Book One - Sides

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Era conhecimento público, pelo menos entre as crianças da Wammy's House, que Near era uma criança sem qualquer emoção. Medo, insegurança, felicidade, raiva, tristeza, satisfação, tudo era desconhecido para Near aos olhos de todas as outras crianças que o conheciam. Não importava a situação, ele continuaria com aquele olhar vazio e com uma expressão neutra. Era quase um superpoder, para eles. Mas, na verdade, Near sentia tantas emoções — se não mais — quanto os outros órfãos. No momento, por exemplo, ele estava se sentindo culpado. Mas claro, ele não demonstrava isso como as outras crianças. O albino havia aprendido com o tempo que, para se manter no topo, ele deveria se manter sempre impassível. Sem emoções aparentes. Calmo, e sempre pensando logicamente. Isso costumava enganar todos perfeitamente sobre o seu estado de espírito. A única pessoa que ele não conseguia enganar, no entanto, era ele mesmo. Com um suspiro, ele pegou mais um dado e o empilhou.

Para quem não o conhecia intimamente — ninguém, pois ninguém se incomodou em tentar, e aqueles que tentaram se afastaram por sua frieza —, era apenas ele, fazendo mais uma das suas grandes construções de brinquedos, como ele costumava fazer com cartas e afins. Mas não era exatamente isso. Era o seu jeito de tentar se acalmar, pelo menos no momento, e pensar no que ele poderia fazer. Respirando fundo, ele percebeu seu grande erro. A figura que estava formando, com todas aquelas torres de dados, era a de Lunaris, a pessoa na qual ele estava pensando. Afinal, foi por causa dele que ela saiu correndo, com aquela expressão tão convincente de desinteresse e frieza. Aquilo o lembrou, de certa forma, dele mesmo. Mas a expressão que ela fez antes, aquela feição cheia de medo — medo, puro medo, como ele nunca havia visto antes — era o que não saía da sua cabeça. Não foi a sua intenção. Na verdade, o que ele queria era ter certeza de sua teoria, apesar de já ter uma boa ideia de que ele estava correto, e verificar os motivos dela. Talvez até ajudar a jovem Lunaris.

Claro, ele também estava preocupado com Mello — mais especificamente, com a reação que ele teria caso descobrisse por si só. Ele sempre foi o tipo de pessoa que tirava suas próprias conclusões, e tinha 90% de certeza de que ele se sentiria traído. E Mello era uma pessoa que não perdoava deslealdade e traição facilmente. E, às vezes, ele colocava traição em lugares que ela não existia. Não, Near não o estava chamando de mentiroso, mas sim de paranóico. Era uma das suas piores e melhores qualidades; isso era ótimo no campo da sucessão, pois significava mais dúvidas das pessoas ao seu redor — algo essencial em casos — e das pistas que tinha. Era algo que o dava uma liberdade muito maior para verificar até onde ia a verdade. Porém, fora da questão da sucessão, isso era um grande incômodo. Significava que ele não confiava em praticamente ninguém, e mantinha a primeira impressão que tinha das pessoas por muito tempo. O loiro, também, era uma pessoa intensa. Assim como sua raiva pelo albino.

Se lembrava de quando ele chegou.

Near não tinha nada mais do que seis anos quando foi levado do seu antigo orfanato para a Wammy's House, por sua genialidade que todos viam com clareza. E logo ele estava em primeiro lugar, sem fazer muito esforço — isso nos olhos de todos. Na verdade, ele estudava muito, e se esforçava para ter resultados bons nisso. Near não sabia, na época, que Mello era alguém que ficaria tão nervoso por ter sido colocado empatado com ele, mas considerado em segundo por todos. Porém, ele sabia o motivo disso. Mello havia sido criado no orfanato desde pequeno, e para todos lá tudo o que mais importava era estar em primeiro — suceder L era a única coisa que importava. A única coisa que todos queriam. Para ter chances de suceder L, a pessoa teria que estar entre os três primeiros: atualmente, Near e Mello em primeiro, Lunaris e Divum — se ele estivesse vivo, no caso — em segundo e Matt em terceiro. A maioria das crianças tinha raiva de Matt, por ele estar entre eles e a sucessão. Eles sabiam que os outros lugares eram os mais difíceis, e por isso viam o pequeno hacker como uma linha que nunca poderiam ultrapassar. O detestavam, e por isso tinha apenas Mello como amigo.

A criança de Wammy's HouseOnde histórias criam vida. Descubra agora