando o garoto adormecido, enquanto sento-me do lado de fora, sempre a vigiá-lo.

Questiono-me como deve estar Enna neste momento, e meus prezados filhos. Será se estão bem ou será se estarão enfrentando dificuldades? Pisco meus olhos, sonolentos, queixando-me e relutando para não adormecer. Mesmo se eu quisesse nunca conseguiria dormir. Sou arrancado de bons sonhos para pesadelos cruciantes desde que tomei do cálice dos Assassinos. Tenho visões com símbolos estranhos e arcaicos.

Malquior remexe-se na barraca, agitando os braços para o alto.

— Está tudo bem — deslizo minha mão sobre sua cabeça de cabelos do tom da neve. — Não deixarei nenhum mal recair sobre ti.

Adormece outra vez, o sorriso angelical refletindo em sua face.

A culpa mastiga meus ossos, remói minha alma, direciona-me ao inferno. Será se nunca me livrarei de tal fardo, Deus? É o meu pecado por ter tirado a alegria desta criança?

Aprendi com nosso líder, Sameque, que a única maneira de nos livramos do mal, é confessando... mas não poderei cumprir tal regra.

Vou arranjar-me de outra forma para encobrir meus erros, sem que Malquior descubra o que fiz... Não! Ele nunca descobrirá. O tornarei meu discípulo, ensinarei os valores morais de nosso Clã para ele, e o manterei sempre perto. Assim, estarei pagando uma grande dívida com o destino. O filho do Cavaleiro Negro ficará longe de suas raízes e principalmente, longe dos Illuminatos.

Revisto meu bisaco de viagem, em busca de uma ampola com rum, e deparo-me com um pequeno caderno de capa preta. Logo recordo-me que aquele fora o presente de Enna para mim. Insistiu para que eu escrevesse sobre as minhas fantasiosas viagens nas folhas sem margem, pois obviamente, ela sempre fora e sempre será uma mulher curiosa.

Posso usar este caderno como um veículo para sanar minha angústia. Não completarei este caderno, minha doce Enna, com palavras amáveis ou roteiros maravilhosos de minha jornada. Escreverei neste diário sobre rancores, arrependimentos, e principalmente, receios.

Encontro um toco de lápis e inicio minha afanosa confissão. Direcionarei-a para meu melhor amigo, Timóteo. Sei que um dia ele há de ler o que está escrito neste caderno, mas acima de tudo, anoto todos os meus pensamentos sempre tendo em mente a imagem de meu pequenino filho de olhos vermelhos.

— Se este diário estiver em tua posse, significa que estou morto. Não completei minha missão e falhei.

Olho mais uma vez para o adormecido Malquior.

— Sou um Assassino falho. 

Assassino dos Olhos Cor de Sangue [fanfic]Onde histórias criam vida. Descubra agora