Sem Intenção

CAPÍTULO 32

Mesmo agora, dentro daquele carro, pegando o desvio de estrada de terra — porque a estrada principal estava em obra — Vick ainda se perguntava se aquela havia sido uma boa ideia.

Mas que outra escolha teria? Ernani disse que ela não precisaria ir, apesar de já ter avisado a todos que ele e a namorada estariam lá. No final, mesmo se ela não aparecesse acabaria sendo o assunto daquele almoço em família, e por um foco não muito positivo.

— Você sabe que eu estava brincando quando disse que teria que contar o motivo de você não comparecer ao almoço, ne?! 

— Estava é? — ela respondeu displicente, como se não tivesse se importado com isso. Mas na verdade, tinha sido exatamente a possibilidade dele contar que ela estava de ressaca que havia tirado Vick da cama, e com a adrenalina tão alta, que parecia ter acordado de um sono de doze horas.

— Jamais iria queimar minha namorada com a sogra, antes delas se conhecerem, mas eu precisava te convencer a vir comigo de alguma forma— ele deu um sorriso malando.

Vick o encarou séria, sentindo seu coração palpitar novamente. Então observou mais uma vez seu reflexo no espelho retrovisor. O resultando, conseguido depois de um banho frio e um pouco de maquiagem, não estava nada mal. Mas isso não foi suficiente para aquietar sua insegurança.

— Ai, Ernani. Eu não deveria ter vindo.

Estava preparada para ser lembrada que aquele programa de domingo tinha sido ideia dela, mas a resposta dele foi outra.

— Precisava sim, Vick. Não posso ficar escondendo da minha família alguém tão importante na minha vida — ela a olhou com carinho. — Minha mãe ficou muito feliz quando eu disse que viria com a minha namorada.

Aquilo estava ficando cada vez mais pesado.

— Você não contou que tenho a metade da sua idade, ne?!

— Não — ele confirmou o que ela suspeitava.

Vick tinha certeza, por mais que a mãe dele estivesse preparada para conhecer a nova namorada do filho, jamais imaginaria uma garota recém saído da adolescência, com cabelos praticamente cor de rosa.

— Ernani, isso não vai dar certo. Sua mãe deve estar esperando alguém completamente diferente. Ela vai me odiar assim que me ver.

Ele riu, estava relaxado demais para quem estava preste a testemunhar a cena trágica que Vick previa.

— Acho que não. Duvido, que a Cris já não tenha dado todas as informações.

Foi nessa hora que Vick teve vontade de abrir a porta e se jogar naquela estrada poeirenta. Se antes estava aflita com o que a mãe pudesse achar dela, agora ainda tinha um fator bem mais preocupante, a irmã com quem ela tinha cruzado num momento nada oportuno.

— Vick, olha pra mim — ele disse logo que estacionou em frente à casa creme, ao lado dos outros carros.

Ela fez o que ele pediu, sem conseguir disfarçar sua aflição.  Suas mãos apertavam uma a outra, sem que ela ao menos se desse conta do que estava fazendo. Foi apenas quando Ernani as segurou que ela notou como estavam doloridas.

— Você não está aqui para passar por nenhum teste, ou ritual macabro para ser aprovada na família — mesmo num tom brincalhão, o olhar dele era intenso. —Você está aqui simplesmente para me acompanhar, como eu te acompanhei ontem naquela festa — disse com tanta convicção que Vick sentiu seu desespero se esvaindo.

— Então você não precisa se preocupar em agradar — Ernani continuou—, não precisa fazer nada que você não queira, e se tiver vontade de xingar alguém, sinta-se à vontade. Tem gente precisando ouvir umas verdades.