Capítulo 8 - Namora comigo

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A luz entrou pela janela em tons de roxo graças às cortinas da Delfina. Uma dor latejante tomava conta da minha cabeça. Eu já estava acordada fazia algum tempo, fitando a imensidão pouco iluminada do quarto. Devia ser meio-dia para claridade entrar tão forte assim. Para confirmar, me virei de bruços e estiquei o pescoço – Minha cabeça latejando ainda mais com o movimento – até enxergar o relógio de coração sobre a mesa-de-cabeceira e verificar as horas. Eu estava certa, era meio- dia e dez.


Deitei-me de novo e olhei debaixo da cama e pude ver a Jaz dormindo num colchão inflável do outro lado. Coitada, era para ela estar dormindo nesse colchão e não naquele terrível que com o mínimo movimento já faz um barulho infernal. Não era nem para eu estar aqui!

Ontem tinha sido tão confuso... Eu me lembro de tudo (eu acho), mas era turvo e sem sentido, principalmente o que acontecera depois de me drogarem. Minha cabeça doeu mais quando forcei meus pensamentos. Não entendo porque alguém faria isso, quer dizer, me drogar! Eu não conhecia praticamente ninguém naquela festa e mesmo que conhecesse, eu moro há tão pouco tempo aqui para já me odiarem. E mesmo se me odiassem, isso é tão tosco e imaturo... essa de drogar alguém. Droga é uma coisa séria que não deveria ser usada nem por opção.

Subitamente, me veio algo à cabeça. Meu irmão foi acusado de usar drogas e disseram que traficantes mataram ele e meus pais graças a dívidas não pagas. Dívidas de drogas. Meus pais, morrendo de maneira frívola e dolorosa, graças às drogas.

Levantei-me da cama num pulo, minha cabeça gritando com o movimento, como se ele fosse a causa do meu pensamento e que se eu me levantasse, iria afastá-lo de mim, para bem longe. Mas não adiantou nada. O pensamento ainda dançava em minha mente, sedento da minha tristeza.

Fui a passos largos até o banheiro. Abri a porta e fechei-a atrás de mim, parando diante da pia. Joguei água no meu rosto diversas e diversas vezes, até sentir que ia me afogar. Talvez assim aquilo saísse da minha mente. Depois puxei a toalha de rosto e me sequei. Quando acabei, fitei-me no espelho e só então notei que dormira de vestido de festa, que a maquiagem no meu rosto estava toda borrada e que eu sujara inteira de preto a toalhinha amarela com um “DELFINA” bordado em linha rosa clara.

Enfiei a toalha embaixo d’água, peguei algodão e demaquilante e comecei a tirar aquele borrão preto e roxo da minha cara. Escovei meus dentes com o dedo, caprichando bastante, tomando cuidado com a minha dolorida cabeça. Depois eu daria um jeito na questão da roupa. A Delfina e eu provavelmente usávamos o mesmo número, o que significava que eu podia pegar algo emprestado. Até porque, encharquei meu vestido com essa lavação de rosto.

Saí do banheiro com extremo cuidado e me ajoelhei perto da cama auxiliar, tentando arrumá-la. Normalmente, sempre que chegava, minha cama estava perfeitamente feita por uma das empregadas do papai; o que significa que eu não fazia idéia de como se arrumava uma cama. Na casa da tia Sheron minha cama raramente era arrumada e, quando era, era minha tia que cuidava disso.

Por fim desisti e só tirei o lençol e o travesseiro, empurrando a cama para o seu devido lugar – que era embaixo da cama de Delfina – e pondo o resto na cadeira do computador. Suspirei quando acabei.

A porta se abriu de maneira suave e dei um pulo controlando-me para não gritar. Uma mulher, que julguei ser a mãe da Delfina, me fitava confusa da porta. Eu achei isso porque ela tinha o mesmo tom claro da filha e, definitivamente o mesmo nariz. Os cabelos eram curtos, lisos e negros, até o queixo. Os eram olhos castanhos, mais claros que o tom da pele. Sua aparência sutil e delicada deixava a impressão de ser daquelas que choram quando quebram uma unha. Parecia estar no auge dos 30 anos. Bem nova para ter uma filha de 16.

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