03 de fevereiro de 2008

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03 DE FEVEREIRO DE 2008...

O corredor, antes tão quieto, se enchia com o barulho dos passos das crianças que ali entravam. As paredes eram brancas e lisas, sem qualquer tipo de decoração. O prédio todo passava uma sensação de frio, de maldade. Entretanto, as crianças tinham sorrisos nos rostos. O grande dia havia finalmente chegado. A Iniciação estava marcada para às sete horas. Juntamente com os vinte e quatro iniciandos, se encontravam dois homens, altos e fortes. Um deles apresentava uma barba tão comprida e espessa que imaginei se teria algo escondido ali. Ao fim do corredor, uma grande porta dupla de vidro já se encontrava aberta. Uma porta pro início de uma nova etapa na vida de cada uma daquelas crianças. E até completarmos 18 anos, era ali que passaríamos todos os dias. Treinando.

Entrei na sala, absorvendo cada detalhe daquele lugar pra mim. Ao meu lado, um garoto baixinho, o cabelo comprido fazendo com que os cachos caíssem sobre seus olhos. Ele tinha um olhar firme e determinado, mas notei que o mesmo tremia. Eu já tinha ouvido falar sobre aquele lugar desde que me entendia por gente. Portanto, a excitação de finalmente estar iniciando o treinamento enchia meu peito de alegria. A sala, igualmente ao corredor, era completamente branca. Uma das paredes era coberta por enormes espelhos, como de um estúdio de dança. Em um canto, se encontrava um saco de pancada que poderia, facilmente, ser maior do que eu. Nessa mesma parede, encostados, estavam vários pedaços de pau, compridos e feitos de bambu. Eu sabia que aqueles instrumentos se chamavam Bo Staff, graças ao meu pai.

Não que meu pai tivesse sido muito presente em minha vida. Ele passava a maior parte do tempo no escritório; era responsável por cuidar de grandes transações da empresa. Mas, no pouco tempo que passávamos juntos, ele fazia questão de me preparar o máximo possível. Era graças à ele que eu tinha vaga garantida na academia da empresa. Entretanto, tudo que sabia sobre o tal treinamento era que eu iria aprender artes marciais. Eu não me importava de fato com essas coisas, mas notava que aquilo era importante para meu pai e eu só queria ficar mais próxima dele.

Todas as vinte e quatro crianças se posicionaram na sala. Parecíamos mini-soldados. Ambas as mãos postas para trás, coluna reta. O homem barbudo foi em direção a uma grande caixa de metal, que eu não havia notado antes. Enquanto isso, o segundo homem, coberto de tatuagens e com uma cicatriz na sobrancelha esquerda, se pôs em frente ao grupo.

_ Hoje é o primeiro dia de treinamento. Não toleraremos brincadeiras durante as aulas. Tampouco depois. Vocês estão aqui pra ganharem força, agilidade e desenvolver o raciocínio lógico. Não estamos aqui pra serem amigos, nem pra criar laços com ninguém. Nessa academia não há lugar para perdedores e fracos. Estamos entendidos? - gritou, cuspindo nas crianças que se encontravam na primeira fileira. Um coro baixo de concordância pôde ser ouvido.

_ Entenderam ou não? - perguntou novamente, gritando ainda mais alto que da primeira vez.

_ Sim, senhor. - Dessa vez, o coro foi mais alto. As crianças quase atropelando as palavras, provavelmente por medo. No entanto, eu permanecia calma, embora extremamente animada. Não me deixava abalar facilmente por adultos daquele tipo. E além do mais, meu pai havia alertado sobre os treinadores, portanto, não estava esperando nada diferente.

O homem barbudo parou ao lado do tatuado. Nas mãos, várias armas de luta que consistiam em dois bastões pequenos conectados em seus fins por uma corda. Eu, mais uma vez, sabia que armas eram aquelas. Nunchakus. O homem começou a distribui-lás para cada um dos iniciandos; os mesmos olhavam uns para os outros, assustados. Olhei novamente para o menino de cabelo cacheado, e dessa vez, ele também me olhava. Sorrimos um para o outro e notei, então, que ele havia parado de tremer. Queria conversar com ele, mas temia que isso fosse irritar os treinadores. Ao receber o Nunchaku, fiquei olhando-o e tentando me lembrar de alguma informação que possa ter sido dada por meu pai. Nada.

_ Agora que estão todos equipados, observem os movimentos que iremos fazer e repitam. Atenção! - começaram então a desenhar no ar movimentos em volta de seus corpos. As crianças, boquiabertas, pareciam ter parado de respirar. Os homens, no entanto, estavam inabalados. A técnica era precisa, os movimentos determinados e sem hesitação. Eu não conseguia entender como algum daqueles bastões não batia em seus rostos ou corpos. Pela primeira vez no dia, estava com medo. Tinha certeza que iria me machucar com aquilo.

Ápos a demonstração, cada um dos alunos teve que repetir os movimentos dos treinadores. Olhando em volta da sala, pude perceber que alguns alunos aparentavam ter alguma prática com aquilo,o menino de cabelos cacheados sendo um deles. Enquanto outros, mal completavam os movimentos sem se machucarem. Eu sabia que certamente não seria a melhor aluna quando se tratava de armas, mas acreditava que iria compensar com minha grande aptidão para lógica, já que esta academia não se tratava somente de exercícios físicos, aparentemente.

E então, nas três horas que se passaram, gemidos de dor, choro e nunchakus sendo atirados ao chão foram os únicos barulhos ouvidos. Exausta, com dor e decepcionada comigo mesma, sai da sala após os iniciandos serem libertados. Eu tinha ido terrivelmente mal, o nunchaku havia repetidamente batido em meu rosto. Minhas mãos estavam vermelhas, tamanha a força que usei pra segurar a arma. Parei ao lado da porta dupla, me encostando na parede para descansar.

_ Eles são horríveis. Acho que é a pior turma de todos os anos. - Ouviu o homem tatuado falar. Não é como se o mesmo estivesse tentando manter segredo sobre aquilo, já que falava com seu habitual tom de voz: praticamente gritando.

_ A gente tem 6 anos pra transformar esses inúteis em soldados, ou então todo o plano irá falhar. - O barbudo falou, quase sussurrando, diferentemente do primeiro. Não entendi o que o homem quis dizer, mas imaginei que fosse só questão de manter o "legado". Afinal, as empresas Turner tinha uma reputação a zelar. Era ali que haviam se formado os melhores lutadores dos últimos anos.

Sentindo-me um pouco melhor, finalmente me desencostei da parede e andei em direção ao início do corredor, cabisbaixa e pensativa. Senti alguém bater em meu ombro, quase me derrubando. Por pouco não cai no chão e bati a cabeça contra a parede, graças ao garoto que me segurou. Ainda um pouco atordoada, não consegui identificar quem era, tudo que podia ver era um borrão que, aos poucos, foi se revelando bonitos cachos castanhos.

_ Você está bem? Foi mal, eu posso ser bem desastrado às vezes. - falou. Percebi que o menino carregava consigo uma mochila que aparentava estar pesando uns 5 quilos.

_ Estou ótima. Por que você trouxe essa mochila tão pesada? - sempre curiosa, não me contive e perguntei.

_ Bem, na verdade eu achei que os alunos deveriam trazer suas próprias armas, e como não sabia qual seria a aula de hoje, coloquei todos os tipos de arma que tinha em casa. - falou, sorrindo envergonhado e passando as mãos nos cabelos ao mesmo tempo. Ele realmente deveria cortá-lo um pouco.

_ Quem tem tanta arma assim em casa? - respondi, rindo. - À propósito, meu nome é Alicia Clark. - falei, estendendo a mão para o garoto.

_ Muito prazer, eu sou Christian Turner, mas você pode me chamar de Chris.

FIGHT: Sociedade SecretaOnde histórias criam vida. Descubra agora