Tudo Termina Onde Começa

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Toda cidade pequena tem seus garotos problemas, as vizinhas fofoqueiras, os religiosos fervorosos, os bons moços, as meninas com fama ruim e aquelas com o título de "moças de família", aquele que passa em uma faculdade muito boa fora do país e vai embora para voltar algum tempo depois e ser alvo dos falatórios.

Isso era tão normal quanto o nascer do sol, ou a certeza de que toda uma cidade minúscula, como aquela, ia para a igreja todo domingo logo cedo.

Nasci e cresci aqui, o máximo que tive de contato com o mundo lá fora eram às vezes que minha avó materna vinha nos visitar da capital, não que para mim fizesse alguma diferença, eu havia me acostumado a esse lugar e as tradições que ele tinha, assim como o cargo que herdaria um dia quando meu pai o passasse para mim. É, aquela coisa de família, que vem de pai pra filho e se infiltra em você com aprovação ou não, mesmo sendo um tanto quanto contra eu não podia negar, aquilo seria meu aceitando ou recusando.

Meu pai era o pastor da cidade, minha mãe uma das damas da corte da igreja, meu avô era o prefeito e logo que ele saiu do cargo, pela idade, meu tio assumiu o lugar. Basicamente, a cidade pacata e pequena era da família Hong, eu querendo ou não receberia os problemas dela nas minhas costas um dia. Ou deveria.

Todos se conheciam, claro, era um lugar pequeno, daqueles em que a placa de "Bem vindo" logo atrás tinha "Vá com Deus e volte sempre". Todos eram religiosos, de toda a população, pelo menos, noventa e oito por cento ia à igreja às quartas e domingos, os que não iam eram idosos cansados demais para saírem de casa, ou adolescentes que fugiram de dentro dela quando os pais se distraiam com o sermão. Não havia um ser ali que não acabasse dentro da igreja um dia, até a família Wen chegar.

Veja bem, a cidade era aberta a todos, obviamente, e éramos receptivos aos visitantes ou novos moradores, quando a família chinesa chegou foi um verdadeiro falatório.

Senhora Wen era uma mulher jovem demais para ter dois filhos, de dezessete e onze anos, além de ser mãe solteira, o que contribui ainda mais para que falassem sem ela ao menos merecer estar na boca daquelas pessoas, ela era proprietária da única confeitaria da cidade. Antes deles chegarem tudo o que tínhamos era um pão meio suspeito vendido pelo restaurante mais badalado da cidade, talvez por ser o único. Então, foi uma novidade para todos nós quando um lugar bonito como aquele com doces decorados e um café tão cheiroso, que percorria toda a rua principal, se abriu ali.
Era fácil de perceber que ela tinha talento para aquilo que fazia, o ambiente criado por ela era bonito, simples, mas sofisticado, uma mistura rústica do antigo com o novo, uma novidade agradável aos olhos.

Minha mãe de imediato foi até ela, como uma das damas da igreja, e mulher do pastor, ela era encarregada de trazer novos membros a igreja, todos eram recebidos e saudados por ela, e eu tinha que ir atrás, eu era sempre arrastado atrás dela por cada canto daquela cidade e eu realmente odiava aquilo, não que já houvesse dito alguma vez, mas eu odiava.

Eu nunca soube exatamente o que minha mãe viu para implicar com a mulher encantadora do outro lado do balcão, mas o fato da conversa ter terminado como terminou contribuiu muito para toda aquela implicância digna de uma criança de dois anos quando tem seu brinquedo favorito tomado.

Ela sorriu para nós de forma acolhedora, o cheiro de doce e salgado misturado aos vários cheiros de café me deixaram entorpecido por alguns minutos e eu analisava cada pequeno detalhe do ambiente me sentindo feliz por, finalmente, ter algo daquele porte na nossa cidade.

- Bom Dia, em que posso ajudar?! _ A voz mansa da mulher me causou um sorriso. Ela era tão bonita e parecia tão nova, mesmo que soubéssemos que ela tinha dois filhos de idade, relativamente, alta.

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