Capítulo 5 - Beijo

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Definitivamente, a aula de Matemática era a mais entediante de todas. Olhei em volta, nenhum aluno se dava ao trabalho de olhar para o quadro, tirando, obviamente, o cabeça da turma, Gaston. Delfina me fitava, e quando percebeu que eu fazia o mesmo, palavras sem sons saíram de sua boca:


 

“Ele não tira os olhos de você!”

Fiquei confusa. “Ele quem?” Mandei de volta e ela apontou com a cabeça para o lado. Segui o rumo que ela mostrou e me surpreendi com o olhar que ela dissera. Simón me fitava concentrado, como seu eu fosse um problema de Matemática dificílimo de resolver e que ele não via a hora de saber o resultado, mas assim que nosso olhar se encontrou ele abriu um largo e sincero sorriso, que eu retribuí com prazer. Delfina me fitava incrédula e quando eu virei o rosto, percebi que Matteo também. Só aí notei que grande parte da sala assistia a tudo aquilo, menos, obviamente, o professor. Corei e fitei o quadro como uma aluna dedicada que nada distrai e desejei, pela primeira vez na minha vida, que o sinal demorasse a bater.

É realmente impressionante que quando menos você quer uma coisa aconteça, mais rápido ela acontece. Foi exatamente o que ocorreu. A impressão que eu tive foi que mal se passaram dois minutos e a aula já havia acabado, o que foi extremamente decepcionante para mim. Mal batera o sinal e Delfina já veio me perguntado de maneira meio brusca:

- Pode me dizer o que raios está acontecendo entre você e o Simón?

- Nada demais! – Nem morta eu contaria para a Delfina que ele foi à minha casa ontem – Foi só uma troca de sorrisos! Mais nada!

- Uhum, sei! – disse com sarcasmo – Sorte sua que a Jaz não viu – ela gesticulou para a mesma que mantinha a cabeça abaixada em sua carteira – se não ela te engoliria viva! – e depois riu. Eu a acompanhei.

- Ela não faria isso! E acho que ela não está com muito clima para prestar atenção em alguma coisa ou alguém! Muito menos brigar! – nenhuma de nós duas ria agora, não havia clima para isso. Fiquei feliz por ter conseguido me desviar do assunto do Simón. Quer dizer, foi melhor assim, antes que eu falasse alguma coisa. Não que eu não confie na Delfina, mas ela tem uma estranha mania de “botar fogo” nas coisas e principalmente de espalhar boatos, e a última coisa que eu queria era que a cidade toda – coisa de cidade pequena – pensasse que eu e Simón estávamos saindo.

- Sabe, era assim que você estava – Delfina tinha a expressão muito séria.

- Como assim?

- Quando você chegou, você estava assim, ou até pior – nós duas olhamos para a Jaz.

Eu sei que deve ser meio difícil ouvir isso, mas é a verdade! – eu não conseguia falar, não havia o que falar, quer dizer, falar o que? Eu estava certa sobre o espelho, e isso me magoava muito! Então, me veio algo a mente:

- Delfina... – comecei com a voz baixa – obrigada! Por tudo. Por não ter desistido de mim, mesmo quando eu não ajudava em nada. Eu nunca vou me recuperar por completo, mas a parte boa é que vocês não sabem como eu era antes e infelizmente nunca vão saber. É sério, obrigada mesmo!

Foi extremamente difícil dizer aquilo, mas quando eu comecei não foi fácil parar. Eu tinha que dizer para minhas amigas o que sentia e confiar nelas. E antes que pudesse me impedir, estava chorando. E no fundo, até achei bom isso estar acontecendo. Eu não conseguia me ajustar e chorar na frente dela – e da sala – até era um bom sinal... Ou melhor, era um ótimo sinal. Significava, que de alguma forma, estava fincando minhas raízes aqui. Uma parte bem grande de mim odiou aquilo, mas sabia que não haveria volta. Estava feito. Era hora de conviver com o meu passado e aceitá-lo, seguir em frente.

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