Capítulo 3

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   MALIA estava bem melhor, depois de alguns dias de cama e tomando os remédios caseiros das senhoras curandeiras, ela parecia mais saudável, a ferida em sua barriga estava ganhando um tom mais claro, isso queria dizer que estava cicatrizando.
  Ela já conseguia ficar acordada até mais tarde e de vez em quando se arriscava a se levantar sozinha. Lucinda estava orgulhosa da amiga e não saía do lado dela, eram como unha e carne.
   Depois que Malia começou a se recuperar pude me aproximar mais delas, era bom saber que elas estavam se sentindo melhor, eu havia ficado muito preocupada com elas, mas agora que Malia estava melhor eu estava muito feliz.

_ Ele fez isso?! - disse Malia espantada, tocando meu rosto.
_ Pois é! - eu disse dando de ombros, ainda furiosa com Viktor, mesmo ele estando mais dedicado no meu treinamento nesses últimos dias eu sentia meu sangue ferver só de pensar que ele poderia concordar com o machismo do meu pai.
_ Eu não tinha deixado! - diz Lucinda cruzando as pernas, mostrando as belas pernas brancas dela por baixo de vestido.

  Como eu havia voltado, agora eu tinha acesso as minhas roupas antigas, então um dia depois que encontrei meu pai voltei aquela casa e peguei tudo que era meu, não iria dormir naquela casa sabendo que aquele homem morava lá.
  Era estranho de pensar que eu sentia falta dele e de tudo que ele me representava e agora ele havia perdido todo o valor aos meus olhos como quando descobri quem eu realmente era. Depois de reencontrar a filha desaparecida esperava que ele ao menos ficasse feliz, me abraçasse e me acolhesse na rebelião, mas agora tanto faz, eu faria minha própria rebelião!
_ Ele foi muito mal mesmo! - disse Malia, juntando as mãos no colo, estávamos hospedadas na casa da Sra. Jenkins - que por acaso era a avó de Jayson - ficávamos em um quarto que antes era o quarto do Sr. Jenkins, pai de Jayson, não era muito grande, mas nós também não éramos então poderíamos dormir sem problemas, Malia dormia em uma cama só dela já estava ferida e eu e Lucinda em uma esteira de palha no chão, não era muito confortável, mas era bem melhor que dormir em um acampamento no meio da floresta.
  Viktor ficara na casa de Alfren, eles não se davam muito bem, mas o meu pai permitiu já que precisavam resolver os assuntos da rebelião e descidir sobre o maldito casamento arranjado.
  Eu não sabia o que esperar, mas eu não queria me casar sem amor, eles não tinham poder sobre mim e eu não casaria sem sentir nada por Viktor, mas esse era o problema, eu sentia algo por ele e não sabia o que era, mas eu sabia que sentia e isso me deixava ainda mais confusa.
_ Arabella posso fazer uma pergunta? - Pergunta Malia mechendo nos dedos em cima do colo.
_ Claro! - sorri sentindo a pele ao redor do corte esticar.
_ Você e o Viktor, existe algo entre vocês não é? - ela me olha nos olhos, parecia receosa e interessada demais no assunto. Franzi o cenho, sentindo um leve aperto no peito eu respondi.
_ Não, não temos nada. - eu podia jurar que tinha visto ela suspirar aliviada, por que me importava com essas coisas? Estava na cara que ela estava interessada por ele! Idiota! Não! Ela não era idiota, ela era uma amorzinho de pessoa e poderia fazê-lo feliz, por mais zangada que estivesse com ele, ele já havia passado por coisas difíceis demais para desejar que fosse infeliz, mas eu não conseguia pensar neles como um casal, era estranho, como se não combinassem, como se aquilo não devesse acontecer.
_ Por que isso? - Pergunta Lucinda para Malia, que lhe olha de olhos arregalados.
_ Ehr... Não é nada é só que eu achava que eles tinham alguma coisa, mas não tinha certeza, então perguntei! - diz erguendo as palmas das mãos na altura dos ombros.
_ Tudo bem... - diz Lucinda franzindo o cenho - sabe de uma coisa? Eu acho que você gosta dele e não quer admitir que sente algo pelo ruivinho cavalheiro de meia tigela - ela olhava para mim serrando os olhos, acusatóriamente. Como não esperava aquela reação arregalei os olhos.
  Eu sabia perfeitamente que Lucinda seria capaz de falar algo do tipo já que ela não tinha muita noção do efeito das suas palavras, mas dessa vez... Eu podia jurar que ela acertara em cheio na ferida.
_ E eu acho que você deveria cuidar um pouco da sua boca enxerida! - digo erguendo uma sobrancelha, Malia movia seus olhos arregalados de mim para Lucinda. Lucinda tira a sua mecha branca do rosto e coloca atrás da orelha.
_ Você apenas está tentando mudar de assunto! Admita logo, ele está caidinho por você mesmo! - eu ergo as duas sobrancelhas e abro a boca para responder quando a Sra. Jenkins adentra o quarto com o remédio de Malia em mãos, ficamos caladas.
_ O que? - Pergunta a Sra. Jenkins - pensam que só por que eu sou velha não posso ouvir conversa de garotas? Eu sou velha, mas ainda sou mulher! - ela põe o líquido verde na colher e faz Malia tomar, seguida de uma careta da jovem negra.
_ Ninguém disse isso - disse Malia limpando a boca com a manga da camisa - é que estamos falando sobre um assunto particular.
_ E desde quando falar de garotos é assunto particular? Eu quero saber de tudo! - disse ela sentando ao lado de Malia na cama, enquanto eu estava sentada em uma cadeira e Lucinda na esteira no chão. Suspirando eu digo:
_ Estamos falando de Viktor.
_ Daquele cabeça de cenoura? Eu preferia o meu netinho! - disse ela juntando as mãos. - ah, o meu netinho! Vocês ficavam tão lindos juntos Arabella, não acredito que você desperdiçou um homem daqueles! Não se acha mais homem assim hoje em dia, sabia? - disse ela.
  As meninas riam e eu apenas enfiava o rosto nas mãos mais vermelha que um tomate, eu sabia que daria nisso, sempre que eu e Jayson íamos visitá-la ela lançava comentários sobre ficarmos lindos juntos e que teríamos lindos filhos, mas diferente de Jayson eu nunca sentira nada por ele, ele era apenas meu amigo, meu irmão, eu era incapaz de demonstrar algo por ele, bem... Eu acho que não seria capaz.
_ Por favor Sra. Jenkins, eu já disse que eu e Jayson nunca teremos nada, muito menos agora!
_ Por que isso garota? - Pergunta ela interessada - viviam andando juntos para todos os lados e então do nada você vai embora e deixa o meu netinho com o coração partido!
_ Não foi assim que aconteceu! Foi isso que ele andou dizendo por aí? - eu disse erguendo as mãos para o ar.
_ Não, eu vi isso. Um dia você estava aqui andando pela vila e então... puff! Você sumiu! - disse a senhora gesticulando. - meu bebê ficou com o coração partido, ele estava preocupado com você, só falava nisso. Então um dia ele foi embora e deixou uma carta dizendo que iria te encontrar. - o que?!
_ Ele fez o que?! - eu me levantei sobressaltada, aquilo era verdade? O que ele tinha na cabeça?!
_ Aposto que ela vai surtar - disse Lucinda baixinho para Malia, não o suficiente para eu não ouvir.
_ Aposto que ela vai ficar zangada - disse Malia respondendo no mesmo tom.
_ Estamos falando de algo sério aqui! - eu disse olhando para elas, impaciente.
_ Não é minha culpa que o seu amigo maníaco, saiu pelo país a sua procura. Com todo respeito senhora Jenkins! - disse Lucinda.
_ Foi muito desrrespeitoso, mas você já disse! - ela dá de ombros.
_ Ele não é um maníaco! - digo com raiva, eu sei que Jayson foi um idiota, mas ele não era um maníaco, eu não aceitaria aquilo.
_ Talvez ele só esteja incrivelmente apaixonado! - disse Malia juntando as mãos de forma dramática.
_ É claro que está! - disse a senhora Jenkins se levantando e ficando de frente para mim - ele só falava de você o tempo todo, até me disse que um dia iriam se casar, disse até que morreria por você! Se isso não é amor eu não sei o que é! - claro, ele trabalhava para meu pai como meu guarda costas, óbvio que morreria por mim! Isso é tão... Arhg! Não é bonitinho! Ele mentiu para mim!
_ Parem estão me deixando confusa! - disse pondo as mãos na cabeça - senhora Jenkins, o que dizia na carta? - volto a encará-la ainda com as mãos na cabeça.
_ Dizia que estava procurando por você e que demoraria a voltar, que possivelmente passaria por Berm no meio do caminho.
_ Passaria por Berm...? - disse Malia com a mão no queixo, Lucinda franze as sobrancelhas olhando para a amiga e depois para o chão, pareciam concentradas - ele disse se ficaria por lá? - Perguntou.
_ Não disse que ficaria, disse apenas que passaria por Berm para encontrar Arabella.
_ Mas depois de Berm... - disse Malia sendo seguida de Lucinda.
_ É o Sul de Frid! - eu franzi o cenho, o que Jayson estava fazendo indo para o Sul de Frid?
_ E daí? Acredito que se estava tão apaixonado por Arabella iria a qualquer lugar para encontrá-la! - disse a senhora cruzando os braços. Troco olhares com as garotas, que entenderam o que eu quiz dizer assentindo, eu gostava de estar com essa nova conexão com elas.
_ Tem razão Sra. Jenkins, ele deve estar me procurando por todo lugar, sinto muito por ter causado tantos problemas para você, mas eu tinha motivos mais importantes para sair da Vila dos Exilados. Espero que não se importe, mas eu e as garotas precisamos encontrar com o Viktor que está nos esperando.
_ Tudo bem pode ir, mas não venha chorando para mim quando aquele cabeça de cenoura magoar você! - disse colocando as mãos nos quadris. Eu sorri, gostava do jeitinho de vó dela, ela era o mais próximo de uma avó que eu tinha, abraço  ela e saiu com as meninas.
   Caminhando pela rua nos desviávamos dos transeuntes e crianças com cuidado para que Malia não se machucasse.
_ Para onde estamos indo? - Perguntou a mesma.
_ Vamos encontrar um lugar silencioso - disse apressando o passo por entre as pessoas.
_ Por que? Odeio silêncio! - Lucinda desvia de um homem alto com uma enxada na mão, estava sujo de terra, ela faz uma careta. - e odeio sujeira! - acrescenta.
_ Curioso, já que você se lambuza mais que uma criança de dois anos comendo! - digo após virar na abertura entre duas casas que nos levava a parte de trás da Vila, onde começam as plantações.
_ Eu não como igual criança, eu apenas gosto de apreciar a comida que tenho no prato - disse ela dando de ombros logo sendo seguida da aprovação de Malia.
_ Eu concordo com ela!
_ Você concorda com tudo que a Lucinda diz Malia! - digo parando para observar onde estávamos, eu definitivamente era uma pesima navegadora, eu jurava que estávamos próximas da floresta.
_ Não é verdade! - diz Malia na defensiva - eu também acho que ela está errada em muitas coisas.
_ Como por exemplo...? - digo cruzando os braços.
_ Como... - ela mexe os pés ganhando tempo para pensar em algo - ah! Como quando ela fala sem pensar!
_ Nossa! Então você discorda dela o tempo todo mesmo! - digo rindo da cara de indignada de Lucinda, Malia ria da amiga.
_ Eu falo sem pensar, mas pelo menos eu sei andar dentro da minha própria vila! - disse Lucinda - estamos perdidas!
_ Não estamos perdidas! - eu disse - a floresta está em algum lugar por aqui, eu sei que está!
_ Nossa... Como eu pude duvidar de você? - disse ela cruzando os braços e erguendo uma sobrancelha.
_ Chega! Vocês parecem cão e gato!
_ Está mais para abelha e urso! - disse uma voz atrás da gente, virando rapidamente Lucinda tira de dentro da roupa uma lâmina que é lançada em direção a voz, mas que é desviada a tempo nos dando a visão de Viktor - Wou! Calma Lucinda, quer arrancar a minha cabeça? - disse ele ajeitando a postura.
Caminhando até o local que a lâmina caiu, entre a grama, ela diz:
_ Não é uma má idéia!
_ É assim que me agradece por ter salvado sua vida?
_ Eu teria me salvado de qualquer maneira, você apenas adiantou o inevitável. - disse dando de ombros.
_ Vou me lembrar disso quando vê-la em perigo novamente - ele ergue uma sobrancelha.
_ O que faz aqui Viktor? - pergunto cortando a demonstração de orgulho deles.
_ Estava indo ver vocês, perguntar se Malia estava melhor - disse olhando para ela, ela cora sorrindo e olha para os próprios pés.
_ Estou bem melhor, obrigada! - disse pondo uma mecha do cabelo cacheado atrás da orelha. Cruzo os braços.
_ Já viu que ela está melhor! Agora pode ir! - ele franze o cenho e suspira.
_ Até quando vai ficar zangada comigo?
_ Eu já disse, para sempre - digo pausadamente, a verdade era que eu não estava com raiva agora por conta do que havia acontecido conosco antes, estava zangada por que ele viera ver apenas Malia, eu deveria ter desconfiado. Não queria admitir, mas aquilo me deixava um pouco enciumada.
Ele aperta os olhos e depois sorri. O que ele tinha?
_ Tudo bem então! Faça como preferir, ah Malia! Fico feliz que esteja se sentindo melhor. - disse se dirigindo a ela e deixando um beijo em sua bochecha, ela arregala os olhos levemente e depois olha para o chão envergonhada.
Franzo o cenho e sinto uma dor no peito, involuntariamente ponho a mão no peito e olho para o chão.
_ Então eu já vou indo... - disse ele rindo, por que ele estava rindo? Olhando para ele se distanciar com as mãos nos bolsos eu grito.
_ Vou atrás de Jayson! - até que ele para no lugar, suas costas tencionando.

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