Sangue, eu nunca vi realmente, mas pelo que falam ele é vermelho e escuro, carmesim é a cor do sangue, eu nunca gostei dessa cor, não pelo significado ou pelo que remete mas só por não gostar nada pessoal.
Segredo, nunca tive acho que não é importante pois o que muda o mundo é a palavra, pelo menos me foi ensinado assim, o segredo é algo obscuro, prefiro algo claro e límpido a realidade para mim sempre foi assim.
Suspeita, nunca senti é uma palavra que não entendo o significado, falam que é um sentimento mas acaba sendo muito complexo para mim, acaba se aliando ao segredo, desconheço o motivo de algo assim existir.
Esses três "S" só conheço na teoria, até o momento da nossa história, em que eu, Anne Huys contarei como uma vida perfeita é tão frágil e fácil de se corromper.
Acabado de sair de minha aula de violino, eu encontrei uma menina perdida, ela estava chorando e procurando a mãe, fui ensinada desde criança a ajudar as pessoas e ser gentil quando necessário, nesse momento eu peguei a mão da criança e juntas fomos a um posto de polícia para deixar ela em um lugar seguro.
Na volta para casa encontrei uma caixa no caminho dentro havia filhotinhos de cachorro e de gato, eles estavam dormindo mas não podia deixar eles ali, pois era inverno e eles acabariam morrendo de frio, juntei todas as minhas forças e peguei a caixa deixando o meu violino nas minhas costas e carregando a caixa enorme no frio de 12°C.
Desde que me lembro não importava a hora que chegava, sempre a casa estava iluminada, não tinha irmãos, mas era um lugar aconchegante e sempre estava de braços abertos para me receber, desta vez isto não aconteceu.
A casa estava escura, salvo a luz da rua e da lua que iluminava fracamente, quase não dando para ver a entrada da propriedade, coloquei a caixa no chão e tateei meus bolsos a procura da chave de minha casa, abri a porta, sem nenhum tipo de cautela, realmente não tinha "suspeita" nenhuma de nada.
Peguei a caixa e adentrei na casa, não tinha ligado a luz ainda, estranhei ninguém havia me recebido, ignorei e comecei a subir as escadas, não precisei das luzes depois de chegar em casa geralmente eu subia para meu quarto e quando chegava alguém eu descia para recebe-lo, então era algo que não precisava mais da visão.
Chegando em meu quarto eu coloque a caixa em cima da cama finalmente fui ligar a luz do meu quarto, um frio recaiu nos meus ombros da base da minha espinha e começou a subir, estendi minha mão, um passo atras do outro,acendi.
Senti meu coração, batia e batia como se quisesse correr, ou apenas fugir, talvez parar, meus ossos não se mexiam nem nenhum músculo, sentia minha visão ficar turva e descobri o que era sangue, amaldiçoei a minha insensatez de não ligar a luz, meu quarto se coloriu de carmesim, passos vermelhos foram deixados e eu seguia sem pensar nas consequências, a vontade de vomitar era grande mas não tão grande quanto o desespero de encontrar os moradores da casa.
Esses passos me levaram a primeira vitima, minha mãe, desci as escadas e a encontrei sentada na poltrona de costume, parecia a mesma cena cotidiana, ela me esperando enquanto lia o livro de contos que ela adorava tanto, mas a diferença é que quando a toquei ela estava gélida, seus olhos fixos em um ponto indefinido e vidrados parecia que sua consciência tinha deixado seu corpo a muito tempo, seu vestido estava manchado de carmesim e havia um corte em seu pescoço, não entendi no momento porque geralmente minha mão não deixava uma mancha sequer em nenhum vestido, e ela não tinha esse corte no pescoço alias ela não permitia a casa suja principalmente com passos, acabava com o estilo do casebre.
Ainda em choque, agora comecei a procurar alguém para ajudar minha mãe, que achava que ainda estava viva, mais e mais pegadas, me levaram para a segunda vitima, meu pai, na verdade eu vi que as pegadas chegavam até o escritório dele. Dormi na porta, na esperança de ter sido só um sonho, papai tinha me dito para não entrar em seu escritório eu obedeci, não queria que ele ficasse triste.
Acordei com batidas na porta de entrada da casa, desci as escadas correndo e abri a porta, não se importando em ver o estado da casa fúnebre.
Um homem estranho estava na porta não sabia de onde ele tinha saído, mas meus pais me ensinaram a não julgar um livro pela capa, o convidei para entrar, ele olhou em volta pegou meu pulso e me colocou dentro de seu carro. Sem desconfiar de nada o perguntei o lugar aonde ele estava me levando, ele calado me olhou de rabo de olho e continuou a dirigir.
Entramos em um sítio onde sabia que tinha um amigo do meu pai, eu acabei o encontrando e lhe contando a situação, ele acabou rindo, ri com ele, naquele tempo tinha achado que ele achasse que era minha imaginação, essa ilusão foi quebrada no mesmo momento em que ele me deixou em uma sala vazia, sem janelas, ele entrou e me perguntou o que sabia sobre meu pai, eu contei o que sabia, ele me olhou com um olhar que não consigo interpretar até hoje, virou, saiu da sala e me deixou sozinha, fui trancada ali.
Não vi a luz do dia no próximo dia que veio e nem no próximo, não lembrava de como era beber água ou comer nada, só resistia rezando para o amigo do meu pai lembrar que estava ali.
Era isso que pensava, minha sanidade estava me deixando aos poucos, sucumbindo começo a empurrar a porta com o resto das minhas forças, bato e grito, parece que tinha tudo perdido, em minha ultima investida rezei para a deusa sorte, ela sorriu para mim, uma das pregas não estavam presas e a porta era de madeira corroída pelo tempo e cupins, consegui sair dali e corri, corri.
Depois de tempo correndo, consegui chegar em casa, ela parecia fúnebre , fria e assustadora, entrei e um cheiro pútrido entrou em minhas narinas, vomitei água e fel, amaldiçoei a minha vida, subi a maldita escada que nunca devia ter descido e entrei no escritório de meu pai.
Ele estava lá impecável com um furo na testa, parecia um terceiro olho se não fosse pela falta dos dois que não estavam, só os buracos ele estava chorando sangue.
Olhei a papelada com lagrimas nos olhos, lia e lia quando terminei tudo descobri que era errado o chama-los de vitimas.
Ri, gargalhei da minha desgraça, de meu pai chorando sangue e seu terceiro olho, do desastre carmesim na minha casa, do estado da leitora de contos, eu tinha vivido as custas das pessoas que fazia contratos com meu pai.
Muitos tiveram "mortes macabras e misteriosas" pois não tinham como pagar, gargalhei desprezando a hipocrisia de meus familiares, ajudar os outros? Pensar nos outros? Pensavam apenas em si mesmos.
Papai tinha um laboratório que também usava essas pessoas mais pobres, com menos poder para fazer experimentos e salvar a vida dos mais ricos, mamãe pegava essas crianças e colocava para usar como atrações em circo de horrores, a diferença é que esses circos os visitantes poderiam judiar das crianças, por um preço a mais poderiam até jogar acido nas crianças para torna-las mais doentes, criavam siameses costurando duas crianças juntas por exemplo.
Qual a razão? O sentido de tudo? O que é certo e errado? Minha vida foi uma mentira, foi construído uma fortaleza de segredos sangrentos em volta de mim e nem suspeitei de nada.
Olhei a casa e dançando se divertia, a casa se tornou iluminada de novo, com varias musicas que tocava, minha mãe que nunca irá machucar mais ninguém e meu pai que vai ficar intocável trabalhando em seu escritório eternamente.
A cada tempo que se passava os filhotes se alimentavam e cresciam em cima de papai, me acostumei com o cheiro pútrido, minha casa se tornou uma verdadeira fortaleza fúnebre de alegria doentia.
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Ah entendi é um mundo perfeito
KorkuClaramente a vida de Anne Huys foi perfeita, até quado descobriu as engrenagens que faziam com que ela fosse tão perfeita. Sempre haverá um equilíbrio entre bom e mal, não é isso que faz com que a vida seja interessante e satisfatória?