CAPÍTULO QUATRO

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Havia se passado dois dias, desde o episódio ocorrido na diretoria. Desde então, Fernanda passou a evitar Heloísa. Precisava de um tempo para digerir todas as palavras preconceituosas da enfermeira e, para não se machucar e acabar despertando algum sentimento que fosse mais forte que a pequena atração que nutria, decidiu se afastar.

Heloísa percebeu o afastamento da colega e questionou-se, por um breve momento de lucidez, se havia feito rebuliço por pouca coisa. Meneou a cabeça, inconformada. Em seus pensamentos, havia feito a coisa certa. Duas pessoas do mesmo sexo, se envolverem, era algo repudiante, proibido. Cresceu sendo ensinada que aquilo era pecaminoso.

No relógio, percebeu que eram quase sete da noite e ainda não havia visto Fernanda cruzar o pátio. Libertou um suspiro aborrecido, deu partida em seu veículo e seguiu para casa, afinal, ainda tinha que cuidar do marido, que já começava a se definhar.

Nanda, por sua vez, estava dentro do ônibus, ouvindo músicas no fone do celular. Embora houvesse sugerido o projeto para Tereza, estava desanimada em desenvolvê-lo com Heloísa. Não saberia como agir, caso a mulher despejasse seus preconceitos e concepções errôneas em seus alunos.

— Fernanda! Hei, Nanda! — uma voz conhecida chamou pela moça, assim que ela desceu da condução.

O semblante imparcial da professora cedeu lugar para uma feição entristecida, carregada de mágoa por rever Patrícia, a ex-namorada.

A moça de cabelos crespos aproximou-se, oferecendo um sorriso alvo para Nanda, que a encarou com indiferença.

— Putz! O que você quer, hein?!

A pele negra da outra mulher assumiu um tom levemente ruborizado e as sobrancelhas arquearam-se, evidenciando sua admiração com o tratamento dado por Fernanda.

— Ah! Estou com saudades — a tomou em um abraço, porém a professora não retribuiu, esquivando-se. — Vamos dar uma volta? Conversar um pouco?

— Olha só, não tenho nada pra falar com você. Preciso ir — finalizou dando as costas para a mulher.

— Poxa, Nanda, só quero te pedir desculpas pelo o que aconteceu naquela noite. — A mulher insistiu, acompanhando a jovem enquanto andavam pela rua pacata em que Fernanda morava.

Em frente ao portão de casa, a professora permaneceu estática, encarando Patrícia com amargura. Sentia ódio da garota, raiva por ter sido testada, por ter sido recebida com desconfiança quando mais precisou de apoio.

— Você tinha era que ter vergonha de me procurar, de ficar atrás de mim, depois de tudo o que fez, Patrícia! — apontou o dedo no rosto da outra. — Sério, cara! Vá pra o inferno!

Em seguida, entrou em sua casa, sem dar chance para que a mulher falasse algo.

Para Fernanda, reencontrar Patrícia havia sido um gatilho emocional doloroso. A noite estrelada e calorosa, a música alta, o cheiro de bebida alcoólica, a quantidade de pessoas que tornava quase impossível transitar dentro do interior da casa de Patrícia, o olhar sombrio do rapaz que a observava durante todo o tempo, como se fosse um predador à espreita de sua presa mais saborosa.

Embora o namoro estivesse estremecido, beirando o término, Nanda mantinha a fidelidade. Aquele homem era colega do irmão de Patrícia. Era estranho. Ficava sempre em um canto mais distanciado da casa, conversando com um ou outro rapaz e segurando uma garrafa de cerveja, mantendo os olhos atentos na professora.

Desconfortável com o rapaz, a jovem tentava se manter o tempo todo próxima a namorada e como Paty estava um pouco embriagada, acabou se irritando com Nanda. Tiveram uma discussão terrível no quarto da moça, resultando em bofetadas de ambas as partes.

Pecado Vermelho (DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora