I - O último historiador

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1

Alienígenas são tolos.

Não estou falando dos verdadeiros alienígenas. Os Outros não são tolos. Os Outros são tão adiantados em relação a nós, que é o mesmo que comparar o ser humano mais estúpido com o cão mais inteligente. Sem condições.
Não, estou falando dos alienígenas dentro de nossas cabeças.
Aqueles que inventamos, os que viemos inventando desde que compreendemos que aquelas luzes cintilantes no céu são sóis como o nosso e, provavelmente, têm planetas como os nossos girando ao redor. Você sabe, os alienígenas que imaginamos, o tipo de alienígenas que gostaríamos que nos atacassem, alienígenas humanos. Vocês os viram milhões de vezes, Eles descem impetuosamente do céu em seus discos voadores para destruir Nova York, Tóquio e Londres, ou marcham pelo interior em imensas máquinas parecidas com aranhas mecânicas, disparando armas de raios, e sempre, sempre, a humanidade deixa de lado suas diferenças e agrupa-se para derrotar a horda alienígena. Davi derrota Golias, e todos (exceto Golias) vão felizes para casa.

Que droga.

É como uma barata elaborando um plano para derrotar o sapato que está prestes a esmagá-la.
É impossível ter certeza, mas aposto que os Outros sabiam dos alienígenas que imaginávamos. E aposto que eles acharam tudo muito engraçado. Eles devem ter rolado os traseiros no chão de tanto rir. Se é que têm senso de humor... ou traseiros. Eles devem ter rido como nós rimos quando um cão faz algo especialmente bonitinho e idiota, "Ah, esses humanos, tão bonitinhos e idiotas! Eles acham que gostamos do que fazem! Não é lindo?"

Esqueça os discos voadores, e homenzinhos verdes, e aranhas mecânicas gigantes cuspindo raios de fogo, esqueça as batalhas épicas com tanques e jatos de guerra e a vitória final para nós, humanos intrépidos, brigões e indomados sobre o enxame de olhos esbugalhados, isso está tão distante da verdade quanto o seu planeta agonizante se encontrava do nosso planeta vicejante.
A verdade é: quando nos encontrarem, a gente já era.

2

Às vezes, acho que sou a última pessoa na Terra.
O que significa que sou a última pessoa no Universo.
Sei que isso é bobagem. Eles não podem ter matado todos... ainda. Mas entendo como pode ter acontecido, afinal. E, então, acho que isso é exatamente o que os Outros querem que eu veja.
Você se lembra dos dinossauros? Pois bem.
Provavelmente, então, não sou o último humano na Terra, mas sou um dos últimos. Totalmente só - e com a probabilidade de continuar dessa forma - até que a 4ª Onda caia sobre mim e me derrube.
Esse é um dos meus pensamentos noturnos. Sabe, aqueles pensamentos que nos ocorrem às três da madrugada, tipo Deus-estou-ferrado; quando me enrolo como uma pequena bola tão apavorada, que não consigo fechar os olhos, mergulhada num medo tão intenso que tenho que me lembrar de respirar para que o coração continue a bater; quando meu cérebro apaga e começa a falhar como um CD arranhado. "Sozinha, sozinha, sozinha, Cassie, você está sozinha."

Eu me chamo Cassie.

Não Cassie de Cassandra, ou Cassie de Cassidy. Cassie de Cassiopeia, a constelação, a rainha presa à sua cadeira no céu do norte, bela, mas fútil, colocada nos céus por Poseidon, deus dos mares, como punição por sua arrogância. Em grego, meu nome significa "aquela cujas palavras se destacam".

Os meus pais não sabiam absolutamente nada sobre mitologia. Eles apenas acharam que era um nome bonito.
Mesmo quando havia pessoas por perto que me chamavam, nunca usavam o nome Cassiopeia. Somente meu pai, e somente quando estava me provocando, e sempre com um péssimo sotaque italiano: Cass-ee-oh-PEE-a. Ele me deixava maluca. Eu não achava divertido ou bonitinho, e aquilo me fazia detestar o próprio nome.
- Eu sou Cassie! - gritava. - Só Cassie! - Agora daria qualquer coisa para ouvi-lo chamar-me só mais uma vez.
Quando fiz 12 anos, quatro anos antes da Chegada, meu pai me deu um telescópio de presente de aniversário. Numa noite fria e clara de outono, ele instalou no quintal dos fundos e mostrou, a constelação.
- Está vendo como sé parece com um M? - perguntou.
- Por que deram o nome de Cassiopeia, se tem o formato de um M? - retruquei. - M de quê?
- Bem... não sei se tem algum significado - respondeu com um sorriso.

A 5ª OndaOnde histórias criam vida. Descubra agora