Sem Intenção

CAPÍTULO 1

Já era a segunda vez que tocava aquela música do Rolling Stones. Não que Vick fosse uma expert em rock. Na verdade ela não conhecia quase nada do que tinha tocado naquela noite, mas quem não conhece Satisfaction? E talvez justamente por isso ela percebeu que a música se repetia. Ou talvez porque realmente não tinha mais nada o que fazer depois que Luana tinha descido para a pista de dança, ou sabe Deus pra onde, com o aniversariante.

Naquela noite ela estava com tanto azar que até a bateria do seu celular tinha acabado, o que a impedia de se distrair com qualquer coisa, mesmo que fosse no mundo virtual. Então o que lhe restava era dar umas bicadas naquele drink esquisito que a Luana tinha pedido pra ela, dizendo que era incrível, e tentar identificar as músicas que estavam tocando.

Vick não tinha saído esperando grande coisa. Só estava lá porque a Luana tinha insistido muito para que ela fosse. E o interesse de Luana em ficar com um cara que não fosse o Guilherme já era um motivo e tanto para fazer Vick ir num barzinho com um bando de gente que nunca tinha visto na vida. Mesmo agora, depois de ter dividido a mesma mesa com umas 20 pessoas, continuava sem saber o nome de nenhum deles, além da Luana (sua melhora amiga) e do Rafael (o aniversariante).

O negócio é que desde o ensino médio, quando Vick e Luana estudavam juntas, Luana namorava o Guilherme. E desconsiderando todas as brigas, idas e vindas já fazia quase três anos que eles estavam juntos. Claro que a Luana sempre soube que ele era um mulherengo incorrigível, mas mesmo assim acabava voltando com ele. Só que dessa vez ela parecia realmente determinada a deixa-lo no passado. Até porque tinha o Rafael na jogada.

Ela sempre achou ele bonitinho, mas nunca foram muito próximo, porque além de mulherengo o Guilherme também era extremamente ciumento, principalmente em relação aos caras da faculdade da Luana. E bem agora que ela estava solteira e tranquila, o Rafael a convidou para ir comemorar o aniversário dele naquele pub. E como a galera dele não era o mesmo povo dela Luana convenceu Vick a ir junto, para que ela não se sentisse tão deslocada.

Isso era realmente irônico. Luana estava tão à vontade naquela festa que parecia mesmo a namorada do anfitrião, e não demorou muito para encarnar o papel de vez e sair aos beijos com ele. Enquanto estavam todos na mesa Vick ainda não tinha se incomodado de fato com aquela situação. Mas nesse instante em que era a única que permanecia sentada, quando todos já haviam se dispersado para algum canto daquele bar lotado, ela desejava ter o poder do tele transporte.

Estava tão envolvida pensando no nobre motivo que a tinha levado até ali que nem percebeu alguém se aproximando. De repente aquele cara, pelo menos uns dez anos mais velho que ela, estava perto demais, se curvando para lhe falar mais próximo ao ouvido se poderia se sentar na cadeira ao lado. Ela se assustou com a presença repentina dele, e apesar de dizer que sim, pensou em logo arrumar um motivo para se mandar dali.

— Desculpe se te assustei, eu sou tio do Rafael, estava sentado na outra ponta da mesa — ele tentava se justificar. — Levantei para pegar uma bebida, e quando voltei já não tinha mais ninguém além de você.

— Tudo bem, sou a Vick, amiga da amiga dele — respondeu sem muita empolgação.

E estava tudo bem mesmo. Depois de toda essa explicação ela se lembrou de tê-lo visto por ali. Engraçado como não tinha se perguntado o que um cara daquela idade estava fazendo com um grupo de pessoas que não teriam muito mais de vinte anos. Mas mesmo agora, que pensava sobre isso, não seria indelicada ao ponto de perguntar.

— Achei que seria estranho estar só duas pessoas, uma em cada ponta da mesa. Sabe onde foi todo mundo?— falou de forma displicente, olhando em volta.

Vick reparou como o cabelo dele era escuro e perfeitamente ajeitado pelas ondas que insistiam em aparecer, mesmo estando curto.

— Acho que foram para a pista de dança — pelo menos era o que Luana tinha dito a ela.